Jogo do bichoMárcio Cotrim
Certo domingo, antes de um jogo do Vasco, entrou no vestiário o Sr. Abel, dono de uma casa de charque na rua do Acre, no Rio, e exaltado vascaíno. Além de comerciante, Abel bancava o jogo do bicho. Prometeu aos jogadores: “se vocês ganharem, darei um galo para cada um”. O valor de um galo era 50 mil réis – 50 é a dezena do galo no jogo do bicho. A partir de então, os clubes passaram a dar bicho pelas vitórias, hábito que virou costume no futebol brasileiro.
A propósito, não custa explicar o berço do jogo do bicho, que virou coqueluche no país. O barão de Drummond, eminência do Império, era o fundador e proprietário do Jardim Zoológico do Rio de Janeiro, sustentado por verbas do governo. Com a República, o barão perdeu prestígio, e a fonte secou, levando-o a pensar em fechar o seu zoo.
Um mexicano esperto chamado Ismael Zevada, que morava no Rio, sugeriu ao barão a criação de uma loteria que podia salvar o zoológico. Eis a fórmula: o frequentador que comprasse um ingresso de mil réis ganharia 20 mil se o animal desenhado no bilhete de ingresso fosse o mesmo exibido num quadro horas depois. Combinou com o barão pintar 25 animais e, a cada dia, passou a aparecer no quadro a imagem do bicho sorteado.
A ideia teve retumbante êxito. O jogo se espalhou pelas ruas com centenas de apontadores vendendo ao povo os bilhetes com o desenho dos animais. Virou mania local e nacional e, infelizmente, enveredou até para o crime. O próprio carnaval carioca, segundo Millôr, passou a basear-se na bicha e no bicho.
O professor Luiz Antonio Simas tem estudado o fenômeno da fantástica loteria, que, até hoje, contagia a população brasileira. Ele propõe curiosa sugestão para manter, em condições dignas, o zoológico carioca: utilizar parte do dinheiro ainda não bloqueado em poder do mafioso Cachoeira e de outros do mesmo time para alimentar cobras, leões, pássaros e macacos que, afinal de contas, fazem a alegria da garotada e da marmanjada. Quem sabe dá certo?
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