Por Flávia Maia e Walder Galvão
O racionamento de água vem causando prejuízos à indústria do Distrito Federal. Praticamente metade das 5.530 fábricas instaladas na capital do Brasil utilizam o líquido em sua produção. Dessas, 42,4% alegam que tiveram a produção prejudicada nas mais diversas escalas, a depender da necessidade do insumo na atividade fabril. A expectativa é que a margem de lucro tenha caído em até 5%. Os dados fazem parte da Pesquisa Impacto do Racionamento de Água no Setor Industrial no Distrito Federal desenvolvido pela Federação das Indústrias do Distrito Federal (Fibra), em parceria com o Núcleo de Estudos e Pesquisas do Instituto Euvaldo Lodi (IEL-DF), e obtida com exclusividade pelo Correio.
O estudo fez um levantamento ouvindo a experiência dos empresários industriais durante a vigência do primeiro ano de interrupções no serviço de água. Cerca de 15,3% alegam perdas financeiras por conta do rodízio. “É um prejuízo a mais em uma indústria que vem de anos difíceis”, analisa Jamal Bittar, presidente da Fibra. Ele explica ainda que o impacto da falta de água só não foi mais significativo por causa do desaquecimento da atividade industrial no Distrito Federal.
“A nossa preocupação é com este ano de 2018, em que se observa a melhora na economia e o crescimento na produção. Em 2018 o impacto será mais preocupante”, alerta o presidente da Fibra.
Informações da Agência Reguladora de Águas (Adasa) mostram que das mais de 5 mil plantas industriais do DF, apenas 360 tem sistemas próprios de água – 347 têm poços artesianos e 13 tem captação direta no rio. As demais, precisam utilizar água da Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb). Por isso, a estatal afirma que, embora não possa separar a indústria do racionamento semanal, se esforça para superar a crise hídrica investindo em novas captações e na redução das perdas do transporte do líquido. A indústria somada ao comércio estão entre os principais clientes da empresa.
A pesquisa da Fibra trouxe um dado preocupante: quase 70% das indústrias não tem fontes alternativas de uso de água, como o reuso. Outro dado que evidencia a dependência da água da Caesb é que apenas 6,8% fazem algum tipo de captação. A explicação da Fibra é a de que a capacidade de investimento da indústria está baixa. “Nesse momento de crise econômica, a indústria não consegue. Uma obra de captação, por exemplo, exige uma engenharia mais custosa”, analisa Jamal. Por isso, o impacto da falta do insumo na produção do DF. Várias regiões industriais, como o Setor de Indústria e Abastecimento (SIA) e Taguatinga Sul, não podem ter poços artesianos.
A Adasa reforça que a liberação de autorizações para novas captações e poços vão depender da disponibilidade hídrica. “O interessado coloca no formulário informações como local, demanda e finalidade que quer a autorização de uso da água. A gente analisa de acordo com a disponibilidade do aquífero. Regiões como as abastecidas pelo Descoberto estão com restrições de 75% do uso, por isso a Adasa não pode liberar”, comenta Rafael Mello, superintendente de recursos hídricos da Adasa.
Os segmentos de alimentos e bebidas são os que mais demandam água entre os tipos fabris existentes no DF. Em seguida, vem a construção civil. O que preocupa o setor é que não há previsão de diminuição de término do racionamento. De 2014 a 2017, o uso de água na indústria vem reduzindo drasticamente – passou de 40,9 mil litros anuais por unidade para 26,4 mil litros. O que evidencia o desaquecimento do setor e os prejuízos da falta do insumo.
Caminhão-pipa
Com um dia da semana sem água, o dono de uma marmoraria no SIA, Carlos Roberto Oliveira Mourão, 55 anos, se adaptou: dobrou o armazenamento de água, recorre ao caminhão-pipa a cada 15 dias e instituiu o reuso com água da chuva. “Uso o caminhão-pipa porque a água que eu uso na máquina que corta o mármore não precisa ser potável. Além disso, reaproveito a água da chuva”. O uso do caminhão-pipa foi uma das principais alternativas encontradas pelos industriais para contornar o racionamento.
