Ana Castro & Cosette Castro
Brasília – Hoje postamos o Blog mais tarde. Por uma boa razão.
Pela manhã estivemos acompanhando as palestras organizadas pelo Ministério da Saúde no Setembro Roxo. Este é o mês mundial de conscientização sobre o Alzheimer e outras demências.
Sugerimos às pessoas que têm familiar com demência e quem não tem também, a dedicar uma escuta atenta às informações e comentários. Acesse aqui o link do evento.
Um dos comentários nos tocou de perto. A sugestão de que a pesquisa “Estudo sobre Pessoas Idosas com Demências e Cuidadores no Distrito Federal” (IPE-DF, 2022) encomendada pelo Coletivo Filhas da Mãe seja ampliada todo país. ( link aqui)
Nós vamos mais além. Sugerimos também que o estudo nacional seja acompanhado do Guia de Ações e Serviços Públicos para Pessoas Idosas com Demências e para Cuidadoras/es, como ocorreu no Distrito Federal e que foi publicado em julho de 2023 (IPE-DF). (link aqui)
No projeto Filhas da Mãe Contam Histórias apresentamos mais uma cuidadora. Hoje é a vez de Tereza Cristina Pereira, funcionária aposentada do Banco do Brasil que vive em Brasília. Desde 2018 cuida da tia, de 84 anos, com demência, e da sua mãe, com 92 anos.
Tereza Cristina Pereira – Sou filha única de mãe solteira, literalmente. Cresci em um lar cercada pelo amor, carinho e mimos de três mulheres: minha mãe, minha avó e minha tia.
Fui uma criança feliz, uma jovem cordata e uma mulher forte e aguerrida, qualidades herdadas da ancestralidade e que moldou a cuidadora familiar que sou hoje. Nessa função há dias em que ser forte é fundamental. Em outros, a determinação e a resiliência não me deixam esmorecer, fraquejar nem jogar a toalha.
Depois que minha avó faleceu, minha mãe voltou para Brasília para ficar mais próxima. Minha tia permaneceu em BH.
A diferença de idade entre ambas não é muita, mas minha tia, a mais nova, sempre foi mais doentinha. Mesmo à distância, eu estava sempre atenta as suas necessidades físicas e econômicas. As mazelas iam da depressão e insônia, passando por desconforto gástrico, tontura, enjôos constantes.
Havia também uma artrose que, além da dor, provocava deformação nos dedos das mãos. Isso impactava às atividades diárias que ela tanto gostava. Foi então que eu resolvi, depois de muita conversa, convencê-la a vir para Brasília.
Mudança feita, casa arrumada, notei que minha tia não era mais a mesma. Fazia confusão com os remédios, não se lembrava da senha do banco ou de compromissos que havíamos marcado. Esquecia o forno aceso, ligava diversas vezes por dia para me perguntar a mesma coisa e começou com um tremor no maxilar inferior.
Inicialmente pensei que fosse parte do processo de adaptação à vida nova, a Brasília, a nova casa. Reações psicossomáticas não eram novidade em se tratando dela. No entanto, o quadro foi se agravando e, após consultas com geriatras e neurologistas, ela recebeu o seguinte diagnóstico: “sua tia está no início de um processo de demência. Não sabemos dizer qual. Ela nos parece bordeline do Alzheimer. Vamos continuar acompanhando”.
E lá se vão cinco anos. Continuamos sem um diagnóstico definitivo vivendo cada dia de uma vez. Há dias em que ela me lembra a minha tia de antes. Amiga, conselheira, comadre, presente em todos os momentos. Em outros, é um arremedo daquela mulher que conheci. Hoje cuido de seus remédios e de sua conta bancária. Levo ao médico, à fisioterapia. Resolvo as questões práticas relacionadas aos seus direitos e deveres como cidadã.
O amor que sinto por essa “mãe” é imensurável. Quando me sinto esgotada e impaciente, recordo de seu amor e dedicação a mim e aos meus filhos. Aí, levanto, sacudo a poeira e a cubro de beijos.
Confesso que não tem sido fácil. Cuido de minha mãe também. A despeito de não apresentar sintomas de demência, já tem 92 anos e carece de alguma atenção com os remédios, idas aos médicos, os exames, as pirraças e as implicâncias. Juntando tudo, no final do dia estou só a capa da mulher maravilha.
Entretanto, nem tudo é sombrio e escuro. Sou grata pelo fato delas ainda terem autonomia para andar, ir ao banheiro, tomar banho e preparar seu próprio lanche, pois elas almoçam na minha casa. Durmo e acordo torcendo para que as mantenha assim, pois contratar alguém está fora dos parâmetros econômicos, além do que elas não aceitariam.
Enquanto isso, busco força, orientação e informação. Tenho encontrado pessoas que me abrem trilhas, picadas e mostram um caminho. Me acolhem sem me abraçar e me ensinam que não estou só nesse universo. Entre esse apoio está o Coletivo Filhas da Mãe”.
PS: Esta semana seguimos com as atividades do SETEMBRO ROXO 2023. Na terça (12) e quinta-feira (14) a tarde teremos Oficina de Leitura e Escrita Criativa com Valeria Nunes, na Biblioteca Demonstrativa do Brasil (BDB), na Quadra 507 da W3 Sul. Inscrições gratuitas neste link.