Enem, 20 anos: editorial do Correio Braziliense

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O Exame Nacional do Ensino Médio completa 20 anos. Nas duas décadas de existência, mudou de propósito. O objetivo do teste ao ser criado era avaliar a qualidade do ensino ministrado aos estudantes que ultrapassassem o fundamental. A iniciativa recebeu aplausos porque, pela primeira vez, havia um instrumento capaz de fazer uma radiografia do que os alunos aprendiam e, com isso, traçar caminhos para a correção de rumos.

Em 2009, mudou o propósito. Passou a ser passaporte para a universidade. O vestibular, aos poucos, deixou de ser aplicado. Boa parte das instituições de ensino superior públicas e privadas começou a recorrer às notas do Enem para preencher as vagas. Paralelamente, conceberam-se mecanismos complementares — ProUni e Sisu — que abrem as portas do ensino terciário a discentes que participarem do teste.

A guinada merece consideração. É verdade que o Exame Nacional de Ensino Médio democratizou o acesso à universidade. Ninguém precisa se deslocar da cidade onde mora para disputar assento na instituição de sua preferência. O prêmio é conquistado pelo mérito. Vence quem se sair melhor entre os milhões de candidatos. Teoricamente em condições iguais, equivalem-se as oportunidades.

Mas existe o outro lado da moeda. Há que considerar, em primeiro lugar, que o Brasil tem dimensões continentais. Pode-se dizer, sem medo de errar, que os diferentes países localizados nos 8,5 milhões de quilômetros quadrados do território nacional não constituem uma unidade cultural. Ao contrário. Trata-se de mosaico de diferentes cores e variadas nuanças.

Um estudante do interior do Amazonas, por exemplo, fará as mesmas questões que um paulistano, mas as condições de ambos longe estão de ser iguais. Vale lembrar também a logística exigida para aplicar o mesmo teste no mesmo horário, nos rincões mais distantes e de difícil acesso do país. Não só. A segurança frequentemente falha e impõe procedimentos adicionais.

O custo total do Enem é elevado. Na edição de 2017, foi de R$ 670 milhões. Só a aplicação das provas abocanhou pouco mais de R$ 425 milhões. Não se pode esquecer também o preço das ausências. O Inep prepara provas para todos os inscritos. Mas muitos faltam. Resultado: no ano passado, os inscritos que não se apresentaram ultrapassaram 2 milhões, o que representa a soma de R$ 177 milhões. De 2013 a 2017, o valor do prejuízo bateu em R$ 962 milhões.

É necessário repensar o modelo. Boa oportunidade é a reforma do ensino médio aprovada em 2017, que imporá mudanças no exame. A massificação teve vez no século 19, quando se precisava formar trabalhadores para as linhas de montagem. Não é o caso do século 21. A era da informação exige mentes pensantes e criativas. Escolas que aprofundem conhecimento, não se restrinjam a preparar os alunos para o Enem. O fracasso do Brasil nos testes internacionais provam que algo está errado. Muito errado — falido.

Dad Squarisi

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