E Se Fosse Você, Onde Ia Querer Morar?

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Ana Castro, Cosette Castro & Convidada

Brasília –  Para dar contituidade às comemorações do aniversário de 3 anos do Coletivo Filhas da Mãe, convidamos a pesquisadora e terapeuta ocupacional Emanuela Mattos, da Universidade Federal de São Paulo/Baixada Santista (Unifesp).

Autora do livro ” A Jornada do Cuidar. Experiência Única de Cuidadores Familiares na Demência”,  Emanuela Mattos é Coordenadora do Observatório Temático de Envelhecimento/ Unifesp. Hoje ela traz reflexões sobre espaços inclusivos e seguros para pessoas com demências.

Emanuela Mattos – “Onde você quer viver quando se tornar uma pessoa idosa? Não importa se  hoje você tem 14, 35 ou 55 anos.

Esta é uma boa pergunta para refletir sobre o seu próprio envelhecimento e daqueles com quem convive. Você pode dizer que quer mudar para um lugar calmo, tranquilo, longe da agitação da cidade grande, talvez uma casa de campo ou de praia. Mas, na maioria das vezes, as pessoas querem envelhecer onde viveram mais tempo, criaram raízes, cultivaram amigos e constituíram família.

Esta realidade, denominada Aging in Place (Envelhecimento no lugar), tem embasado e direcionado políticas públicas em muitos países. A proposta é garantir o direito das pessoas idosas viverem em suas comunidades com segurança e independência.

Mas, como garantir que uma pessoa com demência more em sua própria comunidade de maneira segura e independente?

A demência é uma doença que afeta a cognição, podendo desencadear (ou não) alterações de comportamento. Ela impacta no desempenho das atividades do dia a dia,  na medida em que a doença evolui.

É uma condição carregada de estigmas. Um deles, que considero o principal, é que a pessoa afetada não tem condições de decidir sobre sua própria vida nem onde vai morar,  necessitando de cuidados 24 horas por dia.

Estudo realizado pela Alzheimer’s Society apontou que pessoas com demência acreditam que a sociedade não consegue entender a condição em que vivem, nem o impacto desta condição sobre suas vidas e como interagir com elas. Este é um dos principais motivos pelos quais elas se isolam.

Mais de 1/3 das pessoas com demência disseram se sentir solitárias. E mais de 1/4  das cuidadoras e cuidadores se sentem isolados (2020).

Esta falsa crença se perpetua devido à falta de conhecimento sobre o que é demência.  E é por isso que, na maioria das vezes, as famílias optam por mudar os familiares  idosos de casa, de bairros ou, até mesmo, de cidades em quem viveram longos anos.

Os familiares acreditam que as pessoas afetadas pela demência não têm condições de viver sozinhas. Mas podem existir caminhos que colaborem para a permanência dessas pessoas em suas comunidades pelo  maior tempo possível.

Em 2004, surgiram no Japão, as primeiras iniciativas Dementia Friendly Community (Comunidade Amiga da Demência – CAD). A proposta foi garantir que pessoas com demência e suas famílias fossem compreendidas e respeitadas.

Isso significa um projeto de apoio com cidades que oferecem acesso a suporte e apoio nos serviços sociais e de saúde. Além disso, realizar campanhas para ampliar a conscientização e compreensão a respeito da demências em todos os setores da comunidade, como  comércio, transporte, educação e cultura.

A partir desta iniciativa, países da Europa, da América do Norte, da Ásia e da África adotaram estas estratégias apoiadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pela Alzheimer’s Disease International (ADI) (2012).

Essas organizações  passaram a recomendar a adoção da CAD, entre outras iniciativas, nos Planos de Ação Global,  por identificar a sua força no combate ao estigma. O slogan da Comunidade Amiga da Demência é “Nada para nós, sem nós” (tradução própria).

Para o desenvolvimento de iniciativas locais é primordial a escuta e participação ativa das pessoas afetadas pela demência, assim como de suas cuidadoras e cuidadores. Desta forma, as demandas poderão ser atendidas respeitando os aspectos culturais de cada região.

No Brasil, uma iniciativa pioneira da Comunidade Amiga da Demência está em fase de implementação na cidade de Santos/São Paulo. Para isso, a população participou de pesquisa que avaliou o nível de conhecimento a respeito da demência entre os moradores da região.

Pessoas com demência na fase inicial,  cuidadoras e cuidadores também foram ouvidos para entender suas demandas e necessidades para uma comunidade segura e inclusiva.

O primeiro passo será a oferta da oficina “Campeão da Demência” aos profissionais da saúde garantindo que estes espaços estejam preparados para receber e dar suporte adequados.  Posteriormente será expandido para outros setores, a depender das parcerias desenvolvidas.

Em paralelo, será ofertada a oficina “Amigo da Demência” para pessoas da comunidade. As oficinas serão divulgadas nas mídias sociais da Prefeitura de Santos e  da Unifesp. Todo o processo será avaliado e poderá auxiliar na ampliação desta iniciativa em outras cidades e estados do  país.

O Brasil está envelhecendo e o maior fator de risco para desenvolver a demência é a idade. Eu quero envelhecer. Se eu desenvolver demência, quero viver numa comunidade que me permita participar ativamente. E você?”

Nós, do Coletivo Filhas da Mãe, apoiamos a multiplicação de Comunidades Amigas da Demência em todo o país. As pessoas com demência, cuidadoras e familiares necessitam de lugares inclusivos e respeitosos para viver.

Cosette Castro

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