Ouvido de tuberculoso
Márcio Cotrim
A expressão se refere a audição acima do normal, que muita gente atribui a uma consequência da tuberculose — que, porém, efetivamente, não melhora a audição dos enfermos. A moléstia, que já teve seus tempos de terror, levou para o beleléu muita gente, inclusive jovens e veteranos poetas como Manuel Bandeira – que, aliás, escreveu texto famoso sobre o tema. Eis um trecho dele:
— Diga trinta e três, pediu o médico da família.
— Trinta e três… trinta e três… trinta e três…
— Respire. O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
— Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
— Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.
Antigamente, os tuberculosos eram internados em isolamento absoluto e, por isso, tentavam ouvir o mínimo barulho que fosse para não se sentirem sozinhos. Outra explicação é que o tuberculoso era muito discriminado. Quando se descobria que alguém tinha tuberculose, sussurrava-se às escondidas do doente, e o tuberculoso, desconfiado de que estavam falando dele, tentava escutar tudo e todos para poder defender-se.
Ainda bem que a doença hoje não aterroriza tanto. Melhor ainda: Nelson Rodrigues conseguiu curar-se de duas delas e ainda nos pôde brindar, por muitos anos, com sua luminosa inteligência.
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