Em grego, é hedone. Em português, hedonismo. Numa e noutra língua, o significado se mantém. É prazer. A sensação gostosa fez escola. Virou doutrina da filosofia. Segundo ela, o prazer deve ser considerado o objetivo principal dos atos humanos. Alguns concordam. Outros não. Mas uma coisa é certa. Ninguém gosta de sofrer.
A regra vale para a leitura. Texto difícil não tem vez. E não é de hoje. Montaigne, no século XVI, disse com todas as letras: “Ao encontrar um trecho difícil, deixo o livro de lado”. Por quê? “A leitura é forma de felicidade”, respondeu ele. “Se lemos algo com dificuldade, o autor fracassou”, completou Jorge Luís Borges quatro séculos depois.
A observação não se restringe a livros. Engloba jornais, revistas, cartas comerciais, redações escolares, receitas de comida gostosa. Sem fisgar o leitor, adeus, emprego! Adeus, nota boa! Adeus, sobremesa dos deuses! Por isso, roguemos ao Senhor. Que Ele ilumine mentes, penas e teclados. E cada um faça a sua parte.
Escrever é verbo transitivo. Escreve-se para alguém. O alguém é o leitor. Não o perca de vista. Seja natural. Imagine que ele esteja à sua frente ou conversando com você. Fique à vontade. Espaceje suas frases com pausas. Sempre que possível, faça perguntas diretas. Confira ao texto um toque humano. Você está se dirigindo a gente de carne e osso.
Sobretudo use frases curtas. O leitor só consegue dominar determinado número de palavras. Depois, os olhos pedem uma pausa. Uma frase longa, já dizia Vinícius, não é nada mais que duas curtas.
Preste atenção às palavras. Palavras longas e pomposas funcionam como cortina de fumaça entre quem escreve e quem lê. Está em dúvida entre dois
vocábulos? Prefira o mais curto. Entre dois curtos? O mais expressivo.
Como avaliar o índice de dificuldade do texto? Existe o teste de legibilidade. Quer tentar? Pegue um escrito seu. Pode ser uma carta, um artigo, uma redação. Depois, siga a receita. Com um cuidado: faça parágrafo por parágrafo.
1. Conte as palavras do parágrafo.
2. Conte as frases (cada frase termina por ponto).
3. Divida o número de palavras pelo número de frases. Assim, você terá a média da palavra/frase do texto.
4. Some a média da palavra/frase do texto com o número de polissílabos.
5. Multiplique o resultado por 0,4 (média de letras da palavra na frase de língua portuguesa).
6. O produto da multiplicação é o índice de legibilidade.
Eis os possíveis resultados:
1 a 7: história em quadrinhos
8 a 10: excepcional
11 a 15: ótimo
16 a 19: pequena dificuldade
20 a 30: muito difícil
31 a 40: linguagem técnica
acima de 41: nebulosidade
Difícil? Deixe a preguiça pra lá. Avalie o parágrafo abaixo:
“Em boca fechada não entra mosca”, diz a vovó repressora. “Quem não erra perde a chance de acertar”, responde o neto sabido. Ele aprendeu que, nas organizações modernas, a competição é o primeiro mandamento. E, cada vez mais, impõe-se a necessidade de falar em público. Muitos servidores, porém, concordam com a vovó. Estremecem só de imaginar a hipótese de abrir a boca diante de uma platéia. Dizem que não nasceram para os refletores. Falta-lhes vocação. A ciência prova o contrário. Falar bem não é dom divino. Falar bem – como nadar bem, escrever bem, saltar bem – é habilidade. Exige treino.
Veja se estudamos na mesma escola:
1. Palavras do parágrafo: 101
2. Número de frases: 12
3. Média da palavra-frase (101dividido por 12): 8,41
4. 8,41 + 12 (número de polissílabos) = 20,41
5. 20,41 x 0,4 = 8,16
Resultado: legibilidade excepcional
Agora, o seu texto. Se o resultado ficou acima de 15, abra o olho. Facilite a vida do leitor. Você tem dois caminhos. Um: diminua o tamanho das frases. O outro: mande algumas proparoxítonas dar umas voltinhas. Abuse dos dois.
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