Todo Dia é Dia de Novembro Negro

Publicado em Novembro Negro

Cosette Castro & Renata Parreira

Brasília – Novembro está terminando, mas o enfrentamento ao racismo continua todos os dias,  principalmente quando levamos em conta as desigualdades  históricas entre a população negra e a população branca.

Para escrever sobre o tema, convidamos a Professora Renata Parreira, ativista do Movimento das Mulheres Negras  no Distrito Federal. Lembrando que as mulheres não andam sós, Renata convida para a leitura de uma estrofe do poema “Ao Escrever”, de Conceição Evaristo: “Ao escrever a dor, sozinha, buscando a ressonância do outro em mim, há neste constante movimento a ilusão-esperança da dupla sonância nossa”.

Renata Parreira – “Em primeiro lugar, gostaria de me identificar. Sou uma mulher cis negra. Possuo traços negróides: nariz largo, lábios grossos, olhos pequenos e apertadinhos, cabelos crespos roxos na altura dos ombros. Tenho 1.80 de estatura e 115k em um corpo forte e bem distribuídos. É a partir desse lugar que escrevo sobre o novembro negro e as mulheres negras.

O Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra (20/11), formalizado pela Lei 12.519/2011, demarca as lutas do Movimento Negro. Seja pelo reconhecimento e valorização da cultura africana e afro-brasileira, seja por equidade racial e visibilidade.

O Movimento de Mulheres Negras reivindica a reparação pelo apagamento histórico de Dandara dos Palmares. Dandara liderou soldados palmaristas na luta dos quilombolas contra os portugueses. Ela também contribuía na manutenção do Quilombo, não só trabalhando nas colheitas e na caça, mas também pensando as estratégias de resistência do Quilombo. Em 1694, foi capturada pelos portugueses, cometeu suicídio para não ser escravizada. Isso ocorreu um ano antes da morte de Zumbi.

Dandara foi companheira de Zumbi tendo três filhos com ele. Em uma sociedade patriarcal como a brasileira a tendência é associar Dandara como esposa de Zumbi esquecendo a relevância de sua atuação histórica como uma mulher corajosa, valente e aguerrida.

As comemorações, debates e denúncias são fruto da conquista do Movimento Negro dedicado à reflexão sobre a agenda da população negra e dos Movimentos Sociais Negro ao longo dos anos. De um dia de lutas, passou-se a realizar a Semana da Consciência Negra e atualmente temos o Novembro Negro constituído em ações, iniciativas, atividades que se desenvolvem ao longo do mês e poucos projetos produzidos que culminam em novembro.

Para além de provocar a sociedade em relação às desigualdades, a sub-representação nos espaços de sociabilidade, dificuldade de acesso aos equipamentos/serviços públicos, a violência policial,  ao genocídio da juventude negra e tantas outras desigualdades, inaugura no Dia da Consciência Negra (20) e os 21 dias de ativismo pelo fim da violência contra a mulher. Esses dias estão interrelacionados, não pela alegria ou doçura, mas por uma história de  violência.

As estatísticas do Sistema Único de Saúde (SUS),  números duros que não revelam vidas nem histórias pessoais, apontam que, em 2022, mais da metade (55%) das brasileiras vítimas de violência eram mulheres negras. Já entre as vítimas de violência sexual 67% eram mulheres pretas e 62% mulheres pardas. Quanto aos feminicídios, o Sistema Nacional de Mortalidade informa que 67% dos casos vitimaram mulheres pretas e pardas.

De acordo com a pesquisa nacional do Instituto Data Senado sobre a Violência Contra Mulheres Negras (2024), a fragilidade econômica é um grande fator de risco para as mulheres negras. Dois terços das vítimas (66%), têm baixa ou nenhuma renda e a maioria delas, 85%, são obrigadas, pela dependência financeira, a viver com seus agressores. Por isso a urgência de Políticas Públicas que estimulem a educação, a formação continuada e a emancipação econômica das mulheres negras”.

Prestes a completar cinco anos, o Coletivo Filhas da Mãe segue buscando sair da Sociedade da Violência para construir uma Sociedade do Cuidado. Uma sociedade onde  as diferenças salariais  por questões de gênero e raça deixem de existir. Onde escalas de trabalho exaustivas sejam humanizadas. Onde os direitos sociais sejam respeitados, independente de raça, gênero e  idade e onde o trabalho de cuidado seja reconhecido e saia da invisibilidade.

PS: O poema “Ao Escrever” aparece no livro Poemas da Recordação e Outros Movimentos (2021). Conheça outros poemas de Conceição Evaristo aqui.

 

 

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