Mensagem
Viva! Esta é a Semana da Voz. Cantores, fonoaudiólogos, otorrinos, músicos, locutores, gente como a gente, todos reverenciam os sons emitidos pelo aparelho fonador. Eles podem ser agudos ou graves. Altos ou baixos. Agradáveis ou desagradáveis. Podem soar ou ficar presos na garganta. Podem falar sem dizer. Ou dizer falando.
Poderosa criatura, a voz criou uma senhora família na língua. Alguns membros são pra lá de conhecidos. É o caso de vozeirão, vozinha, vozear, vozeador. Outros são mais discretos. Vocal, vocálico, vogal, vociferar, vociferante servem de exemplo. Há também os quase ocultos. Invocar, convocar, avocar, vocábulo, advogado pertencem ao time menos visível.
Mais? Vocação é também filhote da ilustre latina. Significa chamamento do coração. Seguir a vocação é atender a voz interior — ouvir o apelo da alma. “É feliz quem faz aquilo de que gosta”, dizem os psicólogos. Vocativo é outro membro do clã. Quer dizer chamamento. Sempre que você se dirigir a alguém, não duvide. Estará usando o vocativo. “Paulo, tome banho”, manda a mãe. Paulo é vocativo. “Alô, Sílvio, tudo bem?”, diz Maria ao telefone. Sílvio é o vocativo. “Senhor Diretor”, começa o ofício com o vocativo.
Truque
O vocativo é pra lá de elitista. Não se mistura aos termos da oração nem a pedido dos deuses do Olimpo. Por isso vem sempre separado. Em geral, por vírgula. É aí que a porca torce o rabo. Nem sempre é fácil identificar a criatura tão arredia. O que fazer? Seguir o conselho dos marqueteiros. “Para vencer o diabo”, ensinam eles, “recorra aos demônios sem cerimônia.” Um dos capetinhas é o ó: Avança, (ó) Brasil. (ó) Brasileiros brasileiras, votem em mim. (ó) Gente, nós podemos tudo.
A literatura usa e abusa do vocativo: “Deus, ó Deus, onde estás que não me escutas?”, pergunta Castro Alves em Vozes d´África. “Tu choraste em presença da morte? Em presença de estranhos choraste? Não descende o covarde do forte. Tu, covarde, meu filho não és”, escreve Gonçalves Dias em I-Juca Pirama. “Entra, minha filha, senão vais virar prostituta”, ameaça a experiente senhora. “Deus te ouça, minha mãe, Deus te ouça”, responde a moça assanhada do poema de Ascenso Ferreira.
Nas cartinhas, o vocativo está presente: Olá, Paulo, Oi, Maria, Caro Luís, Meu amor. Na redação oficial, também. O ato de correspondência se abre com ele: Senhor Presidente da República, Senhor Chefe, Senhor Diretor.
Olho vivo
Atenção, marinheiros de poucas viagens. Na correspondência oficial, o vocativo costuma vir separado por vírgula. Não bobeie. Sempre que iniciar parágrafo, use letra maiúscula — mesmo depois da vírgula do elitista. Assim se convencionou. E, como diz o outro, manda quem pode. Obedece quem tem juízo.
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