Por Flávia Maia e Rafael Campos
O amarelado da seca em outubro tornou-se uma coloração nova para a propriedade do agricultor Rodrigo Barzotto Werlang, 38 anos, localizada em Planaltina. Acostumado a ver pés de milho altos nessa época do ano, ele espera o aval de São Pedro para começar uma outra safra. “Se estivéssemos em um ano normal, todo esse terreno estaria verde”, garante. Rodrigo e outros milhares de agricultores do Distrito Federal são personagens da história da mais expressiva crise hídrica vivida na capital do país. Os produtores sofrem duas pressões: a falta de chuva e a redução da captação de água para as plantações no intuito de não atrapalhar o abastecimento nas residências. Nesta semana, os principais reservatórios da capital do país – Barragem do Descoberto e Santa Maria – chegaram aos volumes mais baixos da existência. Há previsão de que o Descoberto chegue a 25% e se inicie a cobrança de um valor a mais na fatura mensal de água.
Na gestão do escasso recurso hídrico, os produtores tiveram que aprender a revezar a água, a deixar campos sem plantação e a abrir mão da safrinha. Segundo dados da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater), na seca de 2016 houve queda de 70% na produção de grãos e diminuição de 30% da área plantada. As produções de milho e feijão foram as mais afetadas, assim como as hortaliças sentiram o peso da falta de água. O resultado começa a refletir no preço de itens da feira, como tomate, milho, chuchu e batata que chegaram a subir até 100%.
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A situação está tão alarmante que, pela primeira vez na história do DF, um canal rural teve que ser fechado para evitar desabastecimento de água ao consumo humano. O acesso fica na região do Descoberto e a água era usada para cultivo de plantas de paisagismo. “Com a baixa do reservatório, priorizamos o abastecimento das casas e as plantações destinadas à alimentação”, explica Hudson Rocha de Oliveira, coordenador de fiscalização da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento do DF (Adasa).
Outros canais agrícolas, como o Santos Dumont, no Pipiripau, em Planaltina, e o Roteador, na Bacia do Descoberto, próximo a Ceilândia e Águas Lindas (GO), tiveram as vazões reduzidas, dessa forma, os produtores estão com menos acesso à água. No Santos Dumont, a quantidade do líquido disponível para a agricultura caiu pela metade e no Roteador a queda foi de 30%. A saída encontrada pelos agricultores foi o revezamento – a propriedade fica 24 horas com acesso a água e 48 horas sem. Nas fazendas localizadas na região do Rio Preto, em Planaltina, onde há propriedades maiores e com uso de pivô, a solução foi mais radical: como a vazão do Ribeirão Extrema estava baixa, todos os grandes produtores suspenderam as plantações desde julho para não ligar os equipamentos de irrigação e abriram mão da safrinha.
Para evitar que as estiagens prejudiquem a produção de alimentos no futuro, a estratégia traçada pela Adasa consiste em combater as perdas no transporte da água. No Santos Dumont, por exemplo, nos 20 quilômetros de extensão, a perda é de 40%, esse volume de água dissipada seria suficiente para abastecer cidades com o porte como o de Planaltina e Brazlândia. Por isso, a agência tem projetos para transformar os canais que correm a céu aberto em tubulações para diminuir a perda de água no trajeto do rio à propriedade.
Enquanto os órgãos públicos pensam na melhor gestão para que os recursos sejam suficientes para todos, os produtores começam a se adaptar a escassez vivida na pele. “A falta d’água começou a ser sentida em outubro de 2015, porque choveu pouco. Até então, os reservatórios estavam normais. Mas, em abril deste ano a situação foi se agravando e começamos a ter pouca água para os sistemas de irrigação”, comenta o produtor Rodrigo Werlang, que vive no PADF, em Planaltina. “Perdi entre 30% a 40% na safra que ainda nem foi plantada, porque, como ainda não pude começar, vou plantar atrasado. Na passada, tivemos perdas que chegaram a 80% por falta de água”, garante Werlang, que está há 34 anos na região e diz que jamais viu uma situação tão crítica.
A 70km dali, o drama se repete. Desde 1970, a chácara na Estrutural em que vive o pai do agricultor Eurípedes Ferreira da Silva, 54 anos, tem uma cisterna. “Nunca ela havia ficado sem água. Este ano, secou pela primeira vez”, relata. Desde que começou a plantar em seu próprio terreno, em 1986, tem no cuidado com as nascentes um dos seus objetivos como produtor. “Mas essa atitude é de poucos. Estão destruindo nascentes, cavando poços e ninguém preserva nada. A água da minha chácara não está contaminada pelo Lixão (da Estrutural) porque eu cuido”. Eurípedes, que produz, entre outros vegetais, mandioca e quiabo, diz que, caso a situação se repita no ano que vem, ele vai desistir da lavoura. “É triste, mas sem água não é possível”.
Segundo dados do Instituto de Meteorologia, o ano de 2016 ainda sofre as consequências das pouca chuva e das altas temperaturas do ano passado. Em 2015 chouve 19% a menos do que a média. Neste ano, nos nove primeiros meses choveu mais do que no mesmo período do ano anterior. Entretanto, não foi o suficiente para recompor a perda.
Itens mais caros na feira
O reflexo da escassez de água na agricultura começa a chegar na feira e nos supermercados. Produtos mais dependentes de água como milho, quiabo, chuchu, abóbora, batata-doce e tomate estão mais caros, segundo o índice semanal divulgado pela Centrais de Abastecimento do Distrito Federal (Ceasa-DF). O impacto nos preços só não está mais expressivo por conta da crise econômica que o país vive, que levou a diminuição do consumo de alimentos e formação de estoque. “Mas se a produção estivesse normalizada, certamente, o preço dos alimentos estariam mais em conta”, analisa Adalmyr Morais Borges, coordenador de operações da Emater.
O tomate chegou a subir 100% em setembro. O quiabo, 43,37% na primeira semana de outubro, assim como o chuchu chegou a 26,46% e a batata, 22%. O milho também subiu e impacta na criação de animais, uma vez que o grão é o principal elemento da ração. Assim, leite, ovos e carne também sofrem com a queda de produção.
O economista da Ceasa-DF João Bosco Soares Filho explica o peso da crise econômica para composição dos preços. “Você tem de olhar produtos específicos porque a cesta, no geral, não tem recuperado seu valor de mercado”. A cesta que ele cita é a seleção de produtos analisada mensalmente pelo setor de estatística da Ceasa.
Marcos Franco, engenheiro agrônomo da Ceasa, explica, no caso do mercado do DF, a crise hídrica local e nacional influenciam no preço dos produtos. “Apenas 25% do que é comercializado na Ceasa é produzido no DF, o restante vem de fora”.
Presidente do Sindicato dos Produtores Orgânicos do Distrito Federal (Sindiorgânicos), Éder Diniz, lembra que mesmo com esse tipo de plantação, com manejo sustentável da água, a crise hídrica tem causado prejuízos. “Há culturas que, antes, recebiam duas regas diárias e agora só recebem uma”, conta. O especialista garante que os itens de ciclos longos, como as frutas, sentirão o impacto da falta d’água em 2017. “Por isso, temos intensificado o uso racional dos mananciais, inclusive conversando com quem não trabalha com orgânicos.”
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