Ana Castro & Cosette Castro
Brasília – Segundo o IBGE (2019), no Brasil 96% da atividade do cuidado é desempenhado por mulheres. Mas, ao contrário do que muitos pensam, isso não ocorre de forma natural, apesar de ter sido naturalizado.
Historicamente o trabalho de cuidar foi imposto como uma responsabilidade das mulheres, proibidas de estudar e trabalhar até o século XIX. Desde cedo, meninas foram (e ainda são) estimuladas ao cuidado. Todos os presentes levam ao cuidado: bonecas, casinhas, materiais de limpeza, comidinhas. Anos de treino até as adolescentes e mulheres considerarem “natural” o cuidado.
No Brasil, as mulheres só puderam trabalhar sem ter de pedir autorização para o marido, para o pai ou o irmão mais velho a partir da Constituição de 1962. Até então, até mesmo para viajar elas precisavam de autorização do marido, assim como para abrir uma conta no banco.
Quando conseguiram estudar, foram estimuladas a fazer Pedagogia, Enfermagem, Serviço Social, Nutrição, entre outras atividades de apoio e cuidado. Ainda hoje são pouco estimuladas a fazer Engenharia, Física ou Ciências da Terra.
No nível médio, elas estão presentes no cuidado profissional das famílias, desde o bebê, os doentes e os idosos. Estão nas creches, nas instituições de longa permanência para idosos (ILPIs) e nos serviços profissionais de limpeza e alimentação.
Já os homens, em sua maioria, tem sido educados para receber cuidado. Não é por acaso que representem apenas 4% da atividade de cuidado, seja familiar ou profissional.
Algumas pessoas ainda se surpreendem quando um homem assume ser cuidador da companheira, da mãe ou avó. Em muitos casos, foram homens criados por mulheres como chefe de família ou em famílias com muitas mulheres, sejam irmãs, tias, avós ou primas onde a atividade de cuidar era compartilhada.
O ator Alexandre Borges agitou as redes sociais ao se declarar cuidador da mãe com Alzheimer em recente entrevista a Ana Maria Braga. Um homem que assume dar banho e trocar fraldas infelizmente ainda causa espanto. Até mesmo às mulheres, pouco acostumadas a estimular o cuidado em meninos, adolescentes ou homens.
As novas gerações parecem ter algo a ensinar a homens adultos e idosos, principalmente para aqueles que acreditam que cuidar “é coisa de mulher”.
Um exemplo é o jovem Fernando Aguzolli, acostumado a lidar com a sua avó Nilva, que tinha demência. Driblar a resistência do banho da avó entrando com ela no chuveiro foi apenas uma de suas aventuras, compartilhadas no perfil Vovó Nilva do Facebook.
O bom humor e desprendimento do jovem renderam o livro “Quem, eu? Um neto. Uma avó. Uma lição de vida”, pela Editora Belas Artes. A atitude do Fernando, que deixou a faculdade para ajudar a avó, ajuda a reduzir preconceitos sobre as demências, sobre cuidado e gênero.
Na mesma sintonia, um dos irmãos da Carmem ( nome fictício), que mora em Brasília, deixa uma sunga na casa da irmã cuidadora para dar banho da mãe, diagnosticada com Alzheimer.
Os mais jovens parecem ter maior facilidade em lidar com os tabus do corpo. Não ficam tão preocupados em ver a mãe ou avó nua e desprotegida. Estão ali para acolher, sem se prender a preconceitos. Por outro lado, boa parte dos homens adultos e idosos se envergonham do corpo que lhes trouxe a vida ou embalou, principalmente na hora do banho e nas trocas de fraldas geriátricas.
Os exemplos citados são ainda raros, mesmo fora do Brasil. Mas podem contribuir para mudar o desequilíbrio existente. A responsabilidade do cuidado é de toda família, independente de gênero.
Uma iniciativa do governo japonês levou ao aumento da participação masculina no contingente de cuidadoras profissionais. Com estímulo financeiro à capacitação para o cuidado e oferta de emprego nas instituições de longa permanência para idosos, 40% das equipes passaram a integradas por homens.
Aqui a profissão de cuidador/a, ainda não reconhecida, cresceu 547%, segundo dados do final de 2018 do antigo Ministério do Trabalho. A experiência japonesa pode ser multiplicada no Brasil, um país que envelhece rapidamente em meio a um cenário de desemprego.
Dentro de casa, também é preciso mudança. Meninos merecem aprender a cuidar desde cedo, como as meninas.
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