Expulsão precoce de Douglas Luiz à parte, falerei sobre isso no fim deste post, não causa surpresa o empate da Seleção por 0 x 0 com a Costa do Marfim na segunda rodada do Grupo D do torneio de futebol masculino. Vou justificar a tese com cinco argumentos e alguns acréscimos.
O Brasil tem trauma contra africanos. Foi eliminado pela Nigéria em Atlanta-1996, por Camarões em Sydney-2000 e sofreu até mesmo na campanha da inédita medalha de ouro conquistada em casa nos Jogos do Rio-2016. Empatou por 0 x 0 com a África do Sul no abarrotado Mané Garrincha, em Brasília. Indignados, 69.389 torcedores gritaram o nome de Marta no segundo tempo, inconformada com o desempenho da trupe liderada por Neymar.
Meu segundo argumento contrataria aquele papo de que treino é treino, jogo é jogo. A dificuldade do Brasil contra uma outra seleção africana antes do início dos Jogos foi o trailer do que vimos no raiar do sol deste domingo. Em 5 de junho deste ano, os comandados de André Jardine perderam para Cabo Verde, 73ª no ranking da Fifa, em um dos últimos testes antes da convocação. Nino, Guilherme Arana, Bruno Guimarães, Claudinho, Antony, Malcom, Gabriel Martinelli participaram daquela partida, ou seja, mais da metade do time que jogou neste domingo.
Meu terceiro argumento é um vício do futebol brasileiro nas divisões de base. Impressiona como a nossa indústria fabrica pontas em série e despreza pensadores no meio de campo. Logo, o jogo fica óbvio. Bola no Antony na direita, bola no Claudinho na esquerda, bola no Richarlison na direita ou na esquerda e poucas ações ofensivas pelo meio. Falta um centroavante com faro de gol na Seleção do Tite. Na de André Jardine, também. Matheus Cunha está decepcionando e Pedro faz muita falta. O Flamengo não liberou seu jogador.
O quarto argumento é o entra-e-sai na formação do grupo. André Jardine insistiu com jogadores que dificilmente seriam liberados. Houve teimosia com Gerson e Pedro, por exemplo. Seria ótimo tê-los, mas o coordenador de seleções Branco comprou uma briga desnecessária que prejudicou o entrosamento do time. O Brasil venceu a Alemanha por 4 x 2, empatou por 0 x 0 com a Costa do Marfim, mas segue tateando um estilo de jogo.
Os movimentos do time estão longe de serem coordenados. Para sorte de André Jardim, o adversário da madrugada de terça-feira é a Arábia Saudita. Dá tempo de buscar entrosamento na última rodada, garantir o primeiro lugar e chegar um pouco mais seguro às quartas de final contra a surpreendente Austrália ou campeões olímpicos Espanha e Argentina. Qualquer um dos três adversários será complicado na fase eliminatória.
Opinião do técnico
O nosso entendimento é a de não compreensão da expulsão. Acabou interferindo muito na equipe, foi muito cedo, ainda mais enfrentando um time forte fisicamente, a exigência foi muito alta. A gente fica sem entender, ainda mais com intervenção usando o VAR, e chegar numa expulsão como essa. No fim das contas, é um jogo que vai fazer o nosso time crescer como equipe, pelo espírito, por termos superado juntos uma situação adversa. Mostraram comprometimento com a camisa da seleção, com o projeto, foi uma demonstração de raça e inteligência para suportar um adversário de força e qualidade
André Jardine
Por último, é preciso valorizar o trabalho feito na base da Costa do Marfim. O país foi a três Copas do Mundo consecutivas, em 2006, 2010 e 2014, surfando na onda do sucesso da geração dos badalados Didier Drogba e Yaya Touré. Os Elefantes trabalham forte nas academias para retornarem ao Mundial, quem sabe, no ano que vem, no Catar.
A geração sub-24 presente no Japão tem parte nisso. Dez jogadores convocados para o torneio participaram da campanha do vice-campeonato na Copa Africana de Nações Sub-23 de 2019. Alguns jovens são aprendizes em times de ponta da Europa, como Franck Kessie (Milan) e Amad Diallo (Manchester United). Portanto, havia um adversário do outro lado.
Destaco, ainda, a dificuldade tática do Brasil para lidar contra sistemas fechados. A Costa do Marfim foi um pouquinho do que vimos muito na Eurocopa. Defensivamente, apostou em uma linha de cinco defensores, o 5-4-1. Treinadores brasileiros sofrem com esse sistema. Ofensivamente, a configuração virava 3-4-3 a fim de tentar sufocar os laterais do Brasil.
Por fim, a expulsão de Douglas Luiz expõe um outro erro grave do Brasil: a saída a de três homens, ou saída lavolpiana, referência ao estilo de jogo do técnico argentino Ricardo La Volpe. Esse tipo de saída de bola é arriscado. Quando há pouco tempo para treinar e um time à caça de entrosamento, mais ainda. Douglas Luiz é quem recua entre os zagueiros para comandar a transição do time. No entanto, quando há erro de passe ou de posicionamento um simples erro vira convite para o adversário balançar a rede.
Douglas Luiz ficou exposto porque houve erro na saída de bola. O volante ficou exposto e cometeu falta. Acho a expulsão questionável. O próprio árbitro ficou indeciso. Ao que parece, foi convencido a dar vermelho pelos homens do VAR. Quando os dois times ficaram com 10 depois da expulsão de Eboué Kouassi, aos 34 minutos do segundo tempo, o Brasil passou a jogar muito mais na base do abafa do que organizadamente. Empate justíssimo.
O Brasil lidera o Grupo D no saldo de gols, mas precisa melhorar muito. O primeiro tempo da vitória contra a Alemanha precisa virar regra. O adversário nas quartas de final não será fácil. A Austrália surpreende na liderança do Grupo C. Campeãs olímpicas, Argentina (Atenas-2004 e Pequim-2008) e Espanha (Barcelona-1992) têm camisas olímpicas de peso. A Fúria ainda não venceu, mas levou a Pequim seis jogadores que participaram da Euro. Ainda há tempo para evitar surpresas desagradáveis nas quartas de final.
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