Eu estava preocupada com ela. O avião de Sabrina pousaria antes que eu pudesse deixar um compromisso. Mas ela chegou bem. Pisou em minha casa e me mandou uma foto de que já estava no quarto que reservei para recebê-la. Respirei aliviada.
A história seria normal não fosse o fato de eu ter dentro da minha casa uma quase estranha. Nos falamos por e-mail pela primeira vez há menos de dois meses. Ela encontrou na internet um texto escrito por mim e se identificou com a história. Me agradeceu por colocar em palavras o que ela também sentia.
Retribuí o carinho e descobrimos ter uma série de outras afinidades. Inclusive a disposição de abrir meus braços para novos amigos. Ela veio de São Paulo só para me conhecer. Como eu poderia desmerecer a atenção de alguém que trocou o fim de semana com a família para estar com uma desconhecida? Caprichei na limpeza do casa, comprei lanche e cuidei do perfume da roupa de cama em que ela dormiria.
Sou filha de mineiros e aprendi que o jeito de receber alguém em casa é com generosidade e fartura. Me ensinaram que o lugar da visita é na cama, enquanto o dono da casa vai para o colchão. Não sei ser anfitriã sem doar meu tempo e meu capricho. Se for para deixar alguém entrar na minha intimidade, que eu abra verdadeiramente o meu coração e as portas do meu lar. Por isso, deixei a chave debaixo do tapete para uma pessoa que, até então, nunca tinha visto.
A escolha de construir uma amizade foi mútua. Sabrina se mostrou uma grata convidada. Fez questão de reconhecer minha preocupação e oferecer a dela de volta. Acho que assim deve ser a relação entre quem recebe e quem é recebido.
Nas Olimpíadas do Rio encerradas ontem, me emocionou a delicadeza da delegação japonesa que, na cerimônia de abertura, sacolejava a bandeira brasileira. Uma singela homenagem de agradecimento ao país que os acolhia.
Proporcionalmente a meu orgulho com a educação nipônica, fiquei profundamente decepcionada com a vaias da torcida brasileira, dirigidas aos adversários. Rechaço a justificativa de que a irreverência nacional explicaria o que considero clara grosseria e falta de espírito esportivo.
A falha dos anfitriões, porém, não foi mais grave que a ausência de polidez de alguns convidados. Reprovável o comentários do francês Renaud Lavillenie, do salto com varas, que escolheu o adjetivo “bizarro” para definir nosso país.
Vergonhosa também a postura do jornal americano New York Times ao estampar em suas páginas que o biscoito globo “era sem gosto como a comida carioca”. Até concordo em partes. O iguaria de textura ressecada também não me apetece, mas é grave descortesia fazer piada e cuspir, diante do mundo inteiro, no prato em que se estava comendo.
Grosseria também da goleira americana, Hope Solo, que postou foto toda paramentada com um kit de proteção contra a zica, em tom de deboche. A infeliz piada não foi perdoada. Os brasileiros deixaram claro que estavam ofendidos e vaiaram a atleta em todas as partidas.
O troco não merece aplausos, mas entendo a indignação. Sua casa é sagrada. Ali, está parte de sua essência, onde se abrigam alguns de seus mais secretos pensamentos e gostos. Nunca deixe a chave para quem não respeitar santuário tão particular. Nunca desrespeite a confiança de quem destrancou as fechaduras desse espaço. Quem lhe abriu as portas, abriu também uma fresta da própria alma. Entre, agradeça e seja muito bem-vindo.
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