O discurso do presidente Jair Bolsonaro há pouco na cúpula do clima foi uma guinada em relação a outras falas presidenciais em fóruns internacionais e outras declarações. Afirmações do tipo, “se acabar a saliva”, restará “a pólvora” foram substituídas por “futuro comum”, conclamando países a um esforço (financeiro, Bolsonaro não nega) para ajudar na preservação ambiental. Para quem, na ONU, acusava, ainda que de forma indireta, alguns países de perseguição ao Brasil por causa da liderança brasileira na produção/exportação de alimentos, já foi um avanço.
Naquele discurso da ONU, em setembro do ano passado, o presidente acusou, inclusive “instituições internacionais” de apoiarem uma campanha de “desinformação” sobre Amazônia e Pantanal. Desta vez, acusações ficaram de lado, o que, dizem alguns observadores do Congresso, em se tratando de Bolsonaro já foi uma guinada.
Alguns diplomatas consideram que a mudança do discurso se deveu especialmente à troca de comando nos Estados Unidos e à nova linha do Itamaraty. O ex-chanceler Ernesto Araújo sempre pesava a mão, de forma a agradar o chamado bolsonarismo raiz. Agora, isso mudou. Permanece, porém, o histórico do país referência em energia limpa, responsável por apenas 3% das emissões globais. E, assim como o histórico do Brasil, permaneceram também as cobranças de recursos, especialmente, o cumprimento do acordo de Paris em relação ao mercado de carbono, apresentado por Bolsonaro como fonte crucial de recursos e investimentos para impulsionar ações ambientais.
O país precisa, realmente, de mais recursos para essa tarefa de melhor gestão do meio ambiente e combate ao desmatamento, porque as dificuldades orçamentárias são a cada dia mais graves _ haja visto o atraso na sanção do orçamento deste ano, em que os recursos estão comprometidos para cumprimento das emendas de deputados e senadores, o sistema de saúde sob risco de colapso, e despesas obrigatórias cada vez mais maiores.
As promessas feitas diante das câmeras e dos principais líderes mundiais são bem-vindas, em especial, a redução em dez anos do compromisso de zerar as emissões, de 2060 para 2050. Quanto ao desmatamento ilegal, porém, Bolsonaro não mudou um milímetro do que já estava estabelecido, ou seja, acabar em 2030, em nove anos e meio, quando, ainda que seja reeleito em 2022, Bolsonaro não será mais presidente.
A redução em dez anos do compromisso de zerar as emissões foi um bom ponto colocado por Bolsonaro. O presidente, aliás, não tinha saída, senão apresentar alguma coisa que pudesse demonstrar um esforço do governo em ajudar na preservação ambiental e não apenas ficar no histórico do elenco de ações passadas. E essa redução é a aposta de Bolsonaro para melhorar a sua imagem internacional. Até aqui, porém, nada indica que o Brasil terá um futuro alvissareiro nessas relações externas. O Brasil foi décimo oitavo país a se pronunciar na cúpula do clima e, Biden não estava na sala, no momento em que o presidente brasileiro falava. Coincidência ou não, em diplomacia, nada passa despercebido.