Cosette Castro
Brasília – Novembro é conhecido pelo Dia de Finados, um feriado cristão. No Brasil é marcado por visitas ao cemitério, missas e cultos, silêncio, introspecção e saudade. São reflexos de uma cultura do luto melancólica. Mas vida e morte são indissociáveis.
As duas andam juntas desde o dia em que cada um de nós nasce. No entanto, elas têm significados e destinos diferentes. E, para algumas pessoas, podem ser assustadoras.
A vida, independente do lugar geográfico e da cultura, é comemorada, exaltada. Em especial a vida jovem, considerada produtiva para o mercado. Por outro lado, a vida após os 60 anos segue sofrendo apagamento social, mesmo que a pessoa tenha experiência e desejo de novas vivências.
Já a morte, pobre morte, na sociedade ocidental, permeada pela influência judaico -cristã, é escondida, “esquecida” nas falas, nos discursos, nas festas. É literalmente jogada para debaixo do tapete. Como se não existisse.
Essa contínua negação da finitude muitas vezes torna mais difícil para as pessoas aceitarem diagnósticos desafiadores sobre nossos familiares. Ou sobre nós mesmas. Ainda mais quando se trata de doenças sem cura.
Umas das poucas exceções no mundo ocidental são as Festa dos Mortos, no México, país que, ao lado de Honduras e Nicarágua, celebra a morte. Entre os três países a Festa dos Mortos mais conhecida e divulgada é a mexicana.
Ao festeja-la, o país como um todo homenageia a vida vivida de pessoas queridas que já se foram. E, mais do que isso, ao celebrar a morte, eles naturalizam a finitude que deixa de ser um lugar de medo, desespero e negação.
Tenho anotado uma lista de cerimônias e festas populares que quero conhecer em outros países. Uma delas é viajar ao México durante a Festa dos Mortos. Ela é totalmente diferente da tristeza e do silêncio que ocorrem durante as visitas aos túmulos no dia 02 de novembro, no Brasil.
No México, a Festa dos Mortos tem origem indígena e começou há há 3 mil anos com as civilizações Maia e Azteca, entre outras. Sob o domínio espanhol, a festa foi adaptada aos rituais católicos. Deixou de ser comemorada em agosto e passou a ocorrer em final de outubro/novembro, com três dias de celebração.
Naquele país, a festa começa no dia 30 de outubro e se estende até o dia 02 de novembro quando as almas são autorizadas a visitar os parentes vivos. O dia 01/11 é dedicado aos bebês e crianças que já faleceram e o dia 02/11 é dedicado à conexão com as pessoas adultas que já se foram.
A crença dos povos indígenas mexicanos, hondurenhos e nicaraguenses ultrapassou os séculos e se manifesta ainda hoje como resistência cultural e religiosa. Mais do que isso, mostra que a morte não precisa ser vivenciada apenas como dor e perda. As celebrações são um reencontro anual da vida e da morte, lembrando que elas andam de mãos dadas, ao nosso lado, durante a trajetória na terra.
As celebrações também são comemorações e podem ser festejadas com carinho e alegria, referendadas pelo imaginário popular e também pelos desejos individuais daqueles que perderam um ou mais familiares.
No México durante os três dias da Festa dos Mortos há grandes celebrações, tradições, desfiles, músicas, brincadeiras, comidas, bolos, doces que são apresentados em forma de caveiras e ossos.
Um dos pontos altos dos festejos são os desfiles das Catrinas. A personagem de uma caveira com chapéu e roupas elegantes foi criada pelo artista José Guadalupe Posada como uma sátira social no começo do século XX. E foi eternizada nos murais do artista Diego Rivera para criticar os mexicanos que renegavam suas origens indígenas.
Atualmente pessoas de todas as idades saem às ruas fantasiadas de Catrinas, com mascaras de caveira, roupas e chapéus extravagantes. Ou de morte, com roupas de esqueletos. Com isso, transformam o luto em uma celebração da vida vivida.
Para além das festas na rua e das fantasias, dentro das casas as pessoas enfeitam os ambientes com flores, incensos, velas e altares. Preparam as comidas prediletas das pessoas que já se foram, para que elas se sintam bem recebidas em suas visitas e se lembrem de como eram amadas enquanto estavam vivas.
Além da montagem de altares e do uso de maquiagem e fantasias, as celebrações incluem visitas aos cemitérios para decorar os túmulos, oferendas como pães, frutas e caveiras de açúcar. Tudo para celebrar a vida dos entes queridos que já partiram e para seguir conectados com os ancestrais.
Em tempos de tanto medo da morte, o exemplo mexicano é mais um aprendizado sobre as formas possíveis de acolher o fim da vida. Seja de alguém que amamos. Seja a nossa própria finitude.
PS: O Programa de entrevistas Terceiras Intenções online de novembro será apresentado na última terça-feira do mês, dia 25, ao vivo, das 19 às 20h, no canal do YouTube Coletivo Filhas da Mãe. Aguarde!
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