Especialistas e órgãos ouvidos pelo CorreioWeb confirmam: engana-se quem acredita que 2011 será um ano perdido e de adiamento ao sonho de entrar no serviço público. Seleções para Correios, Banco do Brasil, Infraero, tribunais e órgãos estaduais estão a todo vapor, incluindo nomeações com recursos já previstos. Entenda agora o que vai mudar nos concursos públicos até a conclusão do ajuste de contas pretendido pelo governo Dilma Guilherme de Almeida – Do CorreioWeb Victor Bimbato – Do CorreioWeb O arrocho recorde de R$ 50 bilhões no orçamento deste ano anunciado na quarta-feira (9/2) pelo governo federal deixou muitos concurseiros de cabelo em pé. No entanto, professores, magistrados e gestores públicos ouvidos pelo CorreioWeb afirmam que as restrições impostas pela equipe econômica da presidenta Dilma atingem somente as contratações do Executivo Federal e não respingam diretamente nos poderes Legislativo, Judiciário e nas esferas estaduais e municipais. Prova disso foi a retomada do concurso de 180 vagas do Senado Federal, anunciada na tarde desta quinta-feira (10/2) pelo presidente da Casa, José Sarney (PMDB/AP). Durante entrevista coletiva, Sarney corrigiu o equívoco e explicou que o concurso não seria extinto, apenas adiado para o segundo semestre de 2011. “Não vamos acabar com o concurso. Apenas estamos fazsecretário de Fazenda do Estado do Rio de Janeiro (Sefaz/RJ), Renato Villela, os cortes da União não têm nenhum impacto direto nos Estados. Os concursos da secretaria estão mantidos e os do Estado do Rio de Janeiro também”, disse. Ontem (10/2), o órgão lançou dois editais de concursos com oferta de 200 oportunidades imediatas para analistas de controle interno e auditores fiscais. “O cronograma será mantido e os candidatos aprovados dentro do número de vagas serão nomeados e empossados”, informou o secretário. Outra secretaria estadual, a de Gestão Pública do Estado de São Paulo enviou nota por meio da assessoria de imprensa informando que o “corte de R$ 50 bilhões refere-se tão somente à esfera federal”. A próxima seleção de 6,5 mil vagas da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) e o concurso para escriturários do Banco do Brasil (BB) também serão mantidos. “A ECT é uma empresa pública de direito privado que tem orçamento próprio e não depende dos recursos da União. Isso garante que a tramitação do próximo concurso aconteça normalmente”, informou a estatal. O Banco do Brasil também espantou os impactos do arrocho orçamentário. “O BB é instituição financeira de direito privado e de economia mista. O governo é um dos donos do banco, mas não o único. O corte orçamentário não atinge nossas contratações. Não tem nada a ver”, informou o Banco. Para o juiz federal William Douglas, mestre em Direito em Políticas Públicas de Governo, ambas as empresas competem no mercado com bancos privados e por isso continuarão tendo que contratar. “As estatais, todas elas, não poderão deixar de cumprir as decisões do Tribunal de Contas da União (TCU) de substituir terceirizados por concursados. Só a Petrobras terá que substituir, nos próximos cinco anos, 170 mil terceirizados”, explicou. Leia o artigo completo de William Douglas na página do CorreioWeb. William Douglas também garante que seleções e futuras nomeações dos tribunais também seguirão normalmente. “A suspensão ocorreu apenas no Poder Executivo da União, não atingindo sequer todo o Legislativo nem o Judiciário Federal. Os Tribunais e o Congresso continuarão seus concursos. Os estados da Federação e os municípios também”, explicou. O presidente da Anpac também concorda com os argumentos do magistrado e afirma que os poderes devem conviver harmoniosamente, mas são independentes. “Legislativo e Judiciário não estão subordinados ao Executivo. Os concursos desses órgãos vão continuar”, explicou. Onde mora o perigo A má notícia, no entanto já esperada, deve vir do Instituto Brasileiro de Turismo (Embratur), dos Ministérios do Turismo e das Cidades. A Embratur atualmente tem uma seleção em andamento com 84 vagas em jogo. As provas foram aplicadas no último domingo no Distrito Federal e em outros cinco estados brasileiros. Já o MTur realizou seleção em dezembro do ano passado com 112 oportunidades e agora deve aguardar um tempo na geladeira antes de receber autorização do Planejamento para nomear e empossar todos os candidatos aprovados dentro do número de vagas. Nos casos em que o candidato foi aprovado dentro do número de vagas e em caráter efetivo, o especialista em Direito Administrativo Wilson Granjeiro sugere que a pessoa entre com mandado de segurança para assegurar a nomeação. “O aprovado tem direito líquido e certo garantido por lei”, afirmou. “Já nos casos em que o candidato tenha alcançado pontos suficientes para cadastro reserva não tem muito que fazer. Apenas esperar”, completou. A equipe econômica do Ministério do Planejamento informou que no momento não vai se pronunciar e que o detalhamento do corte orçamentário será analisado caso a caso e com rigor na semana que vem. Ao anunciar as medidas de contenção de gastos, a ministra Miriam Belchior disse que vai solicitar a todos os órgãos públicos federais que estão pleiteando nomeações e concursos um relatório com as justificativas para as novas contratações. A análise será minuciosa. Devem ser liberados apenas os pedidos considerados essenciais. “Serão analisados caso a caso. Novas contratações serão olhadas com lupa”, disse. No entanto, o professor de Direito Público Ivan Lucas explica que a suspensão é passageira e que a máquina pública jamais vai parar, porque constantemente