FANTÁSTICO

O SHOW DA VIDA

Publicado em Filosofia, Psicologia

Assisti ao Fantástico no último domingo, especialmente para ver o primeiro episódio da série especial sobre os 50 anos do programa. Confesso que me emocionei em vários momentos, relembrando, com o que foi ao ar, o tempo em que eu era uma mocinha – pra quem não sabe, não está acostumado ao termo, era assim que se chamavam, há meio século, as adolescentes, o que era o meu caso. De repente, eu parecia ter novamente 14 anos.

 

Matérias que só cabiam mesmo numa revista eletrônica, algumas que poderiam tranquilamente ser exibidas hoje, como a que falou sobre as ‘viúvas da seca’; videoclipes inesquecíveis como o do “Secos & Molhados”, do super talentoso Ney Matogrosso; as Garotas do Fantástico, hoje senhoras como eu; a Zebrinha da Loteria Esportiva, que parecia viva, mexendo os olhos e a boca, dando umas risadinhas; entrevistas que mostravam grandes entrevistadores e entrevistados de diferentes segmentos. Parte do passado de milhões como eu recriada pela tecnologia, por inteligência artificial, que nos trouxe de volta os primeiros programas perdidos em um incêndio.

 

Qualquer evento como esse, que nos faça voltar no tempo, pode trazer alegrias, tristezas, medos, inseguranças, saudade. Sempre mexe com a gente. Mas viajar meio século para trás, como fez o programa de domingo, não é qualquer coisa. A gente se pega pensando em tudo o que viveu, acertos e erros cometidos, e pode até se desesperar com eventuais decisões, principalmente porque o tempo não volta e não podemos mudar o que já aconteceu. “Aí vem o desespero machucando o coração”.

 

Sei que é difícil e pode até parecer pieguice ou frase pronta o que vou dizer, mas a Vida é feita desse conjunto, que costuma ter mais erros do que acertos, porque ainda não conseguimos aprender com as faltas cometidas pelos outros, como fazem os sábios, nem mesmo com muitas das nossas que, não raramente, precisam ser repetidas à exaustão. A notícia boa é que, se olhamos pra trás e enxergamos onde erramos, significa que já aprendemos o que precisaria ser aprendido e temos enorme chance de não pisarmos na mesma casca de banana novamente. E, se pisarmos, mesmo que venhamos a cair, rapidamente conseguiremos nos levantar.

 

Sempre gostei de pensar na Vida como uma música, notas que vão nos conduzindo, às vezes de maneira vigorosa, alegre, estimulante, às vezes de forma triste, lenta, melancólica. Mas só a maturidade me trouxe o entendimento de que uma música não é feita só de notas, mas também de pausas, momentos como o que se seguiu à minha experiência de assistir àquele episódio do Fantástico 50 Anos, em que parei para pensar na garota que fui na década de 70, que parece ter ficado para trás, mas está bem ali, como uma entidade, só assistindo ao que ando fazendo hoje.

 

Outros episódios virão. E eu os assistirei a todos. Serão uma forma de revisitar a minha história numa espécie de catarse. E tenho certeza de que muita gente fará o mesmo. Só que muitos acreditam que os erros cometidos precisam ser esquecidos, descartados, deletados, mas penso que, pelo contrário, que eles precisam ser encarados, acolhidos, ouvidos, compreendidos, ressignificados, exatamente nessa ordem. Porque eles são parte de nós e só eles nos empurram para a reflexão, para o autoconhecimento. Só eles criam em nós essa fascinante necessidade libertadora.

 

Isso quer dizer que os acertos merecem ser esquecidos, que eles não têm importância? De jeito nenhum! Eles devem ter um lugar especial nas nossas pausas, para que nunca percamos a noção do nosso conjunto. Eles são os erros com os quais aprendemos e com os quais já fizemos as pazes. E estão sempre à nossa disposição, ajudando-nos sem que nem percebamos, segurando a nossa onda. Os acertos fazem parte da nossa obra como algo em que todos os nossos erros um dia se transformarão, são as nossas vitórias sobre as nossa dificuldades.

 

E como hoje estou especialmente musical, deixo aqui as palavras do maravilhoso Gonzaguinha: “Viver e não ter a vergonha de ser feliz. Cantar e cantar e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz… Eu só sei que confio na moça. E na moça eu ponho a força da fé. Somos nós que fazemos a Vida. Como der, ou puder, ou quiser”.

 

Você pode comentar este texto logo depois dos anúncios, mesmo que você não seja assinante do jornal. Ou pode mandar um comentário para mim por WhatsApp no (61)991889002, para que eu o publique. Você também pode me enviar um texto que considerou interessante e que combina com este blog. Aguardo seu contato. Valeu!

