Sabor da infância

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Eu estava diante de um omelete, que promoveram à categoria de prato fino ao misturá-lo com presunto parma e cogumelos. Minha amiga, conformada com a pequena porção de guacamole, que lhe matou o desejo, mas não a fome.

As duas, na tentativa de serem comedidas, e resistentes, frente à um cardápio tão calórico quanto delicioso. Escolhemos assim o que fosse menos nocivo à manutenção da nossa monótona e persistente dieta. Na falta de melhor alternativa, restou-nos nos contentarmos com as minguadas porções – que custaram os descabidos R$40 a cada uma – e acalmar a ânsia de comilança por meio de um devaneio gastrônomico.

A conversa foi profeitosa. Nos livrou da tentação de pedir um gorduroso sanduíche ou um abençoado brownie, e me fez chegar a uma conclusão: pobres meninos abonados de hoje. A escassez tem muito mais abundância de lembranças do que o excesso de ofertas saborosas.

Eu e minha amiga remontamos alguns momentos mais especiais da nossa infância, só baseadas nas guloseimas que eles me remetem. Fizemos uma lista de itens açucarados que, não só inflavam as nossas células adiposas, mas preenchiam nossa alma e viraram, para sempre, doces memórias.

Maior importância ganhavam pela excepcionalidade de desfrutá-las. Refrigerante, por exemplo, jamais seria item corriqueiro em um almoço. Ao contrário, fazia parte de cardápio de dia especial: banquete de domingo ou aniversário de algum dos comensais. Comer sanduíche em lanchonete fast food era passeio feito em família, em ocasiões singulares, ou um lanche depois do cinema para fechar um domingo inesquecível.

E os salgadinhos de pacotes? Os pais não se importavam com as descrições tenebrosas nos rótulos. Gordura trans era uma variedade de veneno coméstivel que nunca ninguém tinha ouvido falar. Nós, crianças, tínhamos a iguaria como agrado. Lá em casa, podíamos escolher um saco todas as vezes que meu pai ia ao supermercado. Eu assumia a tarefa com seriedade: refletia os prós e contras de cada sabor, e administrava a quantidade para durar mais tempo.

E que delícia era ter o aniversário adoçado por uma caixa de bombons. Era tão raro ter acesso a uma, que só a alcançávamos se fosse presente em dia de festa. E a caixa era só sua. Ganhar o direito de fazer o que bem entendesse com aqueles chocolates era o mesmo que receber uma carta de emancipação aos 6 ou 8 anos de idade.

Rodízio de pizza era encontro festivo dos mais aguardados com os amigos. Sem falar na infinidade de balinhas e chicletes com sabor de infância, que alguém teve a ousadia de descontinuar a fabricação.

Açúcar e gorduras eram regulados quando eu era criança, igualmente como, depois de adulta, tento fazer na minha rotina alimentar. Mas, hoje, restrinjo por uma questão de saúde e estética. Antes, o controle tinha razões bem mais simplistas, como a oferta reduzida. Justamente porque eram raros, eram tão saborosos e deixaram gosto inesquecível na minha vida e na da minha amiga. Definitivamente, a mesa sempre farta é sem sabor e deixa a alma insossa.

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