Um bate-papo com o ex-auxiliar de Dunga, Jorginho, sobre a segunda era do capitão do tetra à frente da Seleção Brasileira

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Jorginho apoia permanência de Dunga e só diverge do amigo na polêmica 94 x 82

Crédito da imagem: Iano Andrade/CB/D.A Press

Jorginho era considerado o cérebro tático de Dunga no ciclo de 2006 a 2010 da Seleção. Poucos conhecem tão bem o treinador do Brasil quanto ele. Desempregado depois de optar por seguir carreira solo, o ex-auxiliar não esconde, na entrevista ao Correio Braziliense, o espanto com a escolha do amigo para liderar a revolução depois do 10 x 1 na Copa, mas só falta vestir a camisa novamente para torcer por Dunga. A maior prova é o discurso inflamado pela permanência dele no cargo após o fracasso na Copa América. Jorginho chega a dizer que, talvez, o fracasso de 2014 não tivesse acontecido se Dunga ficasse no cargo depois da derrota para a Holanda em 2010.  Jorginho pode até perder o amigo, mas não a piada, ao comentar a derrapada de Dunga ao comparar a  Seleção de 1994 com a de 1982. Dunga disse que o time de Telê Santana era “bom com azar”, e o de Parreira, “ruim com sorte”. Dono da camisa 2 no tetra, ele tratou de agir como Dunga e jogar no contra-ataque. “Eu não me considero ruim de jeito nenhum. Eu não era um Leandro, mas procurei fisicamente e em termos de cruzamento ultrapassá-lo. Só que ele era um extraclasse”, argumentou, sério, do outro lado da linha. Excelente lateral, Jorginho dá dois conselhos a Dunga: quer Danilo e Marcelo titulares e sugere o resgate, se possível, de Paulo Henrique Ganso, Alexandre Pato e Lucas.

Você tomou um susto quando soube que o Dunga estava de volta à Seleção?

Foi uma surpresa para mim. Quando você vai a uma Copa e perde é difícil retornar. Isso só aconteceu com o Telê Santana, em 1982 e 1986. Foi um reconhecimento ao trabalho de 2006 a 2010. Quem sabe, se ele tivesse permanecido, a história da Seleção na Copa do Mundo de 2014, talvez, fosse diferente.

Esperava um convite dele para refazer a parceria?

Eu disse a ele que gostaria de seguir a minha carreira como treinador, que não gostaria mais de ser auxiliar. O Dunga vinha trabalhando com o auxiliar dele do Inter. Ele poderia até ter me chamado, mas eu estava no Kashima Antlers.

Ele é o nome certo para comandar a revolução depois do 10 x 1?

Dunga é um cara que tem a personalidade muito forte. A biografia mostra essa questão de ser massacrado e voltar vitorioso.

Mas ele acaba de perder a Copa América…

Ele teve um momento maravilhoso, com 11 vitórias, uma delas sobre a Argentina e outra contra a França, e uma derrota para a Colômbia. Não presta mais porque perdeu nos pênaltis do Paraguai?

Você defende a continuidade?

Falta paciência diante dos maus resultados. A Alemanha perdeu a final para o Brasil em 2002. Em 2006, não ganhou em casa com o Joachim Löw sendo auxiliar. O Klinsmann deixou o cargo, foi morar nos EUA, e o Löw assumiu. Mantiveram o cara depois da derrota na semifinal da Copa de 2010 e da Eurocopa, e ganharam 2014. No Brasil, qualquer derrota a gente quer  mudar.

Percebe evolução no Dunga?

Noto um crescimento grande. Vejo um Dunga mais tranquilo, paciente no relacionamento com a imprensa. Não somente ele, mas eu também aprendi muito depois de tudo aquilo que nós passamos. Ele está mais maduro e disse uma coisa certa. De 2006 a 2010, ganhamos a Copa América, a Copa das Confederações, terminamos em primeiro nas Eliminatórias, ganhamos da Argentina lá, por 3 x 1, do Uruguai lá, por 4 x 0, perdemos um tempo de jogo contra a Holanda e ninguém deu valor. O que não valia antes vale agora? Tem gente reclamando até que não vamos disputar a Copa das Confederações de 2017? Precisamos ter paciência. Treinador de Seleção não é técnico de clube. Dunga está completando cinco anos como técnico da Seleção. É preciso dar tempo.

Entrevista publicada nesta segunda no Correio

Mas a visão de jogo não mudou.

