Dia de saia e batom

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Vão longe os tempos em que ela era a rainha do lar. Ou os tempos descritos pelo Padre Vieira. “A mulher”, dizia ele, “só deve sair de casa em três ocasiões: no batizado, no casamento e no enterro”. Os ventos mudaram. Embarcando na onda libertária da segunda metade do século passado, ela deu o grito de independência ou morte. Enfrentou preconceitos. Desfilou barriga grávida pelas areias de Copacabana. Queimou sutiã em praça pública. E chegou lá.
  Hoje disputa direitos e divide deveres de igual para igual com o sexo oposto. Veste toga, ocupa assentos no Congresso, dirige estados e preside países. Mais: impôs mudanças na língua. Palavras antes só usadas no masculino ganharam forma de saia e batom. É o caso de bebê. O dissílabo englobava menininhos e menininhas. Agora a bebê pede passagem. O mesmo ocorre com presidenta. Presidente vale pra senhores e senhoras. Mas as poderosas preferem presidenta. Com o a, o feminino ganha visibilidade. Manda quem pode. Obedece quem tem juízo.

Pra lá de chique
  É mulherzinha pra cá, mulherzinha pra lá, mulherzinha pracolá. O diminutivo ganha espaço cada vez mais generoso em casa e na rua. Grifes famosas lançam moda pra mãe e filha. São vestidos, calças, sapatos, bolsas etc. e tal iguaizinhos pra umas e outras. Daí a necessidade da forma que vale por duas — mulherzinha indica tamanho pequeno e exprime carinho.
  Vale a questão: como fazer o plural de criatura tão em alta? Ops! Esse plural tem tratamento pra lá de sofisticado. Pra chegar a ele, impõem-se três etapas. Uma: pôr a palavra primitiva no plural (mulheres). Duas: esconder o s (mulhere). A última: acrescentar o sufixo –zinhas (mulherezinhas).
  A regra vale para as palavras que fazem o diminutivo com o acréscimo de –zinho: colherzinha (colherezinhas), caracolzinho (caracoizinhos), botãozinho (botoezinhos), igualzinho (iguaizinhos), papelzinho (papeizinhos), coraçãozinho (coraçõezinhos).

Dad Squarisi

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