Alguém me explicou dia desses, com a sabedoria de quem não foge do amor, menos ainda da dor, que há um lugar fora do nosso círculo rotineiro de conforto chamado “madriguera”. Em espanhol, essa palavrinha me soou desconhecida. Pedi que me traduzissem. Em português, uma das possibilidades de explicá-la seria dizer que se trata de uma espécie de toca, local tranquilo onde qualquer um se sente protegido.
Passei, então, a desejar ardentemente encontrar o tal caminho que me levaria a esse oásis da alma, mas não sei bem por onde começar. A amiga que me apresentou o termo me deu a dica: para chegar até lá, é preciso abrir a gaiola na qual estamos acostumados a viver, enclausurados por uma suposta segurança, na verdade, medrosa.
A ideia de bater as asas por esse refúgio me encantou. Onde estaria a minha “madriguera”? Concluí que cada uma assume formatos distintos, depende do tamanho da vontade de viver de cada um. Se assim for, a minha é gigante. Fora da minha gaiola, imagino um mundo de possibilidades, ainda que, por enquanto, esteja na porta, apenas espiando o que tem do lado de lá da grade.
Descobri que os passos para fora de nossa prisão mental e emocional podem ser dados aos poucos. Pequenos gestos são libertadores. Diante do espelho, me lembrei disso há menos de uma semana. Estava cansada da minha cara desmilinguida, tão sem sal quanto meu cabelo liso e sem corte. De supetão, fui ao salão. O cabeleireiro era um jordaniano. Uma boa escolha que poderia trazer picotes de sotaque estrangeiro a meus fios, já tão familiares e enjoativos.
Com um sotaque forte, ele me olhou de cima a baixo. De frente e de costas. Sentada e em pé. E me deu a sentença: “ou repicamos ou cortamos curto”. Hesitei. Mudar não é fácil. Deixar para trás a jaula que nos traz confiança dá medo. Bastou, então, me lembrar do conceito recém-apresentado da “madriguera” para decidir. “Corte! Faça o que você quiser”, determinei. Com a navalha, ele deixou minha nuca exposta. Meu cabelo que, por anos, foi cultivado até o meio das costas, estava em pedaços no chão.
Com ele, ficou um pouco espalhado ali uma parte da minha conhecida fisionomia. Se cabelo dá força à Sansão, a falta dele oferece novos ares às mulheres. A mudança da aparência promove a interior. O modo que te olham é diferente, os interesses que você atrai são igualmente distintos. Sem alguns centímetros de cabelo, me sinto mais leve. Quem sabe assim fica mais fácil voar e visitar o abrigo desconhecido, e tão tentador, que me espera?
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