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DE DENTRO PRA FORA, DE FORA PRA DENTRO

Publicado em Psicologia

Eu tenho uma paciente muito engraçada que está sempre me enviando memes sobre a relação entre psicólogos e pacientes. Os dois últimos foram os seguintes:

 

“O fato de que psicólogos precisam de terapia torna a Psicologia uma instituição que é, antes de tudo, um esquema de pirâmide.”

 

“Me sinto contraditória quando chego na terapia, minha psicóloga diz ‘E aí? Tudo bem?’, eu respondo ‘Tudo!’, mas passo os 50 minutos seguintes reclamando da vida.”

 

Não sei quem cria esses memes, mas vou lançar aqui uma sugestão. Acho que outro bem legal seria este:

 

“Me sinto contraditório quando chego na terapia, passo a sessão inteira falando sobre o mesmo assunto de sempre e, ao final, repito ‘Mas isso é página virada, não me afeta mais’.”

 

O primeiro meme é hilário. Mas Deus permita que ninguém da Polícia Federal o receba! O segundo fala de algo que acontece muito mesmo em consultório. Psicólogos e pacientes sabem bem disso. Contudo, creio que esse meme que sugeri fala de algo ainda mais comum em consultórios como o meu.

 

Tive um paciente que era um verdadeiro mestre nisso que eu chamaria de tentativa de “tapar o sol com uma peneira”. Mas ninguém precisa ser um psicólogo experiente, nem mesmo alguém muito esperto, pra saber que aquela página ainda não foi virada porque nem ao menos foi lida como deveria ter sido. Algo semelhante acontece com uma paciente que evita falar comigo sobre assuntos que lhe causam tristeza, tentando “jogar a sujeira pra debaixo do tapete” como se psicoterapia fosse para se conversar sobre amenidades.

 

Quem assistiu ao filme “O Sexto Sentido” conheceu a história de um garotinho que via e conversava com espíritos. Só que a maioria tinha uma péssima aparência, mostrava-se com ferimentos terríveis que o faziam ter medo e fugir. Não era fácil para o menininho lidar com aquilo. Quando alguma “assombração” aparecia, ele fechava os olhos e os apertava bem, acreditando que assim ela desapareceria. Mas isso não acontecia. E ele vivia apavorado por não se sentir tranquilo em lugar nenhum, em tempo algum.

 

Até que, numa noite, ele estava escondido numa cabana de acampamento montada no seu quarto quando surgiu um espírito muito pálido, com grandes e escuras olheiras, vomitando muito. Era uma garotinha. Naquele momento, ele se encheu de coragem e perguntou o que ela queria dele. Ela lhe pediu um favor que impediria que a irmã dela fosse também assassinada por envenenamento. Ele fez o que ela pediu, salvou a outra menina e o “fantasma” finalmente foi embora. Dali pra frente, ele fez isso com todos e, já conhecendo o caminho das pedras, passou a viver em paz, pronto para encarar novas “assombrações”.

 

Penso que problemas não resolvidos, situações não entendidas não apenas intelectualmente, mas emocionalmente, ficam na nossa vida como assombrações. Eles sempre têm algo a nos dizer e exigem de nós atenção, coragem, providências que nos libertarão. E sempre têm muito a nos ensinar, principalmente sobre nós mesmos, porque, em tudo o que nos acontece, está o nosso dedo. Somos, no mínimo, corresponsáveis pelas nossas alegrias e pelas nossas dores.

 

Enquanto “tentamos tapar o sol com uma peneira”, enquanto “jogamos a sujeira pra debaixo do tapete”, enquanto não encaramos os nossos fantasmas, eles nos acompanham, trazendo prejuízos que, muitas vezes, só conseguimos a eles atribuir no processo terapêutico. Quando a cortina se abre, eles lá estão, assistindo à nossa ruína.

 

Esses prejuízos se transformam em verdadeiros nós na linha da nossa vida, que trazem outros nós emocionais. E, sem que nos apercebamos, logo todos esses nós estarão refletidos no nosso corpo sob a forma de mal-estares cujas causas os médicos não conseguem identificar, de doenças de difícil tratamento, de doenças crônicas, de doenças graves, transformando a nossa vida num verdadeiro calvário, sem espaço para a alegria, para novos projetos, para a felicidade.

 

Se você é uma dessas pessoas que vivem como se estivessem carregando o mundo nas costas, para quem nada dá certo, cheia de mazelas, cheia de achaques, lembre-se de buscar, além de ajuda médica, ajuda psicológica. Leve a sério suas dores emocionais. Encare-as! A vida não precisa ser tão difícil. Lembre-se do que diz Walter Franco na música Serra do Luar:

 

“Viver é afinar o instrumento
De dentro pra fora
De fora pra dentro
A toda hora, todo momento
De dentro pra fora
De fora pra dentro
A toda hora, todo momento
De dentro pra fora
De fora pra dentro”

 

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13 thoughts on “DE DENTRO PRA FORA, DE FORA PRA DENTRO

  1. Ana Cláudia via WhatsApp: Achei ele bem detalhado, que nos instiga a pensar e leve ao mesmo tempo.
    Preciso ler mais vezes, mas posso falar de antemão vc arrasou. Os fantasmas precisam ser encarados, contudo somos ensinados a desviar o olhar ,o que machuca não é confrontar os fantasmas e sim ignorá-los.

  2. Lucia Maria de Paula: Que máximo Maraci. Amo esta música. Tudo que você escreve sempre tem algo a ver comigo. Walter Franco, Gonzaguinha.

  3. Seu texto como sempre traz olhares pontuais para o que muitas vezes preferimos ignorar, ou pior, nem saber como resolver, às vezes, a gente lê e relê o parágrafo ou até a página várias vezes, mas não conseguimos compreender o que estamos lendo (uma espécie de analfabetismo funcional), acho que isso se aplica à vida também, o garotinho do filme evitava olhar para o incômodo, e nós muitas vezes, não conseguimos contar tudo para a psicóloga, porque muitas vezes não conseguimos nos ouvir narrando algumas cenas, mas agora depois do seu texto, percebi a importância de encarar os monstros e ressignificá-los para seguir em frente. Gratidão, por mais um texto para nos ajudar a apurar o olhar.

  4. Flavia Campos via WhatsApp: Perfeito!!! Quando a gente não afasta definitivamente os nossos fantasmas eles ficam nos atormentando de diferentes formas.

  5. Teresa Cristina Lustoza Dantas via WhatsApp: Maraci o texto foi “Mara”. Perfeito, como todos que você escreve. Vou encaminhar pra outras pessoas que tem fantasmas que as aflige e muitas vezes não tem coragem de enfrentá-los.

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