19.06, O Dia que Brasília Foi Bombardeada

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Cosette Castro

Brasília – Na quarta-feira, 19, uma bomba vinda da Câmara Legislativa do Distrito Federal ( CLDF) caiu no coração da cidade.

A Capital Federal sofreu tremores e seus moradores estão abalados. E não são tremores apenas simbólicos.

Deixarão rachaduras profundas na característica urbana de Brasília, patrimônio mundial da Unesco desde 1987. E, por consequência na qualidade de vida de seus moradores.

Detentora da maior área tombada do mundo, com 112,25 km², a Capital Federal é um marco da arquitetura e urbanismo modernos. É o único bem contemporâneo a merecer essa distinção no mundo.

Uma distinção que está com os dias contados. A Câmara Legislativa Distrital aprovou em regime de urgência, o novo Projeto de “Preservação” do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB).

O Projeto de Lei Complementar nº 41 tem mais de mil páginas. Mas sequer foi debatido pelos 18 deputados distritais apoiadores do governador Ibaneis Rocha. Passou pelas comissões e foi votado no mesmo dia.

Lúcio Costa, o arquiteto que planejou Brasília, deve estar se revirando no túmulo. Niemeyer também.

Além de transformar a Capital Federal em algo totalmente irreconhecível, a “bancada dos 18” chegou ao ponto de, a partir de agora, abrir mão do direito de decidir sobre as questões urbanísticas da área tombada.

Ou seja, 18 deputados distritais que foram escolhidos pela população deram as costas aos seus eleitores e eleitoras.

O futuro urbanístico de Brasília foi entregue de bandeja ao Governo do DF, autor do projeto.

A desrresponsabilização coletiva sobre o que vai acontecer com a Capital do país é tão grande que as próximas decisões sequer passarão pela CLDF. A partir de agora o governador Ibaneis Rocha precisará apenas de um simples decreto para fazer novas alterações no Plano Piloto. Mais além do que já conseguiu aprovar na quarta-feira.

O estrago é tão grande que prevê motéis em áreas escolares.

A proposta contou com o apoio da bancada distrital conservadora, inclusive a religiosa. A mesma bancada que nega o direito à educação sexual para as crianças em escolas públicas. E impedem que elas aprendam sobre o que é abuso para que possam denunciar pedófilos.

O PPCUB permitirá a abertura de lojas de material de construção no setor das Embaixadas. E, como se não bastasse, prédios de três andares poderão chegar até 12 andares, transformando radicalmente o centro de Brasília.

Mas o projeto não para aí. Ele institui novos lotes na beira do Lago Paranoá, apostando na privatização do lago com criação de condomínios tipo resort. E o lago, que hoje é desfrutado por toda população do Distrito Federal, independente da classe social, voltará a ser utilizado apenas por uma minoria.

O show de deturpação do projeto urbanistico da Capital Federal segue. Os 16 pequenos hotéis existentes à volta do Eixo Monumental vão poder crescer até 13 andares deformando uma das características mais importantes do Plano Piloto.

Nem o Setor de Grandes Áreas (SGA) foi esquecido. A partir da emenda do deputado Thiago Manzoni (PL), os imóveis existentes no SGAN e SGAS, entre as vias W.4 e W.5 poderão abrigar alojamentos, hotéis, apart-hotéis e, inclusive, motéis. Mesmo que boa parte das escolas de Brasília  estejam localizadas na W.4 e W.5 das Asas Sul e Norte.

Tais mudanças vão impactar diretamente na atual e nas novas gerações, muitas delas descendentes das pessoas que construíram Brasília.

Entre as consequencias das deformações no projeto urbanístico está o impacto ao meio ambiente, o aumento da circulação de carros e outros tipos de transportes, o aumento da poluição e o aumento dos engarrafamentos. Sem contar o impacto na saúde mental dos moradores de todas as idades do Plano Piloto.

Afinal, não é todo dia que cai uma bomba no meio da cidade que pretende destruir a beleza, os espaços verdes, a qualidade de vida e o projeto urbanístico em nome do “crescimento” e dos negócios.

Dos 24 deputados distritais apenas 06 defenderam o projeto de preservação urbana da cidade patrimônio da humanidade. Foram eles: Gabriel Magno, Ricardo Vale e Chico Vigilante (PT), Dayse Amarillo (PSB), Fábio Félix e Max Maciel ( PSOL). O Coletivo Filhas da Mãe agradece.

Construir uma Sociedade do Cuidado inclui pensar cidades inclusivas, com memória e qualidade de vida para a população. Brasília é uma cidade referencia para a humanidade. É patrimônio de todo país.

PS: Este domingo, dia 23, faremos caminhada no Parque Ecológico da Asa Sul (Quadra 614) saindo às 8h30. Depois do lanche compartilhado, às 10h, teremos Oficina gratuita de Kokedama, técnica japonesa de plantio de mudas com o Biólogo Fábio Neves. Inscrições AQUI.

Cosette Castro

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