Houve debates durante um bom tempo sobre a possibilidade de uma espanholização no futebol brasileiro. Na prática, um domínio parecido com o de Barcelona e Real Madrid em La Liga. Testemunhamos ensaios como a alternância de Palmeiras e Corinthians no poder na Série A do Campeonato Brasileiro no período de 2015 a 2018, mas agora vivemos tempos que lembram o triunvirato romano. Três clubes se impõem e dominam as principais competições do país. Um deles é o Flamengo, tetracampeão da Copa do Brasil.
Das últimas cinco edições do Campeonato Brasileiro, quatro foram conquistadas por Palmeiras, Flamengo ou Atlético-MG. A Copa do Brasil também virou salão de festas dos três. A taça ficou com o Palmeiras em 2020, Atlético-MG em 2021 e Flamengo em 2022. Reforçando: dos últimos oito torneios nacionais, os três ricos venceram sete. Só não são oito porque o time alviverde ainda não oficializou a conquista no Brasileirão. O time paulista lidera com oito pontos.
O fato é que temos um triunvirato no futebol brasileiro. O Corinthians tentou quebrar a sequência dos títulos de Flamengo, Atlético-MG e Palmeiras com uma bela exibição na noite desta quarta-feira, no Maracanã. Para mim, o técnico Vítor Pereira errou na formação do primeiro tempo ao posicionar o time no 5-3-2. Ele tinha um plano, óbvio. Dar liberdade ao meia Renato Augusto. Evitar que ele ficasse esgotado fisicamente e suportasse a partida inteira.
O português entendeu que a principal peça do meio de campo se desdobrou na partida de ida, na Neo Química Arena, em São Paulo. Ciente do potencial rubro-negro para criar lances pelo meio, tentou forçar Dorival Júnior a mover as peças para o lado do campo. A fórmula não surtiu efeito. O Corinthians foi dominado pelo Flamengo por pelo menos 20 minutos. Sofreu o gol de Pedro justamente como tentava evitar, ou seja, em um passe magistral de Éverton Ribeiro, um dos melhores em campo pelo lado rubro-negro. Ele deixou o centroavante na cara de Cássio e o camisa 9 finalizou com extrema frieza e categoria, rasteiro, por baixo do goleiro alvinegro.
Em vez de se encolher, o Corinthians cresceu. Se fosse um time de futebol americano, diríamos que passou a conquistar jardas e conseguia se expor muito pouco aos riscos. Sofreu dois gols corretamente anulados por impedimento, é claro, mas dominou o Flamengo no Maracanã com uma impressionante aplicação tática coordenada, principalmente, por Renato Augusto. Lá atrás, Gil, mais uma vez, dava conta do quarteto ofensivo dos anfitriões com exibição de gala.
A entrada de Adson no segundo tempo foi minando o Flamengo. Desfigurou o time de Dorival Júnior. Os donos da casa perdiam cada vez mais o meio de campo e não tinham o contra-ataque. O empate parecia questão de tempo. Dorival Júnior tirou o exausto Vidal e começou a desfigurar o time. Vítor Pereira cortou as conexões do adversário e deixou um time robusto em campo até chegar ao empate. Quando Giuliano igualou o placar, o Flamengo tinha em campo: Santos; Rodinei, Fabrício Bruno, Léo Pereira e Filipe Luís; David Luiz, Matheuzinho, Victor Hugo e Éverton Ribeiro; Éverton Cebolinha e Gabriel Barbosa. Parafraseando Renato Russo, o jogo havia se transformado em uma festa estranha com time esquisito no Maracanã.
Vítor Pereira afirmou antes da batalha final que a única fórmula para tirar o Flamengo da zona de conforto era tirando-lhe a bola. O português conseguiu bugar Dorival Júnior com uma incrível imposição de 62% de posse contra 38% de quem ostentava o papel de mandante na decisão. Segundo dados do Sofascore, o Timão trocou 558 passes no Maracanã contra 333 do adversário. Por sinal, a decisão da Copa do Brasil quebrou paradigmas. O país que dá tanta importância ao mando de campo em mata-mata nos sorteios viu o Flamengo dominar o primeiro jogo na Neo Química Arena e ser dominada no Maracanã na partida de volta.
O RODÍZIO DE CAMPEÕES NO TRIUNVIRATO
» Brasileirão
2022 – Palmeiras lidera com 8 pontos de vantagem
2021 – Atlético-MG
2020 – Flamengo
2019 – Flamengo
2018 – Palmeiras
» Copa do Brasil
2022 – Flamengo
2021 – Atlético-MG
2020 – Palmeiras
Ao arrastar a decisão para os pênaltis, o Corinthians chegou fortalecido. Àquela altura, tinha melhores cobradores do que o Flamengo. Basta ver quem bateu antes dos alternados: Fábio Santos, Giuliano, Renato Augusto, Fágner e Youri Alberto duelaram com Filipe Luís, David Luiz, Léo Pereira, Éverton Ribeiro e Gabriel Barbosa. Apenas os dois últimos estão acostumados a bater pênalti. Cássio defendeu a cobrança de Filipe Luís, mas os erros de Fágner e de Mateus Vital aliada à sorte do goleiro Santos estenderam tapete vermelho para o herói improvável.
Rodinei, o jogador mais folclórico e questionado do elenco rubro-negro, tinha missão de brindar o Flamengo com o tetracampeonato. Havia voltado de empréstimo a contragosto no ano passado depois de uma boa passagem pelo Internacional. Foi de titular no time colorado a segundo reserva na volta ao Ninho do Urubu atrás de Isla e Matheuzinho. A chega de Dorival Júnior mudou o patamar dele. Rodinei virou a melhor opção de ataque pela direita, mas também o ponto fraco do sistema defensivo. Coube a ele estufar a rede de Cássio e marcar pela segunda vez um gol de título para o Flamengo. Foi dele o último gol no triunfo contra o Fluminense na final do Campeonato Carioca de 2017. Se existe volta por cima, a noite estava reserva a Rodinei.
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