da Revista do Correio
Seu pet deixou de atender comandos e parece estar sempre perdido? É bom ficar atento, pois ele pode ter desenvolvido a Síndrome da Disfunção Cognitiva Canina
Durante um passeio rotineiro, Flockinho ficou desorientado. Tempos depois, foi diagnosticado com SDCC. Foto Zuleika de Souza/CB/DA Press
A Síndrome da Disfunção Cognitiva Canina (SDCC) pode trazer certa confusão mental aos cães. A doença é vulgarmente conhecida como “Alzheimer canino”, pois alguns sintomas são bem parecidos com os do Alzheimer humano. “A SDCC traz alterações semelhantes, mas não é a mesma patologia”, explica o neurologista veterinário Marco Tibery.
Em estágio mais avançado da doença, as mascotes podem deixar de reconhecer os donos e de atender a chamados. Elas deixam de fazer as necessidades fisiológicas nos locais adequados e até esquecem o próprio nome. “O animal perde a capacidade de fazer coisas rotineiras”, afirma o veterinário Rodrigo Tesser, especialista em neurologia veterinária.
De acordo com Tibery, o mais importante é o diagnóstico correto. “O ponto de partida é o que o tutor conta para o veterinário. Nós aplicamos um questionário para saber dos hábitos dos cachorros”, explica. A avaliação deve ser minuciosa e criteriosa. “Temos que excluir outras doenças semelhantes”, detalha. “Quando não existe nenhum sinal físico, já consideramos que pode haver comprometimento mental do cachorro”, complementa o veterinário Rafael Souza.
Qualquer doença relacionada ao encéfalo, dependendo da área afetada, pode comprometer a memória do animal. “Um AVC (acidente vascular cerebral), ou tumores, por exemplo. A gente faz uma série de exames para identificar e descartar outras alterações”, explica Tesser. “Para fechar o diagnóstico, é preciso uma série de exames de sangue, bioquímicos, tomografia computadorizada, ressonância magnética e, a partir daí, vamos afunilando”, conta Marco Tibery. Por fim, é feita uma biópsia do cérebro ou um exame histopatológico.
Quanto mais idoso, mais predisposto o animal fica. Todas as raças são suscetíveis. “É uma degeneração dos neurônios. Os cães a partir dos 8 anos de idade podem ter essa doença, que, geralmente, vem acompanhada de outras”, diz Rodrigo Tesser. Flock (ou Flockinho, para os íntimos) é um mestiço de bichon frisé e tem 13 anos. Apesar de superssaudável, há pouco mais de 1 ano, o cachorro começou a apresentar comportamentos anormais. Os hábitos estranhos se manifestaram durante um passeio de rotina. O pet “esqueceu” o caminho que fazia todos os dias com os donos. Flock começou a andar pelo sentido contrário, a ter dificuldade de passar por grades, e parecia estar perdido.
Outros sinais preocuparam a família. Flock passou a dormir em lugares diferentes do habitual e deixou de fazer as necessidades nos locais de costume. Assim, o pet foi encaminhando para exames de sangue e radiografias. Após um longo processo de observação e checagens, os veterinários atestaram: o cãozinho tem Síndrome da Disfunção Cognitiva Canina (SDCC).
De acordo com a advogada Ana Lúcia Souza, 59 anos, proprietária do animal, os hábitos estranhos continuam, mas de forma controlada. “Ele ainda late muito e tem dias que não quer passear. Sei que ele está fazendo coisas que também não são certas. Faz as necessidades nos locais errados, chora sem motivo, fica debaixo das coisas”, relata.
Além do “Alzheimer canino”, Flock tem síndrome de Cushing. Uma doença provocada pela alta concentração no corpo de hormônio cortisol, conhecido também como o hormônio do estresse. O cachorro toma cerca de 3 remédios por dia. “Um antioxidante para a SDCC, outro para a síndrome de Cushing e mais um remédio para aumentar a imunidade”, relata Ana Lúcia, empenhada no bem-estar do bichinho.
“Para mim é como se ele fosse um bebê. O Flockinho fez parte de um período bem difícil da minha vida. Eu estava vivendo um momento de mudanças, as pessoas achavam que eu poderia ficar doente e ele foi a parte mais especial de tudo o que aconteceu naquela época. Ele é muito apegado e muito ciumento também”, derrete-se a tutora. Com a família ainda mora outro pet: Chiquita, uma mestiça de pinscher de aproximadamente 7 anos. Ela e Flock se dão muito bem.
Depois da confirmação
Assim como o Alzheimer humano, a Disfunção Cognitiva Canina não tem cura e o tratamento consiste em controlar os efeitos. “Os remédios têm o objetivo de evitar a progressão da doença de forma acelerada. Os medicamentos devem repor os neurotransmissores, mas não podem recuperar os neurônios já destruídos”, explica o neurologista veterinário Marco Tibery.
Os remédios são à base de antioxidantes. O animal também pode ser tratado com alguns exercícios. Essas atividades devem trabalhar a questão da cognição. A mente do cão funciona com associações. Quando ele deixa de fazer essas associações, é sinal de que a capacidade cognitiva está comprometida.
Uma abordagem preventiva seria o ideal. Mas ainda não é possível antecipar esse tipo de problema no pet. Por isso, os tutores devem estar atentos às menores mudanças de comportamento e tentar iniciar precocemente o tratamento. “Não é uma doença súbita. É sempre gradativa e progressiva. O animal vai perdendo a parte mental aos poucos”, explica o veterinário Rafael Souza.
Sinais leves
Trocar o dia pela noite
Dificuldade em atender chamados
Urinar e defecar em locais não habituais
Não interagir com as pessoas ou outros animais
Andar sem direção certa, mesmo dentro da própria casa
Choro frequente
Latidos sem motivo
Apatia
Olhar perdido
Sinais severos
Não reconhecer o próprio nome
Não reconhecer os proprietários
Não identificar a própria casa
Não achar a saída de alguns locais (atrás do sofá, por exemplo)
Não responder aos comandos básicos
Ficar encostado na parede
Esquecer de beber água
Não conseguir achar a ração dentro do pote de comida