Após a descoberta de uma nova máfia dos concursos públicos no Distrito Federal pela Polícia Civil, nesta segunda-feira (21/8), diversas seleções públicas podem ter sido fraudadas por criminosos há cerca de cinco anos. A Delegacia de Repressão ao Crime Organizado (Deco) ainda não soube informar o total de certames afetados, devido à grande dimensão dos crimes, mas a banca Cebraspe, tradicional organizadora de seleções locais e nacionais, está sendo investigada.
Questionado sobre o futuro de seleções federais, que poderiam ter sido alvo de fraudadores, o Ministério do Planejamento afirmou que “cabe aos órgãos realizadores dos certames, conduzir de forma descentralizada, todas as etapas do processo de recrutamento e seleção. Nesse sentido, eles têm inteira responsabilidade sobre decisões e atos que assegurem o bom andamento dos concursos”. No âmbito local, ontem, horas depois de a Operação Panoptes ter sido deflagrada, o governador Rodrigo Rollemberg declarou que os servidores do GDF aprovados de forma fraudulenta serão exonerados.
De acordo com Max Kolbe, advogado especialista em concursos públicos e membro da Comissão de Fiscalização de Concursos Públicos da OAB-DF, trata-se de uma situação complexa e delicada. “Penso que o melhor caminho – caso não seja identificado com precisão os fraudadores – é a anulação dos concursos em andamento, ainda que essa medida seja prejudicial à alguns. Nos caso dos demais, imprescindível seria a instauração de procedimento investigatório para se averiguar os corruptores com posterior pena demissão. Um concurso com lisura e isonomia deve se sobrepor, na análise da ponderação de valores, aos interesses dos particulares aprovados, ainda que essa medida possa parecer injusta para alguns. Não podemos mais admitir a contratação de bancas examinadoras com dispensa de licitação, sem “know how” ou mesmo sem mecanismo de ‘compliance’ para obstar esse tipo de acontecimento. Na minha visão, boa parte da corrupção é pretérita. Não podemos mais admitir essa conduta. Precisamos de mudanças imediatas. Cito, como exemplo, o absurdo que foi o vazamento do edital do concurso da CLDF antes mesmo de ser publicado o edital. São atitudes como essa que nos levar a crer, conforme dito, que a corrupção é, em boa parte, pretérita”, afirma o especialista.
Máfia
A Delegacia de Repressão ao Crime Organizado (Deco), da Polícia Civil do DF, deflagrou nesta manhã de segunda-feira (21/8) a Operação Panoptes, que apura esquemas de fraudes em concursos públicos do Distrito Federal ocorridas pelo menos nos últimos cinco anos.
Os policiais civis cumpriram quatro mandados de prisão preventiva de suspeitos de integrarem uma máfia que aliciava candidatos. São eles: Helio Garcia Ortiz, Bruno de Castro Garcia Ortiz, Johann Gutemberg dos Santos e Rafael Rodrigues da Silva Matias – sendo que Hélio e Bruno Ortiz, pai e filho, já haviam sido presos em 2005 pelo mesmo crime.
Outros 100 concurseiros que teriam fraudado seleções públicas também já foram identificados — e o número tende a crescer, segundo a PCDF. Eles ainda não foram intimados a depor, mas após a prestação de esclarecimentos, podem ser enquadrados no crime de fraude em certames de interesse público, cuja pena pode chegar a seis anos. Eles também devem perder o cargo público.
Ainda não é possível estimar quantos concursos públicos foram burlados. Contudo, a Deco encontrou indícios de fraude nos certames da Agência de Desenvolvimento de Brasília (Terracap), Secretaria de Saúde e Corpo de Bombeiros. A seleção da Câmara Legislativa, que tele o edital lançado hoje, também estava na mira da organização. “Todos os certames estão sob suspeita”.
Esquema
A equipe da Deco encontrou quatro tipos de trapaças recorrentes: a utilização de ponto eletrônico para receber o gabarito; o uso de aparelhos celulares deixados em alguma parte do local da prova, geralmente no banheiro, para a obtenção das respostas; o emprego de identidade falsa para que uma pessoa se passe pelo candidato; e a quarta, considerada mais grave, consiste na participação de integrantes das próprias bancas examinadoras nas fraudes.
Quando aliciava os candidatos, a quadrilha nem exigia que o concorrente tivesse nível superior. Se o interessado quisesse uma vaga em concurso e não tivesse graduação, a organização criminosa providenciava também um diploma.
Em contrapartida à aprovação nos concursos, os concorrentes pagavam uma entrada de R$ 5 a R$ 20 mil. Após a posse do cargo público, os concurseiros ainda realizavam um repasse equivalente a 20 vezes a remuneração prevista em edital.
Banca sob suspeita
O Centro de Seleção e de Promoção de Eventos (Cespe) também foi investigado na ação de hoje. Com autorização judicial da Vara Criminal de Águas Claras, os policiais civis cumpriram mandado de busca e apreensão no órgão que integra a Fundação Universidade de Brasília. A suspeita é de irregularidades em concursos promovidos pelo Cespe pelo menos a partir de 2013, com a participação de funcionários.
Em nota, a instituição informou que “está acompanhando a investigação da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), fornecendo todo o apoio necessário à investigação e é o maior interessado em esclarecer os fatos”.
Com informações de Ana Maria Campos e Ana Viriato