Passageiros leram o anúncio. Levaram baita susto. Passada emoção, tiveram de explicar a razão da tremedeira. O porquê estava no anúncio. Você sabe identificá-lo?
a. acentuação gráfica
b. crase
c. emprego das maiúsculas
d. pontuação
Faça a sua aposta. A resposta? É a letra d. Por quê?
Os visitantes do post apontaram dois acentos. Um deles tem perdão. Trata-se de “vôo”. O outro é perdição total. Nem o Senhor, cujo único vício é perdoar, pode atenuar o delito. Ei-lo: “de Brasília à Atlanta”. Com perdão
A reforma ortográfica cassou o chapéu do hiato oo. Os velhos vôo, perdôo, abençôo ganharam nova cara. Tornaram-se voo, perdoo, abençoo. Mas a nova regra só será obrigatória em 1º de janeiro de 2013. Até lá, as duas normas convivem sem atritos.
Por que, então, os leitores reagiram? A resposta chama-se hábito. A imprensa adotou a reforma no primeiro dia de 2010. Os olhos se acostumaram a ver a nova grafia. Como ortografia é fixação, elas estranharam o circunflexo. Deu a impressão de coisa velha, ultrapassada. E é. Mas é correta. Sem perdão
Ocorre crase antes de nome de cidades? Vou a Atlanta? Vou à Atlanta? Eta dor de cabeça. No aperto, a gente chuta. O resultado é um só. A Lei de Murphy, gloriosa, pede passagem. O que pode dar errado dá. O anúncio serve de prova.
Como safar-se? Há saídas. Uma delas: seguir o conselho dos políticos. “Para vencer o diabo”, dizem eles, “convoque todos os demônios.” Um demoniozinho se chama troca-troca. Construa a frase com o verbo ir. Depois, substitua o ir pelo indiscreto voltar. Por fim, lembre-se da quadrinha:
Se, ao voltar, volto da, crase no a. Se, ao voltar, volto de, crase pra quê? O calcanhar de aquiles da crase não reside na regência. Reside no artigo. Nem sempre sabemos se o nome da cidade pede ou não o pequenino. O verso quebra o galho. O da, casamento da preposição de com o artigo, denuncia a presença do a. Vamos ao tira-teima:
Vou a Atlanta? Vou à Atlanta? Volto de Atlanta. Se, ao voltar, volto de, crase pra quê? Sem artigo, nada de crase: Vou a Atlanta. Vai além
O versinho não se restringe a nome de cidades. Aplica-se também a bairros, estados, países. Fui a Ipanema? Fui à Ipanema? Fui a Paraíba? Fui à Paraíba? Fui a França? Fui à França? Fui a Portugal? Fui à Portugal? Recorramos ao troca-troca:
Voltei de Ipanema. Fui a Ipanema. Voltei da Paraíba. Fui à Paraíba. Voltei da França. Fui à França. Voltei de Portugal. Fui a Portugal. Resumo da opereta? O anúncio teria merecido nota 10 se estivesse escrito assim: Novo voo (vôo) direto de Brasília a Atlanta.
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