Primeiro era a certeza: o cavalheiro suspeito de um crime era apontado na imprensa como criminoso, bandido, facínora. Depois de muitos processos judiciais e muitas indenizações cobradas, surgiu a fórmula do suposto: o “suposto assassino”, por exemplo. Só que o suposto caiu na lista das expressões que, de tanto que foram usadas, perderam o sentido: hoje, o cavalheiro mata uma pessoa com 18 tiros, na frente de 54 testemunhas, confessa a autoria, explica por que matou e, mesmo assim, é chamado de “suposto matador”.
Um caso supostamente interessantíssimo foi supostamente noticiado por um suposto veículo de comunicação, em São Paulo, suposta capital do Estado de São Paulo. Título: “Garoto recebe R$ 260 mil após suposto racismo em mercado de SP”. Na verdade, não era mercado, era supermercado. Um menino de 10 anos foi detido ao sair do supermercado com biscoitos, refrigerantes e salgadinhos. De acordo com a acusação, os seguranças chamaram o garoto de “negrinho sujo e fedido”, levaram-no a uma sala e o obrigaram a tirar a roupa para ver se não escondia mercadoria nenhuma.
Não escondia. E, ainda por cima, tinha a nota fiscal da compra. Acabou sendo libertado do cárcere privado. E como é que se sabe que a coisa aconteceu exatamente assim? Porque o supermercado fez acordo com a vítima, pagando-lhe R$ 260 mil para desistir da ação judicial. Considerando-se que empresa nenhuma dá nada de graça, conclui-se que era mais barato pagar do que sofrer o processo.
E, mesmo assim, é “suposto”? Que é que precisava ter ocorrido para que a imprensa desse a notícia da violência, não da suposta violência? Que o repórter estivesse por acaso no lugar certo, bem na hora em que a violência ocorreu, com filmadora ligada e um relógio bem atrás da vítima para registrar a hora?
Teve, terá, teria
Uma variação do “suposto” é o condicional – ou, como se chama atualmente, “futuro do pretérito”. Algo como um cavalheiro que “teria” se jogado do 40º andar e “supostamente” se arrebentado no chão. Há um exemplo precioso de texto, publicado na semana passada num portal noticioso de importância:
“O grupo conseguiu fugir de carro. Nesse momento, o soldado da Rota Rodrigo Aparecido Pansani teria percebido a movimentação e, com sua moto, também teria passado a perseguir os assaltantes. “Já na Avenida Bandeirantes, perto do Aeroporto de Congonhas, os criminosos teriam tentado abandonar o veículo para correr pelo canteiro central da via. Nesse momento, Pansani teria largado sua moto e, segundo as investigações, teria perseguido os criminosos.”
Cá entre nós: que é que foi que comprovadamente aconteceu?
(Do Observatório da Imprensa de hoje, 26.7. Colaboração da Mara Régia)
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