Janeiro Branco, Saúde Mental Enquanto Há Tempo

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Cosette Castro

Brasília – Começamos 2024 apoiando a campanha “Janeiro Branco”.

Este ano a campanha completa 10 anos de atuação em defesa da saúde mental no Brasil para todas as idades. Independente de gênero, raça ou classe social, o projeto tem como mote “Saúde Mental Enquanto Há Tempo”.

No Coletivo Filhas da Mãe nossa ênfase é a saúde mental das mulheres. E isso não ocorre por acaso.

Para além dos diagnósticos de transtornos mentais como esquizofrenia, transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDHA) ou do espectro autista (TEA) há uma série de fatores que causam sofrimento mental. Se não forem tratados podem evoluir para quadros crônicos, como é o caso da depressão.

Os fatores de adoecimento mental das mulheres são múltiplos.

Elas são a maioria das pessoas que cuidam no Brasil. São elas que sofrem sobrecarga física e emocional diariamente pelos diferentes tipos de cuidado que desempenham. E são elas as que trabalham gratuitamente dentro de casa. Ou seja, enfrentam diferentes desafios cotidianos ao longo dos anos.

De acordo com pesquisa do Datafolha (2023), além de cuidadoras de pessoas da família de diferentes gerações, 55% das brasileiras são mães solo. Elas são mulheres separadas, viúvas ou mães solteiras.

Entre elas, 50,8% são chefes de família, como revelou estudo do Dieese (2023), o que aumenta o grau de responsabilidade e sobrecarga emocional.

Já entre as casadas, também cuidadoras familiares por anos a fio, a violência não para de crescer, seja ela física, psicológica, sexual, moral ou patrimonial.

Diferente das agressões física, sexual e patrimonial, que têm consequências visíveis no corpo, na conta bancária ou nos bens, muitas mulheres custam a perceber o ciclo de violência moral e psicológica a que estão submetidas. Um ciclo que pode devastar a saúde mental dessas mulheres.

Muitas vezes esses diferentes tipos de violência seguem no decorrer da vida das mulheres após os 60 anos.

Elas ainda correm o risco de sofrer negligência e abandono em caso de doenças como câncer ou como as demências. Segundo a Sociedade Brasileira de Mastologia (2023), 70% das mulheres diagnosticadas com câncer são abandonadas pelos maridos/companheiros. E isso causa mais sofrimento psíquico.

Em 2023, pesquisa sobre violência contra as mulheres realizada pelo Data Senado mostrou que três em cada 10 mulheres já sofreram violência doméstica no Brasil. São dados apenas das mulheres que têm coragem de denunciar o ocorrido.

Como se não bastasse, em 2023 somente no Distrito Federal, aconteceram 35 feminicídios, sendo o último impetrado na virada para 2024. Este é um país perigoso para as mulheres, em especial negras e indígenas. Vivemos sob o signo do medo.

Em meio à Sociedade da Violência, ainda há o cuidado de familiares com demências. Essas doenças neurodegenerativas sem cura não atingem apenas o paciente. Elas causam sofrimento psíquico em cuidadoras familiares e entorno, desestruturando famílias inteiras.

No decorrer dos anos de cuidado familiar se multiplicam os casos de depressão, crises de ansiedade, insônia, crises de pânico, distúrbios alimentares e outras compulsões como jogos e séries na internet. Ou crises de Burnout, também chamada síndrome do esgotamento profissional, ainda que o cuidado familiar sequer seja reconhecido como trabalho.

O que fazer para manter a saúde mental das mulheres?

Pensando no adoecimento físico e emocional das cuidadoras familiares, o Coletivo Filhas da Mãe incentiva o cuidado coletivo e o autocuidado. É essencial escutar os sinais e avisos que nossos corpos enviam.

Falar sobre a dor e o sofrimento emocional é o primeiro passo para o tratamento e tentativa de cura. Também acreditamos que falar pode reduzir o preconceito e o desconhecimento sobre saúde mental.

Desde cedo aprendemos a esconder as emoções, como se fossem um pecado, uma imperfeição. Hoje sabemos que há outros caminhos para tratar questões emocionais. Um deles é falar sobre o que se sente, ainda que o sentimento não esteja claro para você.

Falar é essencial, mas não basta conversar com amigos ou familiares. Eles podem ser um ombro amigo e demonstrar carinho oferecendo seu tempo e abraço em algumas ocasiões. No entanto, não estão preparados para identificar angústia, ansiedade, depressão e outros transtornos psíquicos.

Você pode pedir ajuda especializada no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) mais perto da sua casa, pode agendar com psicólogos/psicanalistas no plano privado de saúde ou ter atendimento particular. E, em caso de urgência, pode ligar para o Centro de Valorização da Vida (188).

Outro espaço importante são os grupos de acolhimento para cuidadoras e ex-cuidadoras familiares de pessoas com demências, como o Coletivo Filhas da Mãe.

Em janeiro teremos oficinas preparatórias para o Carnaval 2024. Um espaço de encontro, abraços, aprendizagem e risos. Cultura e arte são fundamentais. Além do estímulo cognitivo, também ajudam a reduzir o sofrimento mental.

PS: Os materiais da campanha “Janeiro Branco” são gratuitos e estão disponíveis aqui.

Cosette Castro

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