Diante da pandemia do novo coronavírus, foram muitos os países que pressionaram pelo adiamento dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Tóquio-2020, originalmente marcados para 24 de julho e 6 de setembro, respectivamente. Espanha, Brasil e Austrália manifestaram-se favoráveis à alteração da data na semana passada.
Canadá, Noruega e Reino Unido chegaram a anunciar boicote caso os Jogos Olímpicos mantivessem a agenda. Mas a confirmação da postergação do maior evento esportivo do planeta para 2021 só aconteceu horas depois da mudança de opinião do comitê dos Estados Unidos, que declararam apoio à protelação do evento após pressão dos atletas.
Em 17 de março, o comitê espanhol alegou que seus atletas competiriam em situação de desigualdade com os adversários por causa da situação do coronavírus no país ibérico — terceira nação mais afetada pela pandemia, atrás de Itália e China. O Brasil engrossou o coro pela postergação na semana passada. Enquanto isso, o comitê olímpico dos EUA era pressionado pelas federações de natação e atletismo a se posicionar.
No domingo (22/3), o COI pediu quatro semanas de prazo para uma definição. Horas depois, o Canadá era o primeiro a anunciar oficialmente que não enviaria atletas às Olimpíadas de Tóquio nas datas previstas originalmente. A Noruega entrou no grupo pelo boicote e a Austrália pedia aos seus representantes que se preparassem para a Olimpíada de 2021. Na noite da última segunda-feira (23/3), os EUA se posicionaram contra a manutenção do evento em 2020.
Numa demonstração de força, a maior potência esportiva do mundo viu o COI se render e anunciar a transferência do megaevento para 2021 na manhã de terça-feira (24). Até então, Tóquio-2020 estava na contramão de competições importantes como a Eurocopa e a Copa América, torneios de seleções adiados, respectivamente, pela Uefa e a Conmebol, para o ano que vem. Competições como a Champions League, a NBA, Roland Garros e Fórmula 1 agiram com celeridade na tomada das decisões.
A atitude do COI interfere na vida de 17 mil pessoas, entre atletas e membros de delegações, mas as mudanças que o adiamento poderia causar na economia era o que mais pesava, após o golpe financeiro sentido em função da pandemia do novo coronavírus. A estimativa do custo total da organização dos Jogos de Tóquio, feita no fim de 2019, era de 11,5 bilhões de euros. A conta seria dividida entre Tóquio (597 bilhões de ienes), o Comitê Organizador local (603 bilhões de ienes) e o estado central (150 bilhões de ienes). Com a alteração, a conta vai subir.
Segundo dados da organização, haviam sido comercializados 4,48 milhões de ingressos ao público em geral no Japão. Eram milhões de hospedagens reservadas. A Vila Olímpica é outro componente. Composta por 21 torres de 14 a 18 andares, o conjunto foi erguido em um terreno de grande valor imobiliário, com vistas para a baía de Tóquio e a famosa Rainbow Bridge. A venda para a população dos 4.145 apartamentos de luxo em que a vila olímpica se transformará também terá de esperar, colocando em dúvida contratos de propriedade assinados.
Em relação ao poderio financeiro, os Estados Unidos têm realmente mais poder de influência do que os demais países que participarão dos Jogos de Tóquio. Metade das empresas parceiras mundiais do evento são norte-americanas. Coca-Cola, AirBnB, Dow, GE, Intel, P&G e Visa estão entre as 14 parceiras olímpicas de Tóquio-2020. A outra metade é composta por marcas japonesas, chinesas, francesas, coreanas e suíça.
O nome do evento, por sinal, será mantido, apesar da alteração para 2021. Mais do que uma referência ao ano da competição, a presença dele junto ao nome da cidade é uma marca. E ela vem sendo usada na divulgação do próprio evento e dos produtos e marcas associadas a ele desde a escolha de Tóquio como sede, em 2013.
No Japão, outro setor que será atingido é o de turismo — em crise assim global. O Ministério do Turismo japonês havia estimado em 600 mil o número de visitantes estrangeiros esperados para os Jogos de Tóquio-2020. Mas tensões históricas entre Tóquio e Seul, em 2019, provocaram boicote de turistas sul-coreanos no meio de 2019. Com a pandemia da Covid-19, o número de visitantes estrangeiros no Japão caiu 58,3% em relação ao ano anterior, segundo dados de fevereiro do Escritório Nacional de Turismo do Japão (JNTO).
Entretanto, a economia japonesa é altamente diversificada e industrializada. O maior entrave financeiro para o país será mesmo a pandemia do novo coronavírus. O gabinete de estudos Fitch Solutions estimou nesta semana que o PIB japonês recuará 1,1% em 2020, em vez da previsão anterior de 0,2%, devido ao impacto da Covid-19 no consumo, turismo e exportações. O adiamento das Olimpíadas pode agravar a previsão.
Apesar dos muitos impactos econômicos no Japão, o presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI), Thomas Bach, ressaltou que as consequências financeiras do adiamento das Olimpíadas de Tóquio para 2021 “não foram discutidas e não são uma prioridade, trata-se de proteger vidas”. “Estamos todos conscientes da gravidade e extensão da pandemia e, mais importante, das consequências para a vida das pessoas”, disse Bach, na teleconferência do COI.
“Tínhamos números alarmantes no domingo e depois na segunda-feira. Mas também tínhamos números alarmantes na África e na Oceania. Concordamos (com o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe) que, nessas circunstâncias, os Jogos tiveram que ser remarcados para depois de 2020, mas o mais tardar no verão (boreal) de 2021”. completou Bach.
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