A Olimpíada da Língua Portuguesa 2019, lançada ontem, põe o dedo numa das feridas mais dolorosas da educação brasileira: o fracasso no ensino da língua. O resultado da Avaliação Nacional de Alfabetização mostra que nos mantemos no chão. As crianças concluem o 3º ano, série da qual deveriam sair alfabetizadas, sem domínio da leitura e da escrita. Só 10% atingem a meta.
Deficiências não sanadas nos primeiros anos cobram juros ao longo da vida. O excluído do direito de aprender será o excluído das boas universidades, dos bons empregos, do acesso ao andar de cima. Será alvo fácil do crime organizado e de discursos vazios veiculados nas campanhas eleitorais.
O Estado fracassou. Precisa do socorro da sociedade. A Olimpíada dá uma ajuda. Prepara professores para que possam preparar estudantes da escola pública a fim de participar do evento e, com isso, motivar os alunos a escrever. Escrever não para agradar ao professor, mas para disputar o prêmio com colegas locais, regionais, estaduais e nacionais.
O objetivo não é descobrir Machados, Clarices ou Gracianos. Mas estimular a moçada a escrever, desenvolver a habilidade de pôr as ideias no papel. E, claro, buscar a forma mais adequada de chegar lá. Aí, tem de ler, pesquisar, reescrever.
O conceito de língua traz implícita a escolha. “Língua”, dizem os linguistas, “é um sistema de possibilidades.” Generosa, ela põe à disposição do usuário leque milionário de opções. Mas só se beneficia da riqueza quem as conhece e lhes domina os mistérios.
É como se, ao longo da aprendizagem, a pessoa subisse degraus de uma escada muito alta. Quanto mais próxima do topo, mais ampla a visão, maior a oferta e, claro, mais vastas as possibilidades. Lá em cima, poderá escolher até não escolher. É o exercício da liberdade.
Cabe à escola conduzir meninos e meninas na aventura da escalada. Eles só chegarão ao cume quando dominar a norma culta. Poderão, então, livrar-se da polarização certo/errado e navegar no adequado/inadequado. Poliglotas na nossa língua, “não falamos português”, como frisava José Saramago, “falamos línguas em português”.
Quantas? Depende dos degraus que avançamos. Os exames de avaliação aplicados pelo MEC desestimulam otimismos. Iniciativas como a Olimpíada da Língua Portuguesa contribuem para mudar o paradigma. Trata-se de uma gota d´água no oceano. Mas é bem-vinda.
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