Roberto Bontempo, 54 anos, tem uma fábrica de móveis em Taguatinga Sul. Ele conta que conseguiu reduzir o consumo de água em 30% ao trocar a caixa d’água que tinha uma grande pressão por outra menor. Além disso, colocou uma garrafa pet nas descargas dos oito banheiros da empresa. “Não senti a crise hídrica e minha produção não foi afetada. Comecei as medidas antes do racionamento para economizar”, comenta.
Mesmo com o reaproveitamento do recurso, a conta de água da empresa chega até R$ 3 mil. Redelvino ressalta que o sistema de reuso impediu que a indústria sofresse prejuízos durante os períodos sem água. “Nosso nível de produção está baixo por conta da crise econômica do país. Se o nível de produção estivesse alto, igual antigamente, teríamos grandes problemas com o racionamento”, pondera. O empresário comenta que a fiscalização foi intensificada depois que o rodízio de água foi implementado.
Para o professor Charles Dayler, professor de engenharia e arquitetura do Iesb, uma boa solução para a falta de água é investir no reuso de água. “O problema é que o reuso é caro, pouco difundido e as residências e indústrias não estão preparadas para dois tipos de água – a tratada e a de reuso. A indústria não precisa de água tratada para várias de suas atividades”, explica.
Na opinião do especialista, linhas de crédito em bancos públicos, como o Banco de Brasília (BRB) seriam uma boa alternativa para alavancar o reuso. A Adasa explica que também apoia o reuso como alternativa. A prática deve ser comunicada à agência se houver algum tipo de interferência na rede, como produção maior de esgoto, por exemplo.
Para saber mais:
A crise hídrica instaurada no Distrito Federal vinha sido alertada por especialistas e é um problema que se arrasta por várias administrações. Entre 2000 e 2015, a única obra realizada foi a do Rio Pipiripau, em Planaltina, e custou R$ 15 milhões. Uma média de R$ 1 milhão por ano. Nos dois últimos anos, a média anual subiu para R$ 50 milhões em investimento. Com sistemas feitos às pressas, a oferta de água cresceu 16,5% em dois anos. Em 2016 e 2017, foram gastos cerca de R$ 100 milhões em novas captações, como a do Bananal e o flutuante do Lago Paranoá, além da reativação de captações, como a dos córregos Alagados e Crispim, no Gama. Se contar o investimento no Sistema Corumbá, a cifra chega a R$ 314 milhões.
Três perguntas para Maurício Luduvice, presidente da Caesb
1) A indústria informa que o impacto do racionamento só não foi maior porque a produção em 2017 foi baixa. Entretanto, eles estão preocupados com 2018 com o aquecimento da atividade. Como vai ser o ano para esse setor produtivo?
Estamos em uma situação hídrica melhor do que ano passado. Entretanto, ainda é cedo para assumir o final do racionamento. Vamos aguardar o final da temporada de chuva.
2) O incremento na produção de água vai beneficiar a indústria?
Sem dúvida. Estamos trabalhando para superar a crise hídrica e vamos superá-la. É questão de tempo. Atacamos os dois pilares: fizemos investimentos na produção de água e na redução das perdas. Os resultados estão sendo vistos, com a recuperação dos reservatório. Queremos superar crise hídrica o quanto antes e beneficiar a comunidade.
3) Existe algum projeto específico para o grupo consumidor da indústria?
Não. A gente aplica o racionamento de uma forma geral, por sistema de abastecimento. Não dá para segregar. A gente reconhece a dificuldade da indústria, que é um cliente importante. O racionamento teve impacto na arrecadação da Caesb. A gente sabe da dificuldade, o momento é de fazer o esforço e superar.
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