Das Alegrias do Cuidado Familiar

Publicado em Cuidadoras Familiares

Cosette Castro & Natália Duarte

Brasília –  Semana passada ocorreu o lançamento do Centro de Biotecnologia Molecular, o C-Biotech, do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Brasília (UnB).

O C-Biotech é um marco para a pesquisa e inovação em biotecnologia no Centro Oeste. Reúne pesquisadores, estudantes e profissionais em um ambiente propício para projetos e parcerias estratégicas.

Na inauguração, a homenageada foi a professora aposentada da UnB Vilneyde Mabel. Dra. Vilneyde tem 85 anos e Alzheimer.

Para refletir sobre os desafios e alegrias das cuidadoras familiares, hoje quem escreve no Blog é Natália Duarte, professora da UnB e uma das coordenadoras do Coletivo Filhas da Mãe.

Natalia Duarte – “Na cerimônia de lançamento do C-Biotech dia 16, a estrela foi a Dra. Vilneyde Mabel, ex-professora do coordenador do Centro, Fernando Araripe.

Foi dele a ideia de homenagear a professora aposentada, diagnosticada com Alzheimer há 13 anos.

Como diz minha querida amiga, a educadora Esther Grossi: “Toda memória tem um/a professor/a/e”.

Fernando convidou Simone, sua filha e cuidadora, para representá-la e ficou felicíssimo quando ela disse que a mãe estaria presente.

“Fernando, aparentemente ela não se lembra de seu tempo de professora. Mas o afeto ela sempre reconhece”.

Simone compartilhou as fotos e o link do evento nos grupos de WhatsApp do nosso Coletivo. E uma onda de alegria tomou conta de todas nós.

Nos registros há tanta coisa linda!

Como ver que a demência não apagou a professora da memória de seus alunos. Ou ver o carinho de todos com ela. Observar a felicidade de Vilneyde no acolhimento. E, principalmente, a alegria da Simone.

Escrevemos e falamos muito da carga física e emocional do cuidado; de sua feminilização; da desproteção social da velhice, especialmente aquela com demência. E do caos que vira a vida de quem cuida quando não sabe o que está acontecendo.

Falamos e escrevemos porque há invisibilidade sobre esses temas.

Toda família tem uma pessoa idosa que necessita de cuidados e a sociedade não fala disso. Escrevemos e falamos porque é informação preciosa para quem está vivenciando essa situação.

Falamos e escrevemos também porque é urgente a questão do cuidado. E precisamos que todas/os/es saibam. É imperiosa uma Sociedade do Cuidado.

Das Alegrias

Temos muitos desafios, mas também é importante falar da beleza do cuidar.

Ao ver a alegria da Vilneyde e, mais ainda, ao enxergar a alegria de sua filha cuidadora, fui procurar as minhas.

Vi que não enxergava a força incrível do meu pai, a mesma força que vi na mãe da Simone.

Às vezes não lembramos que, no dia a dia, são eles que enfrentam a doença.

Enxergar a força do meu pai foi tão bonito.

Encontrei o pai da minha memória. Lembrei que essa é uma lição que ele me dá desde sempre. E continua dando.

Ele tem força vital para levantar todo dia, encarar o dia sabendo do seu diagnóstico e ainda ter seus prazeres.

Vi que é ele quem me faz insistir em atividades de socialização, em ajudá-lo a estar cercado de pessoas e de crianças. Foi ele quem me ensinou a insistir. E como insisto!

Com certeza meu pai foi meu melhor e mais constante professor. Na verdade, ele foi o melhor pai. Ensinando no cotidiano, sempre ao nosso lado.

Por isso toda a família cuida dele, pergunta por ele, lembra dele. Vejo que eles também ficam felizes! Muitos virão de outros estados para festa de 90 anos do Ítalo.

A família de Brasília está sempre presente, assim como amigos mais próximos de décadas.

No entanto, caso tivéssemos mais informações desde o diagnóstico, não teríamos algumas dificuldades.

Desde o  começo fomos co-cuidadores do meu pai. Meu irmão e sua família se mudaram  para a casa dele. Eu ficava responsável pelas atividades externas, como médicos e exames.

Após dois anos, quando se esgotaram, foi a minha vez de assumir o cuidado familiar. Hoje ele mora no mesmo prédio que o meu e estamos juntos todos os dias.

Claro que seguimos tropeçando, é da vida. Mas com certeza estamos mais conscientes e preparados como irmãos co-cuidadores.

Quando meu pai recebeu o diagnóstico de Alzheimer fomos a vários especialistas. Encontramos a Dra. Andrea Alvarenga. Foi ela quem me disse na primeira consulta:

“O Alzheimer pode adoecer a família inteira. Você precisa de apoio nesse momento. Existe o Coletivo Filhas da Mãe. Você deveria participar.”

Dra. Andréa segue sendo a médica do meu pai. E a minha. Ela tem me ajudado muito com o autocuidado.

Nossa família aprendeu também a respeitar e valorizar as profissionais do cuidado do meu pai. Desse modo elas cuidam tão bem do meu pai que chega a ser um presente.

E como Simone e sua mãe, vi que meu pai continua me inspirando muita admiração. Obrigada Simone e Vilneyde.

Compartilhar das alegrias que o  cuidado familiar proporciona me fizeram lembrar de Espinosa, dos afetos e da alegria que aumentam a potência de existir.”

A alegria da D. Vilneyde nos lembra a beleza de ensinar alguém e também de aprender com outra pessoa. E dos seus desafios. Voltaremos ao tema…

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