 

14 thoughts on “O SHOW DA VIDA

  1. PE via WhatsApp: Vc, sempre muito perfeita e fantástica na hora de escrever um texto para seus leitores. Mto. Obg. 👏👏👏👏👏👏

  2. Lúcia Maria de Paula via WhatsApp: Eu me ví no seu texto. Irretocável. Será coincidência? “Viver e não ter a vergonha de ser feliz. Cantar e cantar e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz…” foi sempre esta música que fez com que eu continuasse meu caminho, apesar de todos os pesares. Beijos carinhosos.

  3. Nelson Monteiro via WhatsApp: Maraci , boa tarde. Adorei seu texto e não teria como não gostar ! Sou do grupo dos mais 75 anos, e as recordações são mais que importantes. 😄😄😄😄😄

  4. Gisele Chaves via WhatsApp: Ao ler esse relato de Maraci Santana no Correio Brasiliense, senti cócegas em comentar que penso como ela, vejo que a vida pode ser interpretada pela música, e sobre música que no caso ela nos remeteu a Secos e Molhados, eu não tive a oportunidade de curtir o movimento criado pelos Secos e Molhados mas tenha a imensa felicidade de estar presenciando a figura de Ney Matogrosso e seus contemporâneos. Tive a honra de estar com ele num lindo festival de música do interior de São Paulo. Festival de Altinópolis. Observar duas vertentes nessas questões. A vertente do campo fazendo grandes festas p povo da cidade e a vertente do movimento performance vibrace. Ao mesmo tempo com letras tão simples que narram o cotidiano e contas verdades sobre o que pensam a sociedade. Vejo as letras deles como leitores sociólogos, antropólogos que leem as culturas por onde quer que passem. Acho lindo observar as vertentes do forró, introduzindo também outras linguagens como Mestrinho, (jazz nordestino), Elba Ramalho frevista e romântica, Daniela Mercury embaixadora da UNICEF, defensora das causas das mulheres, das causas das religiões de matrizes africanas, e de defensora dos indígenas e das crianças através do Criança Esperança. Nossa, para onde essa conversa vai indo? Você estava comentando em ler a história passada através das lentes de uma emissora de televisão que foi capaz de fazer essa revista eletrônica. Muito legal entrar nessa máquina do tempo. Eu pessoalmente tenho reverberado isso em minha vida. Estou reverberando da forma de buscar as leituras de todos os povos do mundo a sua leitura de mundo. Estou estudando vorazmente as diferentes filosofias dos povos para entender e tentar chegar a uma conclusão. Hoje neste dia estou mais convencida da figura do Deus de Espinosa. Mas sou fã de todas as filosofias. Apaixonada pelas filosofias budistas, hinduistas, cristãs, xamanicas, africanas. Será que me convenço com o Deus de Abraão ou com os diversos deuses que foram criados antes do Deus único dele?

  5. Cláudia Pinheiro da Silva via WhatsApp: Sensacional a matéria do fantástico, mas infelizmente a globolixo não faz mais o jornalismo conceituado que impactava com situações e momentos verdadeiros. O seu texto é perfeito e reflete as gerações nas quais não teremos nunca mais…éramos felizes, e não sabíamos. 📺🖥☎️📲😁😘

  6. Ver reportagem como essas nos traz um filme nosso junto.Aos domingos vendo aquelas dançarinas na abertura , ouvir a zebrinha dizer coluna do meio,quanto saudosismo! E ao pensar e passar a nossa vida ali nas memórias boas e ruins é possível avaliar e reavaliar o que queríamos ser e o que conseguimos ser.E o que é melhor nós orgulhamos dessa nossa trajetória.

  7. Ver essas reportagens, nos transporta para uma vida vivida que passa ali na nossa frente.Quanto saudosismo ver aquelas dançarinas da abertura, aquela zebrinha dizendo coluna do meio. Lembrar de muito que vivemos e nos orgulhar, é bom!!
    Revistar o passado nem sempre precisa ser doloroso.
    Maraci, seus textos são demais!!

  8. Rever o passado é preciso coragem, pois devemos lembrar que fizemos o melhor com o que tinhamos de maturidade e conhecimento!! A tecnologia ajuda a passar um filme na nossa cabecinha tão esquecida muitas vezes.E ver os 50 anos do fantástico nos traz lembranças que nos faz reconectar com nós.

  9. João Campos via WhatsApp: Mais um lindo texto para seus leitores. Tenho certeza que você resumiu através da sua emoção, a emoção de milhares de brasileiros que assistiram O Fantástico no domingo passado. Dizem que a saudade é o lugar onde nossa alma gostaria de estar naquele momento, e lá estava eu, meio século atrás, 21 anos, sentado defronte a TV assistindo o Show da Vida. É Fantástico! Obrigado, Maraci!

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