Ao que parece, Vítor Pereira finalmente tem um plano para o Flamengo, mas o protótipo da ideia só funcionou no primeiro tempo da decisão da Recopa Sul-Americana no Maracanã — o período do jogo em que o Flamengo apresentou um bom futebol e até poderia ter resolvido a partida contra o Independiente del Valle. O time rubro-negro esbarrou três vezes na trave.
O plano de Vítor Pereira lembra conceitos de Pep Guardiola no Manchester City e até mesmo de Tite na Seleção Brasileira. O técnico português tentou configurar o Flamengo ofensivamente no 3-2-5/2-3-5 em alguns trechos da partida. A saída de bola ficava com Fabrício Bruno, David Luiz e Thiago Maia, este como falso zagueiro. O volante iniciava as tramas rubro-negras alinhado com Vidal e Everton Ribeiro (2-3-5) ou formando trinca de zagueiros com Fabrício Bruno e David Luiz (3-2-5). As alternativas não são aleatórias. Fizeram parte do repertório de Vítor Pereira nas passagens por Fenerbahçe e Shangai SIGP. A prova de que o modelo está sendo ensaiado é o discurso pós-jogo do treinador. “O grupo quer jogar um futebol agressivo”.
Éverton Ribeiro, o melhor do Flamengo na etapa inicial, recuava para ficar próximo de Vidal e aumentar a qualidade na transição do Flamengo para o ataque. Os laterais Varela e Ayrton Lucas avançavam como se fossem pontas. Graças ao suporte da dupla, o ataque ficava com cinco homens. Além dos alas, Gabriel Barbosa, Arrascaeta e Pedro circulavam em frente à área equatoriana.
Como o gol não saiu, o plano começou a se mostrar frágil no segundo tempo devido a um problema crônico do Flamengo: o cansaço. Lá se vão dois meses de temporada e o elenco não dá sinais de equilíbrio físico. O condicionamento físico do grupo não é homogêneo. Exigido ao extremo no primeiro tempo, Everton Ribeiro pregou na etapa final. Arrascaeta admitiu depois do jogo que está abaixo da capacidade. Pedro aparentou estar em campo no sacrifício. Vidal nem se fala. Quando está em desvantagem no lance, comete faltas, arrisca levar cartões e reclama demais.
Com o andar da partida e a tensão causada pela obrigação de fazer no mínimo um gol, o plano de Vítor Pereira começou a derreter no Maracanã e ele colocou em ação um dos planos prediletos. Um Flamengo com pontas abertos. Primeiro, Everton Cebolinha na esquerda. Depois, Matheus Gonçalves bagunçando com liberdade de movimentação. Entrou com personalidade.
Ironicamente, o gol saiu quando o Flamengo estava exposto, desorganizado e na base do abafa. Gabigol iniciou a trama com a inversão de bola para Cebolinha dar assistência com estilo nos pés de Arrascaeta. Mal sabia o meia uruguaio que viveria uma noite de Willian Arão. Em 2020, o volante salvou o Flamengo contra o Racing nas oitavas de final da Libertadores com um gol no fim da partida, forçou a disputa por pênaltis e desperdiçou a cobrança dele. Arrascaeta abriu a série rubro-negra esbarrando no goleiro Moisés Ramirez. O reserva do Equador na Copa do Catar defendeu a cobrança.
Times equatorianos se sentem bem no Maracanã em finais. A LDU festejou os títulos da Libertadores em 2008 e da Sul-Americana em 2009 no principal estádio do país. Ambos contra o Fluminense. Agora, o Independiente del Vale cala 71 mil rubro-negros e se consolida como um contraponto a milionários e badalados clubes sul-americanos como Atlético-MG, Flamengo e Palmeiras. O time equatoriano investe em formação. Ganha dinheiro com isso e quase sempre tem peças de reposição vindas da base ou de refugos como Sornoza.
A fórmula rendeu ao Independiente um vice na Libertadores em 2016 contra o Atlético Nacional da Colômbia; dois títulos da Sul-Americana diante de Colón da Argentina e São Paulo; e agora a Recopa contra o Flamengo. Sob o comando de Vítor Pereira, o time carioca repete o início turbulento do Palmeiras em 2021. Naquela época, o alviverde iniciou a temporada amargando o quarto lugar no Mundial de Clubes, além de vices na Supercopa e na Recopa. A diferença é que Abel Ferreira vinha de títulos na Copa do Brasil e na Libertadores. Vítor Pereira ainda não ganhou nada e terá o até então desprezado Campeonato Carioca como obrigação sob pena de mais uma mudança drástica no comando. A gestão Rodolfo Landim acumula oito técnicos.
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