ocorrem pedidos de exonerações, aposentadorias e até mesmo falecimento de servidores. Além disso, o próprio crescimento natural da demanda por serviços públicos exige a contratação de novos servidores para fazer frente ao crescimento do país. “Não podemos esquecer que teremos a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016, quando receberemos milhares de visitantes, necessitando, assim, de melhorias urgentes de toda a infraestrutura do país, o que demanda, também, a contratação de pessoal”, observou. Veja o artigo que o professor disponibilizou sobre o assunto na página do CorreioWeb. E agora, José? Após o anúncio do corte orçamentário, muitos candidatos aprovados e aguardando a tão sonhada posse ficaram desapontados. É o caso de Claudia Machado, advogada na área de gestão de contratos da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) e aprovada para o Ministério das Relações Exteriores (MRE). “Não ganhamos nenhum prêmio, não achamos nenhuma jóia perdida, não recebemos nenhuma herança. Apenas estudamos muito e passamos em um concurso público por mérito”, afirmou. Machado passou na prova do MRE, em 2009, para o cargo de Oficial de Chancelaria. Entretanto, até hoje não foi chamada. Eram 150 vagas e 300 candidatos foram convocados para o curso de formação. O órgão pediu um aumento de 50% do número de vagas, porém a autorização demorou demais para sair. “Faltam cinco meses para o vencimento do concurso e ainda vem essa bomba. E agora? Somos 75 nessa fila”. No entanto, Wilson Granjeiro, que também dirige um curso preparatório, afirmou que não há necessidade de pânico. Segundo ele, a causa desse mal estar geral foi uma má interpretação do discurso da ministra Belchior. “A medida temporária tomada vai atingir apenas os órgãos de administração direta do Executivo. Isso chega a aproximadamente 10% dos concursos públicos. Os outros 90%, dos demais poderes, estão protegidos”. Segundo Granjeiro, o governo deveria ter coragem de atacar os gastos desnecessários, caracterizados pelos cargos comissionados, terceirizados e viagens sem sentido, entre outros. “De acordo com levantamentos do Tribunal de Contas da União (TCU), os terceirizados custam ao poder público cinco vezes mais do que um concursado e representam 90% dos funcionários nos ministérios”. Disse ainda que os empregados recebem salários inferiores comparados com os vencimentos dos servidores pela prestação idêntica dos serviços, sem contar que a mão de obra não passa pelo crivo de uma seleção pública. Ernani Pimentel concorda com Granjeiro. Ele lembrou ainda que em 2008 aconteceu algo parecido. No fim de 2007, quando houve a queda da CPMF, o ex-presidente Lula fez um pronunciamento no qual afirmava que no ano seguinte não haveria a realização de nenhum concurso público. Porém o que aconteceu foi justamente o contrário. “O corte foi de R$ 32 bilhões na economia da época e foi um ótimo ano para os concurseiros. Quem desanimou e não estudou ficou para trás”, contou Pimentel. De acordo com dados da Anpac, em 2011 ocorrerá um esvaziamento de aproximadamente 700 mil funcionários públicos por aposentadoria. E ainda complementou a previsão. “Há no serviço público uma média de 200 mil contratações por ano. Somando este número com o 700 mil que irão vagar, chegamos ao montante de 900 mil novas contratações”. Ernani Pimentel comentou também que eventos como a Copa das Confederações [em 2013], a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 exigirão muita mão de obra de novos servidores, que serão selecionados por concurso público. “Vamos precisar de gente na Segurança Pública, na Saúde e nos Transportes. Sem contar o pré-sal. Imagina o tanto de gente que vai precisar pra explorar esse petróleo todo”, comentou. “Essa é a época para estudar, porque os próximos anos oferecerão as melhores oportunidades de todos tempos no Brasil”, adicionou. Recomendações dos especialistas Ao serem perguntados sobre o que os estudantes devem fazer neste momento de incertezas, Wilson Granjeiro e Ernani Pimentel responderam no mesmo tom. “É a hora de intensificar os estudos. Aproveitar o momento e se preparar mais para as provas que virão”, afirmaram. Thais Figueiredo adotou o mesmo pensamento sugerido pelos dois especialistas. A estudante de jornalismo tem vontade de passar para o Judiciário, porém, por agora, tem tentado todos certames que têm aparecido. “Para quem começou a participar de concursos agora, como eu, o corte é uma coisa boa. Estudo sério há apenas uns cinco meses. Com esse intervalo que vai ser dado, vou ter tempo de me preparar mais”, explicou. Concurseiros desempregados Vinicius Venturim saiu do emprego para se dedicar às seleções públicas e atualmente aguarda uma nomeação na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Ele trabalhou 15 anos na iniciativa privada e tinha uma promoção certa para o cargo de diretor de uma multinacional. Entretanto, pediu demissão para que o tempo fosse exclusivo para estudar. Depois de quase um ano de preparação e de mais dez tentativas em certames, conseguiu passar em quarto lugar na seleção da Aneel. Agora, Venturim espera a nomeação no cargo para qual foi selecionado, porém os recursos estão cada vez mais escassos e ele não tem mais condições para esperar a nomeação por muito tempo. Granjeiro orienta que nenhum candidato ao funcionalismo público largue o emprego no setor privado, até que tenha sido aprovado em algum concurso. Porém, para quem já abandonou o emprego e não tem mais condição de esperar, ele sugere que procure um trabalho temporário para que as finanças dêem uma respirada.