Decisões do TSE amadurecem a democracia brasileira

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O falecido e eterno Winston Churchill, conhecido político inglês do século passado, em uma das suas frases mais conhecidas, disse que a democracia é a pior de todas as formas de governo, exceto por todas as outras. Apesar de concordar com o ex-primeiro-ministro do Reino Unido, vejo que nessa constatação há também uma necessidade real de perseguir o aprimoramento constante.

A nossa democracia certamente não é perfeita, mas já noto um caminhar mais firme em direção contrária à da manipulação e do desequilíbrio, que culmina com a eleição de políticos que, de fato, poderiam não se elegerem em condições de igualdade.

Afirmo isso pois tenho acompanhado decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais e também do Tribunal Superior Eleitoral e, na maioria dos casos, consigo perceber que a justiça decidiu abrir mais os olhos para fatores que representam uma afronta ao processo democrático.

Desrespeito à cota de gênero cassa chapa de vereadores inteira

Recentemente o TSE decidiu pela cassação de uma chapa inteira de vereadores, na cidade de Sombrio, sul de Santa Catarina, deixando cinco vereadores sem mandatos. O motivo? A inclusão de mulheres na chapa apenas para legitimar a candidatura dos candidatos homens.

A lei que trata da composição de chapas é muito simples. Nenhuma chapa pode ser montada com percentual inferior a 30%, de qualquer um dos gêneros. E por que há quem queira fraudar a chapa? Dois motivos: o mais recente, para se apropriar do fundo eleitoral destinado às candidaturas femininas; o mais antigo, para não ter que reduzir o número de candidatos homens.

Por exemplo, para as eleições municipais, a lei brasileira diz que um partido pode lançar uma chapa com até 50% a mais de candidatos do que o número de vereadores nas Câmaras, ou seja, em uma cidade com 20 cadeiras, um partido pode lançar até 30 candidatos. Obedecendo a regra dos gêneros, uma chapa precisa ter ao menos dez candidaturas femininas. E se conseguir apenas cinco? O total de candidatos na chapa não passaria de 15, o que reduziria muito a chance de atingir o número de votos para uma cadeira.

Uso indevido de redes sociais levou prefeito a cassação

Em 2018, o TSE avançou muito na defesa dos princípios da moralidade e do equilíbrio do processo eleitoral com a cassação do prefeito, conhecido como Dr. Márcio, da cidade paulista de Mairiporã. Como o prefeito tentou a eleição em 2016, mas não se reelegeu, os efeitos da decisão da corte acabaram passando despercebidos para a maioria dos políticos.

Na decisão é possível notar, de forma muito clara, diversas irregularidades no uso de recursos públicos com finalidade promocional. O então prefeito, fez um quadro denominado “Pergunte ao prefeito”, no ano eleitoral, em que respondia pessoalmente dúvidas de munícipes. Esse quadro era gravado nas dependências da prefeitura (utilizando profissionais contratados com recursos públicos), publicado nos canais oficiais da administração pública e distribuído também pelo WhatsApp, cuja linha estava em nome da prefeitura.

A cassação deu-se também pelo desrespeito ao artigo 37º da Constituição Brasileira que no seu primeiro parágrafo diz: § 1º – A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”.

Essa decisão me parece ter objetivado o restauro das condições eleitorais de igualdade, evitando que o gestor empossado use de recursos públicos para autopromoção, mesmo que de forma dissimulada e por meios digitais.

Abuso de poder econômico e caixa dois geraram cassação de senadora

Em outro caso, o da ex-senadora Selma Arruda, eleita pelo estado do Mato Grosso em 2018, a questão foi outra: o uso não declarado de recursos para financiar campanha, mas com um detalhe importante, antes do período eleitoral.

Meses antes do período eleitoral começar, o suplente da senadora lhe fez um empréstimo de R$ 1,5 milhões, dinheiro que foi utilizado para pagar despesas nos meses que antecederam a campanha e, segundo a denúncia, corresponde a cerca de 70% do total declarado pela candidata durante o processo eleitoral.

O TSE considerou que os gastos feitos antes do período eleitoral, omitidos na prestação de contas de sua campanha, desequilibraram a disputa, configurando o abuso de poder econômico, decidindo assim, o Tribunal, pela cassação e pela realização de uma nova eleição.

Todas as decisões acima são recentes, dando claros sinais de que a justiça eleitoral pretende promover um ambiente democrático mais equilibrado e representativo. Caberá à classe política e a todos os profissionais de comunicação envolvidos, compreender o novo momento e, principalmente, entender que práticas precisam mudar.

Marcelo Vitorino

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