Grandes tragédias sempre causam comoção. Guerras, tsunamis, terremotos, atentados têm o condão de mobilizar comunidades próximas ou distantes. O sentimento será tanto maior quanto maior for a relação entre as partes. Por esse motivo, a explosão no porto de Beirute ocorrido na terça-feira atinge os brasileiros de forma singular.
O Brasil tem laços históricos com o Líbano. D. Pedro II visitou a antiga Fenícia em 1876. Durante a viagem, falou aos camponeses sobre o império sul-americano, onde já vivia um pequeno número de libaneses. A visita incentivou o fluxo migratório, necessário sobretudo para substituir a mão de obra escrava que se avizinhava do fim.
De lá para cá, o Brasil se tornou a maior nação libanesa do mundo. Os 12 milhões de nativos, naturalizados e descendentes que se espalham pelo território nacional ultrapassam os 8 milhões de habitantes do pequeno país do Oriente Médio. A integração dos dois povos foi tal que pratos da culinária árabe figuram em festas, cardápios e mesas do dia a dia. É o caso de quibe, homus e esfiha.
A calamidade que se abateu sobre a cidade que se reconstruiu depois de 15 anos de guerra civil clama por respostas e por solidariedade. O que provocou a explosão de quase 3 mil toneladas de nitrato de amônio foi acidente, atentado terrorista, bombardeio por força militar estrangeira? Impõe-se esclarecer a questão para que não pairem dúvidas sobre a responsabilidade da autoria.
Embora não se tenha clareza sobre a causa da catástrofe, sabe-se das consequências. Os mortos que ultrapassam uma centena, os feridos que chegam a 5 mil, os deslocados que se aproximam de 300 mil agravam a situação do país afundado em inédita crise política, social, econômica e sanitária.
Os números falam por si: inflação de 80%, moeda desvalorizada, desemprego de 30% dos trabalhadores, sistema de saúde em colapso por causa da pandemia, população empobrecida cuja face mais cruel são as 600 mil crianças que vivem abaixo da linha de pobreza. Os alimentos, 90% dos quais importados, tornaram-se muito caros em face da perda de valor da lira libanesa.
Sem ajuda internacional, o Estado não tem condições de atender as urgências. A diáspora libanesa, um dos pilares da economia fenícia, precisa multiplicar a ajuda. Socorro emergencial chega de países árabes, africanos, europeus e americanos. O presidente Jair Bolsonaro disse que porá uma aeronave à disposição da comunidade.
É pouco. Celeiro do mundo, o Brasil tem de doar alimentos, remédios, insumos, tecnologia e recursos indispensáveis à vida. A Marinha, que colabora com a segurança há 40 anos e se prepara para retornar ao país, necessita rever o calendário e permanecer por mais tempo no Mediterrâneo. Solidariedade nunca faltou aos brasileiros. Não há de faltar agora.
(Editorial do Correio Braziliense de hoje)
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