À queima-roupa // Rita Lima, vice-presidente institucional da ANADEP (Associação Nacional dos Defensores e Defensoras Públicas)
por Ana Maria Campos
Por que vocês consideram inconstitucional o projeto que cria a advocacia dativa no DF, aprovado ontem pela Câmara Legislativa?
O projeto que cria a advocacia dativa é claramente inconstitucional porque segue a lógica contrária do que determinou o legislador constituinte em 1988 que elegeu a Defensoria Pública como o único órgão estatal predestinado ao exercício ordinário da competência do Estado de oferecer assistência jurídica gratuita aos que não disponham de meios para contratação de advogado. Daí, qualquer política pública que desvie pessoas ou verbas para outra entidade, com o mesmo objetivo em prejuízo da Defensoria, como já decidiu o STF, insulta a Constituição da República. A jurisprudência do STF, por repetidas vezes, vem reiterando o entendimento da inconstitucionalidade desse procedimento ou qualquer outro que vise a resolver a falta de defensor público com advogado dativo, contratação temporária de advogados, convênios com OAB ou qualquer outra forma que não seja a dada pela Constituição Federal.
Qual é o prejuízo para a sociedade?
A advocacia dativa atua representando a pessoa carente de recursos em atos de um processo judicial. A assistência jurídica prestada pela Defensoria Pública é muito mais do que isso. Defensoras e defensores atuam na promoção de direitos humanos na esfera extrajudicial de forma estratégica, evitando processos, promovendo acordos, participando da formulação e fomento de políticas públicas. Até mesmo a atuação em processo judicial feita pela Defensoria Pública é diferenciada, pois deve ser feita em articulação com todos os serviços da rede pública, no intuito de reduzir a vulnerabilidade econômica e social vivenciada pela população atendida. Mais: a advocacia dativa funciona por meio de nomeação por parte do/a juiz/a da causa e o projeto não prevê nenhum critério objetivo para essa nomeação. Isso quer dizer que o/a juiz/a vai escolher qual advogado/a atua em cada caso, o que pode gerar indicações de acordo com a sua preferência. Os membros da Defensoria Pública têm inamovibilidade, o que quer dizer que não podem ser “retirados” dessa ou daquela vara. A justiça é um bem e um serviço público e deve ser garantida em condições de igualdade para todas as pessoas. Para cumprir com isso o Estado consagrou o modelo público de defesa através da opção constitucional de que as pessoas possam ter seus direitos defendidos de maneira completa, sem interferências pautada pelo interesse privado. Na medida em que o governo trabalha pela aprovação de projetos que fogem a lógica do modelo constitucional vigente, ele fragiliza a lógica da independência da defesa e vulnera o acesso à justiça.
Fica mais caro para os cofres públicos?
Investir na Defensoria Pública é, sem dúvida, o melhor custo-benefício para o estado e para a população. Segundo o projeto de lei, o advogado dativo receberá por ato praticado no processo, de acordo com a tabela da OAB. Uma audiência, por exemplo, custa, atualmente, pelo menos 342 reais. O acompanhamento de um processo judicial pode chegar a mais de 8.000 reais, conforme levantamento feito pela Associação das Defensoras e Defensores Públicos do DF (ADEP/DF). A Defensoria Pública, por outro lado, atua com altos índices de produtividade. Apenas em 2021, realizou cerca de 600 mil atendimentos jurídicos e ingressou com mais de 25 mil ações judiciais no DF, contando com menos de 300 defensores. Em média, cada Defensor/a Público/a do DF realizou mais de três mil atos judiciais em 2021, além de, como já dito, participarem de outros atos extrajudiciais de promoção de direitos humanos, o que não é feito pela advocacia dativa. Segundo cálculos feitos com a ADEP/DF, um advogado dativo com a produtividade média de um defensor público pode custar até dez vezes mais para os cofres públicos. O projeto ainda é ilegal por permitir direcionamento do dinheiro público sem regras transparentes sobre a impessoalidade, eficiência, continuidade, e demais princípios que regem os gastos de verbas públicas. Por outro lado, a Defensoria Pública, por meio de seus gestores, responde pelos gastos do orçamento dentro da mais estrita legalidade.
Há um receio de enfraquecimento da Defensoria Pública?
Sim. O projeto de lei destina verbas públicas para o custeio de uma atividade privada, qual seja, a advocacia dativa. Este orçamento poderia ser direcionado à estruturação da Defensoria Pública, para nomeação de mais defensoras e defensores públicos ou investimento em tecnologia, por exemplo. Quando o estado investe em formas precarizadas de assistência judiciária, deixa de fortalecer a instituição que constitucionalmente foi prevista para garantir o acesso à justiça e a promoção de direitos humanos para a população vulnerável, que é a Defensoria Pública. Ademais, o substitutivo apresentado nesta tarde (ontem) permite a nomeação de advocacia dativa até mesmo em casos em que a Defensoria Pública tem atuação na vara, abrindo a possibilidade para que haja a “retirada” da Defensoria Pública de casos em que ela já deveria atuar.
Se virar lei, a Associação poderá acionar a Justiça?
Se o projeto de lei for aprovado, o tema será levado à diretoria da ANADEP para deliberar sobre o acionamento judicial para debater a sua inconstitucionalidade.
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