Inicialmente, não há qualquer discordância acerca da impossibilidade de extradição do jogador para cumprimento da pena na Itália, uma vez que o artigo 5º, inciso LI, da Constituição Federal assegura que nenhum brasileiro (nato) será extraditado.
Até mesmo em razão disso, a República da Itália ingressou com ação de homologação da sentença estrangeira para impor o cumprimento da pena em território nacional.
Respeitando-se as compreensões diversas, a referida hipótese é controversa sob todos os ângulos.
Primeiro porque o artigo 9º do Código Penal apenas dispõe que a sentença estrangeira pode ser homologada no Brasil para obrigar o condenado à reparação do dano, restituições e a outros efeitos civis e para sujeitar o condenado a medida de segurança, além da hipótese de medidas assecuratórias praticadas no estrangeiro, prevista na Lei n.º 9.613/98.
Somado a isso, tem-se o fato de que o tratado sobre cooperação jurídica internacional em matéria penal celebrado entre o Brasil e a Itália não compreende a execução de medidas restritivas da liberdade pessoal nem a execução de condenações (artigo 1.3 do Decreto 862/93).
Por outro lado, de um olhar atento ao Tratado de Extradição entre a República Federativa do Brasil e a República Italiana, promulgado pelo Decreto n.º 863/1993, extrai-se do artigo 6.1 que a homologação de decisão estrangeira com o fim de submeter nacional do Estado requerido à execução da condenação carece de previsão normativa.
Por fim, a possibilidade que abre maior espaço para o debate: a transferência da execução da pena, prevista na Lei de Migração – Lei n.º 13.445/17).
Há quem defenda a possibilidade da transferência, todavia, o artigo 100, caput, da referida lei, dispõe que a transferência poderá ser solicitada nas hipóteses em que couber solicitação de extradição executória, ou seja, o cabimento da extradição para o cumprimento da pena parece ter sido inserido como um requisito para a transferência.
Como dito acima, a Constituição Federal veda a extradição de brasileiros natos, de modo que uma interpretação sistemática do dispositivo legal caminharia para a impossibilidade da transferência da execução da pena, já que incabível a extradição executória de brasileiro nato (artigo 82, inciso I, da Lei n.º 13.445/17).
Ainda que assim não fosse, seria preciso refletir acerca da incidência retroativa da Lei n.º 13.445/17, caso aplicável à hipótese, já que os fatos pelos quais o ex-jogador foi condenado ocorreram em 2013, em data muito anterior à Lei.
Respeitando-se as compreensões diversas, a legislação que trata da transferência da execução da pena contém disposições de natureza penal e, portanto, não pode retroagir em prejuízo do condenado. Embora haja um detalhamento do procedimento, o que confere a aparência de norma processual à Lei, é preciso verificar que há uma verdadeira expansão da pretensão punitiva do Estado.
Se o poder punitivo do Estado e o seu alcance são expandidos, a norma possui natureza penal (ou mista). Sendo de natureza penal, não pode retroagir para alcançar fatos anteriores em prejuízo do condenado.
Conclui-se, portanto, que embora não pareça intuitivamente verdadeiro, a transferência da execução da pena imposta pela República da Itália ao jogador Robinho não é compatível com as previsões normativas que tratam do tema.
E isso, contudo, não significa impunidade. É plenamente possível que os fatos sejam objeto de novo processo – instaurado no Brasil -, ocasião em que o ex-jogador exercerá o seu direito de defesa e, se o caso, será condenado pelos fatos praticados, já que, embora ocorridos no estrangeiro, estão sujeitos à lei brasileira, porquanto cometidos por brasileiro (artigo 7º, inciso II, alínea “b”, do Código Penal”).
Sob essas considerações, e sem qualquer pretensão de esgotar o assunto, percebe-se que o tema é bastante delicado e com certeza demandará maiores discussões, tendo o potencial de configurar um marco na interpretação dos temas aqui abordados e até um convite para a modernização da legislação.
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