Estádio mais caro da Copa do Mundo de 2014, o Mané Garrincha acaba de quebrar seu recorde de tempo sem jogos. Já são sete meses sem receber uma partida oficial de futebol. Até então, a maior abstinência da arena construída por R$ 1,6 bilhão havia sido de pouco mais de cinco meses, entre 28 de agosto de 2016 e 5 de fevereiro de 2017. O último confronto valendo pontos aconteceu em 6 de maio, quando o Brasiliense conquistou o título do Campeonato Candango em cima do Ceilândia diante de 6.395 presentes — nem 10% da capacidade total. O primeiro jogo da decisão teve 3.296 pagantes, ou seja, os dois juntos deram 9.691. Lá se vão 214 dias de jejum. Nesse período, houve até a instalação de gramado de inverno ao custo de R$ 28.076,10. O piso está impecável, mas a bola não rola para nenhuma competição no elefante vermelho.
A seguir, o blog aponta sete motivos que contribuíram para o estado de abandono do Mané Garrincha. Um deles é óbvio, e até o mais inocente dos moradores do Distrito Federal já sabia: a capital do país é uma cidade fantasma no que diz respeito ao futebol. Não há um clube sequer capaz de assumir — e principalmente de encher — a arena com capacidade para 70 mil pessoas, menor apenas do que o Maracanã.
O último ranking de clubes da CBF, publicado nesta semana, mostrou que o melhor time do Distrito Federal no levantamento, na verdade, é de Goiânia: o Luziânia ocupa o 90º lugar. Times de cidades goianas e mineiras no entorno da capital do país disputam o Candangão desde 1997. Dos 25 times filiados à Federação de Futebol do Distrito Federal (FFDF), apenas seis aparecem na lista de 220 times. Ceilândia, Gama, Brasiliense, Brasília e Sobradinho são os outros. A seguir, apontamos por que a bola só deve voltar a rolar no Mané no Candangão 2018. Ah, isso se conseguirem a tempo os laudos do Corpo de Bombeiros, da Polícia Militar, da Defesa Civil e da Vigilância Sanitária necessários para a liberação da comercialização de ingressos. Hoje, nem o Mané Garrincha padrão Fifa tem a documentação. O primeiro duelo do ano previsto para o estádio é Brasiliense x Real, em 20 de janeiro, pela primeira rodada do torneio doméstico.
Em um Conselho Técnico da CBF, o presidente do Atlético-MG propôs e aprovou por 14 votos a 6 o veto à venda de jogos durante o Campeonato Brasileiro. A medida atingiu também a Copa do Brasil. Os times foram impedidos de mandar jogos longe das suas sedes a partir das oitavas de final. Mané Garrincha, Arena das Dunas, Arena Pantanal e Arena da Amazônia foram os mais atingidos. Curiosamente, o atual mandatário do Galo está de saída do cargo. Daniel Nepomuceno não disputará as eleições marcadas para a próxima segunda-feira (11).
O blog apurou que clubes e a cúpula da CBF até pensaram em flexibilizar a Lei Nepomuceno, mas o contra-ataque coletivo das arenas prejudicadas, batizado de “Libera, CBF”, e a entrada da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no circuito irritou ainda mais os cartolas da entidade máxima do futebol. Brasília, Manaus, Cuiabá e Natal se uniram para tentar derrubar o veto.
Reportagem publicada em 12 de junho no Correio Braziliense e aqui no blog antecipou quem são os interessados em assumir a ArenaPlex —pacote de instalações esportivas que engloba o Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha, o Ginásio Nilson Nelson e o Complexo Aquático Cláudio Coutinho. O edital de licitação estava previsto para ser publicado no fim de julho. Houve até audiência pública, mas ainda não saiu do papel. Há uma disputa política entre o Governo do Distrito Federal, que perde quase R$ 1 milhão por mês com o elefante branco, e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) por se tratar de área tombada. Há previsão, por exemplo, da exploração de 7 mil vagas de estacionamento, salas comerciais, bares, restaurantes e lojas. Sem a aprovação, os interessados ameaçam desistir.
Em um encontro com o ex-presidente da Federação de Futebol do DF, Erivaldo Alves, e com o vice-governador Renato Santana, o presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, cogitou trazer para Brasília um jogo das Eliminatórias da Copa de 2018. Promessa não cumprida por causa de pelo menos dois motivos apurados pelo nos bastidores: vaias da torcida nos dois jogos da Seleção no estádio na Rio-2016 (África do Sul e Iraque) e os recorrentes problemas com o gramado nas Copas das Confederações e do Mundo e nos Jogos Olímpicos. Brasília, Rio, Cuiabá e Curitiba foram as quatro cidades sede da Copa que não receberam jogos das Eliminatórias.
Eram recorrentes as denúncias de interessados em trazer jogos para o Mané Garrincha de que havia gente, de dentro da Federação de Futebol do Distrito Federal, que condicionava a liberação de partidas no DF a exploração comercial dos bares do Mané Garrincha e a cota de ingressos. Esse inclusive foi um dos motivos para o racha na FFDF, que culminou com o impeachment do então presidente Erivaldo Alves. Essas e outras razões fizeram com que Brasília perdesse várias partidas para a Arena da Amazônia, em Manaus; a Arena Pantanal, em Cuiabá; a Arena das Dunas, em Natal; e o Kleber Andrade, em Cariacica (ES).
O argumento de que Brasília é reduto de torcedores dos clubes cariocas não cola mais. O blog mostrou em outubro que o Fluminense rejeitou oferta de R$ 1,2 milhão para mandar no Mané Garrincha o jogo de ida contra o Flamengo pelas quartas de final da Copa Sul-Americana. Ao contrário da CBF, a Conmebol não veta a realização de partidas fora da cidade do mandante. O presidente Pedro Abad confirmou a oferta e justificou em entrevista ao blog o motivo de o clube ter recusado. “Tivemos uma proposta, mas o jogo será no Maracanã por critério técnico. Precisamos da torcida no Rio”. O tricolor foi eliminado pelo arquirrival. Até o Palestino, do Chile, se recusou a enfrentar o Flamengo em Brasília na Sul-Americana.
Capital sem time, times sem torcida. O Distrito Federal só tem clubes na Série D — Brasiliense e Ceilândia em 2018. A torcida dos dois times mal enche o Abadião, estádio que as duas equipes dividem em seus jogos oficiais. Time mais popular do Distrito Federal, o Gama detesta atuar longe do Bezerrão, seu principal reduto de torcedores. A última final do Campeonato Candango teve 6.395 presentes, ou seja, nem 10% da capacidade de público do estádio mais caro da Copa do Mundo de 2014.
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