Tanta coisa em tão pouco tempo: Hugo Souza precisa de atenção especial dos pés à cabeça

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A sucessão de fatos, alguns inesperados, na carreira do goleiro Hugo Souza, indica que está brotando mais um bom goleiro no futebol brasileiro. Ele teve, por exemplo, aval de Taffarel na convocação de Tite para uma intercâmbio na Seleção Brasileira principal depois da Copa 2018. É cotado para assumir as traves da esquadra olímpica de André Jardine nos Jogos de Tóquio.

Tudo isso é lindo, mas acho que o Flamengo precisa cuidar da mente de um dos vilões da derrota para o São Paulo nesta quarta-feira, no Maracanã, no duelo de ida válido pelas quartas de final. Sim, o jovem de 21 anos errou feio. Só não esqueçamos os gols fáceis desperdiçados por Gabriel Barbosa e Arrascaeta, por exemplo.  Porém, óbvio, a falha do menino está em evidência.

Até pouco tempo, Hugo Souza era um daqueles goleiros hipnotizados com a presença do ídolo Julio Cesar treinando no Ninho do Urubu. A imagem foi registrada pelo repórter fotográfico Gilvan de Souza. Não mais que de repente, saltou de terceiro reserva de Diego Alves a titular – na fogueira – contra o Palmeiras na partida em que o elenco do Flamengo sofreu com o surto de covid-19. Aprovado, teve sequência de 14 partidas como titular. Acumulou 12 jogos sem perder. Foi o melhor jogador em vários deles, com direito a primeiro pênalti defendido como profissional contra o Athletico-PR, na Arena da Baixada, na partida de ida das oitavas de final da Copa do Brasil. E o primeiro gol entre as pernas no massacre do Atlético-MG, por 4 x 0.

Hugo Souza ganhou moral com a torcida. Certamente ouviu e leu nas redes sociais que o clube não precisa renovar o contrato de Diego Alves. Depois de ganhar a confiança do técnico Domènec Torrent, que o manteve titular após a recuperação do concorrente, Hugo Souza foi vítima da ruptura. Demitido, Dome deu lugar a Rogério Ceni. Hugo passou a ser jogador de mais um dos seus ídolos na profissão. Aplicado no aprendizado para jogar com os pés, cobra até faltas nos treinos. Rogério Ceni chegou sabendo de tudo isso.

Primeiro, elogiou a aplicação de Hugo. “Vou estar aqui todos os dias acompanhando. Se ele tiver o dom, serei o último a ir contra. Não é uma coisa primordial. Sei que o Flamengo não faz gol de falta há muito tempo. Talvez, pela falta de tempo, porque isso é repetição diária”, afirmou. Depois, anunciou a decisão: “Diego tem capacidade de voltar a jogar, e o Hugo tem feito um grande trabalho. O Diego merece todo respeito pela história que construiu”.

“Faz uns sete ou oito anos que os goleiros jogam mais com os pés, iniciam as jogadas. Isso requer maior técnica, mas as pessoas esquecem que o principal é que um goleiro saiba defender. Me incomoda que se valorize o goleiro porque ele é bom com os pés. É falta de respeito. O primeiro requisito para o goleiro é saber defender, sair da área, socar a bola, agarrar. Só depois podemos analisar a arte com os pés”

Gianluigi Buffon, goleiro da Juventus

Diego Alves voltou, mas deixou o campo lesionado no segundo tempo. Hugo Souza voltou a assumir a posição que julgava ser dele. Mas aí, comportou-se como aquela criança que vê os pais recebendo visita e acha de chamar mais atenção do que os convidados. O que justifica aquela tentativa de driblar Brenner dentro da pequena área? A bola caiu na perna esquerda e ele precisava ajeitá-la para a direita a fim de dar sequência ao lance? Por que não fez o simples, ou seja, deu um chutão para a frente ou empurrou pela linha de fundo para ceder escanteio?

Pai de menino que está recebendo visita e vê o filho tentando roubar a cena pergunta logo assim: “Está querendo aparecer?”. Talvez, Hugo Souza tenha arriscado mostrar o talento – que ainda não tem – a Rogério Ceni, simplesmente o maior goleiro-artilheiro da história do futebol. Havia necessidade disso? Nenhuma! Como também não fazia sentido a defesa acionar Hugo tantas vezes numa saída de bola, aos 43 minutos do segundo tempo, em um jogo mata-mata. Por sinal, 43 minutos é tempo sagrado para o torcedor rubro-negro. É “time” de conquistar título, não de entregar jogo. Petkovic decidiu a final do Carioca 2001 contra o Vasco justamente aos 43 da etapa final.

Muitos dirão que é preciso intensificar o trabalho de saída de bola com os pés de Hugo Souza. Do ponto de vista técnico, sim. Mas o Flamengo tem que dar atenção à cabeça do jogador. Mandá-lo ao divã do psicólogo do clube faz bem. São muitos altos e baixos em tão pouco tempo.

Saltar de terceiro reserva a titular, deixar Diego Alves no banco, pegar pênalti, sofrer o primeiro gol entre as pernas como profissional, trabalhar de repente com Rogério Ceni, cometer erro grave em duelo das quartas de final e até mesmo o alardeado fim do recente noivado merecem acompanhamento. Um diamante como Hugo Souza deve ser zelado, lapidado, consolidado.

Aos críticos dos goleiros que não têm facilidade para trocar as mãos pelos pés, vale a reflexão do experiente goleiro italiano Gianluigi Buffon: “Faz uns sete ou oito anos que os goleiros jogam mais com os pés, iniciam as jogadas. Isso requer maior técnica, mas as pessoas esquecem que o principal é que um goleiro saiba defender. Me incomoda que se valorize o goleiro porque ele é bom com os pés. É uma falta de respeito. O primeiro requisito para o goleiro é saber defender, sair da área, socar a bola, agarrar. Só depois podemos analisar sua arte com os pés”.

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Marcos Paulo Lima

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