Discordo de quem faz campanha nas redes sociais pela saída de Paulo Sousa. Defendo a permanência dele pelo menos até o fim do primeiro ano de contrato. A partir daí, sim, o clube e o profissional devem avaliar e discutir a sequência (ou não) do trabalho. Dito isso, admito depois da derrota do Flamengo por 1 x 0 para o Botafogo, aqui em Brasília, que o técnico português está dando corda a quem deseja — e são muitos — “enforcá-lo”.
Paulo Sousa tem quatro derrotas na temporada. Algumas evitáveis. Foi superado duas vezes pelo Fluminense. Uma na Taça Guanabara e a outra no primeiro jogo da final do Carioca. Perdeu para um Athletico-PR em turbulência na Arena da Baixada. Fábio Carille havia acabado de assumir o comando. Perdeu o emprego logo depois. Nesse domingo, o Flamengo jogou bem na maior parte do clássico, mas o Botafogo calou a superlotada Arena BRB Mané Garrincha e viajou de volta para o Rio de Janeiro com três pontos na bagagem.
O Flamengo tem um elenco muito superior aos de Botafogo, Fluminense e Vasco, mas não conseguiu sobrar em nenhum clássico. A exibição mais imponente, porém longe de arrancar suspiros, foi a vitória por 3 x 1 sobre o Glorioso, no estádio Nilton Santos, pela Taça Guanabara. Os três duelos contra o Vasco foram acirrados e de placares apertados.
Paulo Sousa também não ajuda que o defende a ajudá-lo ao insistir na escalação de Hugo Souza como titular. O goleiro é promissor. O futuro dele começou bem naquela exibição de gala contra o Palmeiras na pandemia, passou por altos e baixos, mas ainda não passa confiança ao ponto de deixar Santos e Diego Alves para trás. Santos estava vetado, mas ele tinha Diego Alves disponível no banco para um clássico.
Outro ponto chama a atenção no caso rubro-negro. Paulo Sousa precisa acelerar o processo de consolidação do time. Está no cargo desde janeiro e o processo parece lento, às vezes, estagranado. Luis Castro assumiu o Botafogo em 25 de março e aparenta ter mais tempo de serviço do que o compatriota tendo em mãos um elenco mais limitado.
A derrota na matinê do Mané Garrincha mostrou mais do mesmo. Um Flamengo com duas faces. Mostra evolução, sim, do meio para a frente, principalmente devido ao óbvio talento do quarteto formado por Everton Ribeiro, Arrascaeta, Bruno Henrique e Gabigol. Criou muitas oportunidades. Desperdiçou algumas. Em outras, Gatito foi simplesmente brilhante. Quando não teve chance, foi salvo pela decisão controversa do VAR. Do ponto de vista do protocolo da CBF, mal anulado. Levando em conta as limitações tecnológicas na escolha do frame correto para a precisão da análise, a decisão de campo do árbitro Anderson Daronco deveria ter sido mantida.
Dos volantes para trás, o sistema defensivo do Flamengo é um caos. Quem acompanha o blog sabe que isso não é novidade. Mostrei, na semana passada, a média de gols sofridos de todos os times comandados pelo lusitano. A frieza dos números mostra a dificuldade de Paulo Sousa para organizar a retaguarda, protegê-la, garantir o mínimo de segurança.
No caso específico do Flamengo, há problemas graves que se repetem: erros individuais e coletivos. O belo gol da vitória do Botafogo marcado por Erison é um combo assinado por Willian Arão, que não alcança a bola enfiada nas costas dele, David Luiz, passivo em vez de dar combate no adversário, e o goleiro Hugo Souza. O chute parecia defensável.
O Botafogo não foi superior ao Flamengo. Venceu devido ao gol de Erison, ao show de Gatito e á perspicácia do técnico Luis Castro. O Flamengo criou, apareceu na cara da meta alvinegra, mas o arqueiro paraguaio decidiu lá atrás e seu goleiro atacante na frente. O gol anulado no primeiro tempo poderia ter mudado o panorama da partida. O Botafogo estava acuado no primeiro tempo. No segundo, teve mais fôlego, não futebol, do que o arquirrival.
O resultado fortalece a convicção do mecenas John Textor e do técnico português Luis Castro na sequência do trabalho. É um resultado de grife. Daí a comemoração de título depois do jogo diante da torcida alvinegra. Prova de um time bem treinado para lidar com suas limitações. Ciente de que há um longo caminho a percorrer rumo à excelência. Dinheiro não falta mais. Passo importante para a montagem de um time.
A vitória do Botafogo não é fruto do acaso. Tem a ver com uma concepção de jogo. As ideias do técnico Luis Castro funcionaram duas vezes contra o Real Madrid na fase de grupos da temporada 2020/2021 da Champions League. Sob a batuta dele, o Shakhtar Donetsk derrotou o time merengue duas vezes: 3 x 2, em Madri, e 2 x 0, na Ucrânia. Naquela época, ele explicou como preparou o time ucraniano explorando uma deficiência do adversário. “O Real Madrid tem problemas contra times que fazem bloco médio ou baixo”, disse. Qualquer coincidência do Real com o Flamengo…
O Shakhtar Donetsk conseguiu ser extremamente competitivo contra o Real Madrid e a Internazionale. Em contrapartida, foi engolido duas vezes pelo Borussia Monchengladbach. Perdeu por 6 x 0 e 4 x 0 para o adversário alemão, ou seja, 10 x 0 no placar agregado. Essa é a questão daqui em diante. O Botafogo será um time mobilizado nos grandes jogos e relaxado nos demais, como o empate com o Juventude, ou há margem de crescimento para que o time alvinegro seja focado contra qualquer adversário. Isso determinará o sucesso.
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