O PSL vai minguar e Bolsonaro sabe disso

Compartilhe

Há um cálculo que ainda não foi feito pelo Palácio do Planalto na guerra com o breve ministro Gustavo Bebianno. E não foi por distração ou mesmo incompetência, mas pela própria dificuldade da equação. Explica-se. Tirando o desgaste precoce e desnecessário da influência do vereador Carlos Bolsonaro nos assuntos do governo federal, o afastamento da cúpula do PSL não é lá uma das piores notícias do mundo, pelo menos de imediato.

Vale sempre lembrar que a força eleitoral de Bolsonaro poderia ser testada antes mesmo da campanha — só não viu quem não quis. Assim, a filiação do capitão reformado se deu por uma relação estratégica com o PSL e, é claro, Bebianno foi fundamental nesta história, mas o então deputado poderia ter arrumado outro barco para entrar, dada a força eleitoral do “mito”. O PSL, assim, é uma legenda que reúne gente eleita às custas de Bolsonaro, por mais crua que seja tal análise.

Embate

Depois do resultado catastrófico do embate com Bebianno — por mais que os militares tivessem tentado evitar —, resta ao Planalto se afastar do núcleo do PSL, ou pelo menos restaria. Na conta dos dirigentes tóxicos — a partir da lógica dos bolsonaristas — estariam Bebianno e o deputado pernambucano
Luciano Bivar, atual presidente do PSL. Se a crise teve algum componente positivo paraoPlanalto, pode-se dizer que foi a chance de o clã Bolsonaro tentar se afastar do PSL e das suspeitas de candidaturas laranjas.

A questão é: a partir de agora, quais as cenas dos próximos capítulos, considerando a força eleitoral da legenda e a tramitação da reforma da Previdência? Bem, é onde mora o perigo. A tendência, a partir de agora, como sabem e planejam os Bolsonaros, é o enfraquecimento do PSL. Na prática, a relação de Bolsonaro com o partido estava com Bebianno, uma espécie de faz tudo na campanha, conforme atestam
interlocutores que visitaram a casa do capitão reformado no Rio durante a eleição.

A maior prova da importância do ex-presidente do PSL foi ele ter recebido o cargo de ministro da Secretaria Geral da Presidência. Por mais que a  legenda tivesse funcionado como partido-hospedaria para o capitão reformado e a turma de deputados estaduais e federais, o corte do integrante do primeiro escalão do governo repercute entre os atuais integrante da legenda.

Desfiliação

Antes mesmo da crise entre Carlos Bolsonaro e Bebianno, a avaliação era a de que o PSL poderia ser vítima de ataques de partidos maiores e mais estruturados, como o DEM. O partido do presidente elegeu 52 deputados nas eleições do ano passado. Perdeu apenas para o PT, que saiu das urnas desestruturado
sem qualquer chance de buscar uma oposição consistente, principalmente pelos dogmas impostos pela própria direção da legenda.

No início, logo depois da vitória acachapante, chegou-se mesmo a supor que o PSL poderia cooptar mais parlamentares ao longo da legislatura. A tendência, entretanto, é que ocorra o contrário: a legenda deve perder integrantes, tal como ocorreu com o PRN, o tal Partido da Reconstrução Nacional, que virou fumaça logo depois da eleição de Fernando Collor de Mello.

Bolsonaro, na prática, é maior do que o PSL. Até aí nada de novo, pois o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva era maior do que o PT. Mas, ao contrário do PSL, o Partido dos Trabalhadores tinha unidade, ramificações de uma legenda de verdade. Não é o caso do partido do presidente, que antes mesmo de se
encontrar, pode se perder e findar. O desarranjo a partir de agora está nos próximos passos do governo em relação à unidade dos partidos governistas. Por mais que Bebianno possa fazer ameaças naturais de soldado ferido pelo próprio grupo, a maior dificuldade não estará aí. A questão é que, mesmo sem
unidade — um balaio de gatos inexperientes —, o PSL representava algum porto seguro para Bolsonaro na tramitação de projetos como o da Previdência.

A partir de agora esse cenário é incerto; daí, a preocupação dos militares, que tentaram estancar a crise política. Bebianno representava de certa forma um negociador com os políticos eleitos do partido. Sem ele no governo, o que significa o enfraquecimento do PSL, os homens do Planalto terão de se desdobrar para buscar a unidade. Assim, Bolsonaro até se livra de um problema com a saída de Bebianno, pois pode alegar distância das negociações dos laranjais, mas isso não significa que tudo será mais fácil a partir de agora.

leocanti

Publicado por
leocanti

Posts recentes

Aras falou o que os senadores queriam ouvir

O subprocurador Augusto Aras treinou para a sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)…

5 anos atrás

Apreensão de diplomatas com Bolsonaro na ONU

A minuta preparada pelo corpo diplomático do Itamaraty chegou ao Planalto com cinco sugestões para…

5 anos atrás

Autor de ameaças a presidente de CPI das Fake News é identificado

A Polícia Legislativa do Senado identificou o autor das ameaças de morte contra o presidente…

5 anos atrás

Uma despedida melancólica

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, deixa o cargo amanhã com um desgaste do tamanho…

5 anos atrás

O lado “B” do poder do Supremo

O livro Os onze — o STF, seus bastidores e suas crises (Companhia das Letras,…

5 anos atrás

Nas entrelinhas: O Fla-Flu de uma torcida já cansada

Talvez o termo esteja desgastado, mas, na falta de algo que possa ser mais preciso,…

5 anos atrás