A quantidade de reclamações de consumidores contra as empresas não para de crescer no Distrito Federal. Nos últimos seis anos aumentou em 17 vezes – passou de 297 para mais de 5 mil queixas. Mas além do crescimento da procura pelo Procon local, o que mais preocupa especialistas e gestores da defesa do consumidor é a dificuldade de algumas companhias em resolver o problema. Os índices de resolutividade nas reclamações fundamentadas continuam baixos, o que sinaliza a opção de certos fornecedores pela multa à resolver a questão do cliente.
Os dados do Procon-DF mostram que a maior parte das demandas não foi atendida.Em 2013, por exemplo, esse índice somava 56,2%; em 2011, chegou a 74,1%. “Eu tenho muito orgulho da gerência de conciliação, que traz índices positivos e bons resultados. Só lamento que essas audiências precisem ser tantas como as que a gente tem realizado. Seria melhor se essas questões fossem resolvidas ainda na relação empresa e cliente”, afirma Paulo Marcio Sampaio, diretor-geral do Procon-DF. As multas aplicadas pelo órgão podem chegar até a R$ 6 milhões.
Além da baixa disposição de algumas empresas em resolver a situação do consumidor sem as punições previstas no Código de Defesa do Consumidor (CDC), a reincidência de certos segmentos no topo do ranking das mais reclamadas também é uma preocupação das associações de defesa. Os bancos, o varejo e a telefonia sempre estão entre os mais reclamados no Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec) e as empresas só trocam posições na lista dos mais reclamados em cada ano. Os setores defendem que a liderança constante nas queixas se deve à cartela maior de clientes do que em outros segmentos. As associações discordam do argumento. “Se a base aumentou, tem que ter investimento”, defende Claudia Almeida, advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). “O problema é a falta de respeito mesmo. A preocupação maior é com o lucro. Os bancos cooperam mais do que as companhias telefônicas, mas mesmo assim, abusam em relação aos direitos dos consumidores”, afirma Rosana Grinberg, presidente do Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor.
De acordo com as associações de defesa, as instituições financeiras erram ao trazer contratos nebulosos aos serviços financeiros com taxas de juros elevadas e excesso de venda casada e cobrança indevida. As telefônicas têm dificuldades de relacionamento com clientes e também apresentam problemas recorrentes de cobranças irregulares e venda de serviços embutidos. No varejo, os produtos com defeito são recorrentes e as dificuldades de troca e de rede autorizada atrapalham a vida do consumidores.
Punições
A aposentada Jucinéia Rodrigues, 61 anos, sabe bem o que é ter problema com uma operadora de telefonia e não conseguir resposta imediata para a demanda. Ela conta que contratou um serviço de TV por assinatura da Oi em setembro de 2013. Onze meses depois da contratação, percebeu que o serviço era pouco usado em casa e resolveu cancelar. Então, ela ligou para a central de atendimento da prestadora e pediu o fim do contrato. “Esse primeiro contato foi tranquilo. A atendente me disse que a fidelidade acabava em um mês e que, para eu não pagar multa, o cancelamento seria feito quando o contrato completasse um ano. Concordei”.
Porém, o que Jucinéia não esperava era que um mês depois chegasse uma conta ainda mais cara de um pacote de serviços da Oi. “Quando eu liguei para saber do que se tratava uma outra atendente me informou que tinha sido firmado um novo contrato. Eu disse que não era nada disso e solicitei a gravação”. Após vários protocolos, atendentes, supervisores e negativas de resolução do problema, a aposentada resolveu procurar o Procon. “Eu anotei tudo e falei que não ia pagar um tostão. na minha opinião, as empresas querem prender o cliente de uma forma errada, dificultando o acesso ao que ele tem direito”, acredita. A Oi informou que cancelou o serviço conforme a consumidora pediu em outubro de 2014 e que está trabalhando para melhorar os canais de atendimento.
Na opinião de Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da Proteste Associação de Consumidores falta uma punição mais severa dos órgãos de defesa e das agências reguladoras. Ela defende o projeto de lei que está no Senado de fortalecimento dos Procons e a prática mais comum de suspensão de comercialização, como já foi feito com operadoras de celulares e planos de saúde. “A proibição de venda faz com que as empresas repensem suas práticas. Quando o empresário não vende, o impacto na receita é maior, mais direto e mais rápido”.
Rosana Grinberg defende mais autonomia administrativa aos Procons. Segundo ela, como os cargos de chefia são de confiança, muitas vezes existem vontades políticas que atrapalham uma real fiscalização e punição, ela lembra, por exemplo, da pressão da indústria e do comércio para que não seja divulgada a dos produtos considerados essenciais e de troca imediata. “As entidades civis tem independência absoluta, mas não tem a legitimidade administrativa de autuar e de multar que o Procon tem”, explica. Para Claudia Almeida, do Idec, uma das soluções é o consumidor parar de comprar em estabelecimentos que aparecem muitas vezes nos rankings de reclamação. “Se todo ano determinada empresa aparece no ranking, o consumidor tem que perceber que ela não está fazendo um bom serviço e evitar de adquirir produtos e serviços que ela ofereça”, defende.
Para saber mais:
Parte desse crescimento se deve ao aumento de demanda de queixas, mas é importante ressaltar também que a atuação do Procon mudou nos últimos três anos, quando o órgão abriu mais unidades de atendimento e fez o primeiro concurso público, aumentando, assim, o número de servidores.
Reclamações:
2009
Total: 297
Atendidas: 190 (63,9%)
Não atendidas: 107 (36,1%)
2010:
Total: 515
Atendidas: 289 (56,1%)
Não atendidas: 226 (43,9%)
2011:
Total: 247
Atendidas: 64 (25,9%)
Não atendidas: 183 (74,1%)
2012:
Total: 1606
Atendidas: 536 (33,3%)
Não atendidas: 1070 (66,7%)
2013:
Total: 4.122
Atendidas: 1805 (43,7%)
Não atendidas: 2317 (56,2%)
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