Não me sinto à vontade para falar de questões táticas. O que posso dizer é que estamos carentes de bons jogadores. Nós jogávamos no 4-4-2 na Copa de 2010, o sistema foi o mesmo na Copa América, mas não funcionou. O Dunga varia algumas vezes para o 4-2-3-1, mas houve muitos desfalques.

Nossos técnicos estão atrasados?

Copa do Mundo é uma tendência muito forte. É normal as pessoas valorizarem a Argentina e a Alemanha, que chegaram na final. O Felipão foi campeão em 2002 e dizem que ele está ultrapassado. Nós não conseguimos criar grandes jogadores. O único craque é o Neymar e ponto. Jogadores saem daqui muito mais cedo do que o normal. Eu deixei o país com 24 anos. Há uma perda no vínculo com a torcida, com o futebol brasileiro. Vejo também uma ida precoce de jogadores para mercados como Arábia, China… Antes, a gente ia pra lá quando não pensava mais em Seleção.

Você trabalhou nos Emirados Árabes. É a favor de convocar jogadores desses mercados?

O nível na Arábia, na China, está muito aquém do Brasil. O nível é fraco, mediano. Automaticamente, a exigência cai, os treinos são geralmente à noite por causa do calor. Tudo muda para o cara. Imagina ele sair de lá para vir ao Brasil se apresentar à Seleção. Mas aí, o Dunga vai convocar quem de atacante no Brasil? O Fred é goleador, mas não aconteceu na Copa. O Renato Cajá foi meu jogador na Ponte Preta. Tá jogando pra c…, mas você vai chamar o Cajá e deixar fora o Everton Ribeiro pelos dois anos que ele fez nos dois títulos do Cruzeiro?

O Ganso era um dos 30 na lista da Copa de 2010. Não serve mais?

O Ganso teve uma contusão extremamente séria. De lá para cá, não conseguiu voltar a ter o mesmo nível de atuação daquele período em que o colocamos na lista dos 30 convocados para a Copa de 2010. Ele caiu muito de produção, mas eu acredito que ainda é um jogador que nós vamos conseguir resgatar. Ele é o camisa 10 de que a gente precisa, que não temos. Posso falar o mesmo do Pato, do Lucas… Eles precisam de regularidade. Quando não conseguem isso, deixam de ser um jogador de Seleção e passam a ser jogador de clube. Eles precisam ter atuações dignas de Seleção. Quando isso acontecer, não duvide, o Dunga convoca.

Você era lateral. Está satisfeito com os escolhidos pelo Dunga?

O Danilo é um grande jogador. Forte fisicamente, cruza muito bem. Ainda quero ver na Seleção o Marcelo. O Filipe Luís é consistente defensivamente, mas o Marcelo é mais criativo ofensivamente. Se o Marcelo atingir esse equilíbrio, ele é a melhor opção para ser o titular da Seleção.

Ao comparar a geração atual à de 1994, o Dunga meteu a de 1982

no meio e disse que o time do Telê era bom com o azar e o do Parreira ruim com sorte. Concorda?

Eu não me considero ruim de jeito nenhum. Eu não era um Leandro, mas procurei fisicamente e em termos de cruzamento ultrapassá-lo. Só que ele era um extraclasse tecnicamente falando. Mas eu acredito que a nossa Seleção (de 1994) era muito boa. A Seleção de 1982 tinha uma extrema capacidade, perdeu, mas poderia ter ganho. Comparar gerações é difícil.

É a favor de um técnico estrangeiro na Seleção?

De jeito nenhum. Nós temos grandes treinadores. Na verdade, nós precisamos trocar ideias com eles e a CBF está querendo isso.

Sampaoli levou o Chile ao título inédito. O que acha dele?

Quando você tem resultado, é bom. É diferenciado em termos de tática e vive excelente fase. Mas daqui a pouco começam as eliminatórias. Se o Chile perder dois jogos, vão falar que era fogo de palha. Eu venci a Copa Suruga contra ele, eu no Kashima Antlers e ele na Universidad de Chile.

Você e o seu auxiliar, Zinho, estão no mercado. Tá difícil encontrar?

Tive propostas de times da primeira divisão, mas não chegamos a um acordo financeiro. Fiz um cursinho da CBF, procurei estudar bastante as tendências, em breve vou à Alemanha e a Portugal. Tudo isso para que, quando pintar uma oportunidade, eu esteja preparado e atualizado.

O estágio com Pep Guardiola é mais um passo para trabalhar em um clube da Alemanha?

Trocamos ideias, temos uma ótima relação. Como falo alemão,  quero dirigir um time de lá.

Marcos Paulo Lima

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Marcos Paulo Lima

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