Confira dicas para evitar entrar no vermelho e não ser vítima de índices abusivos de juros bancários. Uma delas é prestar atenção aos contratos, além de controlar o uso do cartão de crédito nas compras
Por Érika Manhatys*
O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu, na última semana, manter em 6,5% ao ano a taxa Selic. O índice é um dos fatores que influenciam a composição de juros bancários, sobretudo nos serviços de crédito. Por isso, é importante o consumidor ficar atento à oscilação e entender que nem sempre isso significa queda nos percentuais pagos pelos serviços contratados nos bancos.
De acordo com a última pesquisa divulgada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), 77% das famílias brasileiras tinham dívidas no cartão de crédito no mês de fevereiro. Daquelas com renda de até 10 salários mínimos, 78% estão endividadas com os serviços de crédito do banco. Na faixa de renda seguinte o valor é um pouco menor: 73,3%. Os débitos com o cartão representam o primeiro motivo do endividamento no país. O segundo muda conforme a renda do usuário. As famílias com renda mais baixa gastam muito em carnês; as mais ricas, com financiamento de bens, como carros e casas.
O que acontece é que, mesmo que a Selic componha os juros dos serviços de créditos, ela não é a única a influenciar o valor cobrado. Esse é o motivo pelo qual as variações negativas da Selic não puxam os juros para baixo. Os consumidores continuam sofrendo com os altíssimos encargos financeiros. Algumas instituições chegam a cobrar por seus serviços de crédito taxas de juros de até 1.000% ao ano.
Finanças
Os juros e multas por atraso são os grandes vilões nos serviços de crédito, entre eles a taxa do rotativo do cartão de crédito, a tarifa do cheque especial e o crédito consignado privado. Uma das saídas para não ficar
no vermelho, mês após mês, em razão das tarifas bancárias é prestar atenção aos contratos, além de controlar o uso do crédito bancário durante as compras, para não aumentar a dívida com os juros. O servidor público Felipe Almeida, 33 anos, se endividou com o cartão de crédito antes de ingressar na carreira pública. “Eu trabalhava em uma empresa que ficou quatro meses sem pagar o salário integral, às vezes, pagava só um terço ou uma parte do valor. Eu tinha contas que não poderia deixar de pagar, como aluguel e plano de saúde”, relata.
“Esses débitos que eu não estava conseguindo arcar, eu pagava com o cartão de crédito e pagava o cheque especial com o que recebia da empresa. Conforme eu ia bancando as dívidas com o meu crédito, o banco passou a aumentar os limites do cartão, sem consentimento prévio. Tudo para que eu gastasse mais eme enforcasse com as dívidas”, reclama o servidor. Muitas vezes, uma fonte de endividamento gera outras, como aconteceu com Felipe. “Nessa época, chegava a vir até R$ 2 mil só de juros do cheque especial, até que chegou um momento insustentável e eu precisei contratar um empréstimo que cobria o valor de todas as minhas dívidas do banco. Então, acabei me envolvendo em uma bola de neve por causa dos juros altíssimos do meu cartão e cheque especial”, conta Felipe.
Para evitar essa situação, Ricardo Morishita Wada, professor da Universidade de Brasília (UnB) e especialista em direito do consumidor, elenca alguns passos. O primeiro é buscar o extrato do cartão para conferir o que se deve. Depois, o consumidor deve verificar junto ao banco quais são as possíveis negociações. Se não conseguir, o ideal é buscar outras instituições financeiras que possam oferecer melhores condições. Ele explica que, algumas vezes, o endividamento ocorre pela falta de informação ou por cláusulas contratuais abusivas. Nesses casos, a sugestão é esclarecer as questões legais com o banco e, se não houver acordo, recorrer aos órgãos de proteção. “O consumidor pode buscar a Ouvidoria do banco, que é regulada pela Ouvidoria do Banco Central. Também há a opção de ir ao Procon (Instituto de Defesa do Consumidor) de
sua cidade. Sabe-se que, hoje, a taxa de resolutividade deste órgão é altíssima, quase 80%. Em última instância, caso ele não tenha sucesso com órgãos de defesa do consumidor, ele pode ingressar com uma ação na Justiça e, se couber, no Ministério Público”, orienta Ricardo Wada.
Três perguntas para…
Roberto Bocaccio Piscitelli, professor de finanças públicas da Universidade de Brasília (UnB)
O Banco Central anunciou redução na taxa Selic na última semana. Por que o índice está caindo?
A última reunião gerou mais rebuliço no mercado do que efetiva mudança. A taxa permaneceu em 6,5%. O declínio observado desde janeiro é motivado pela queda na inflação. Mesmo com a queda, os consumidores não têm sentido a mudança.
Por que as taxas de juros não acompanham o declínio?
As pessoas costumam confundir a taxa nominal e a taxa real, aquela que é realmente aplicada pelas instituições de crédito. No Brasil, a taxa real é uma das mais altas do mundo, o valor cobrado em juros é muito elevado. Os juros são compostos por uma série de fatores determinados pelas instituições e de acordo com o aceitável pelo mercado. Por isso, mesmo que a Selic apresente queda, não se sente variação na ponta. As dívidas com serviços de crédito são um dos principais fatores do endividamento. Brasília tem um alto nível de comprometimento de renda, acima do restante do país.
Há acordo entre as financeiras e bancos para manterem as taxas dos serviços de crédito altas?
Há um padrão praticado pelas instituições financeiras, no qual não se vê grandes diferenças. Isso ocorre pela pouca oferta. A concorrência é pequena, quase desprezível.
* Estagiária sob supervisão de Mariana Niederauer