ANA MARIA CAMPOS
Querido pelos colegas ao longo de mais de 30 anos de carreira, o delegado Eric Seba se prepara para se aposentar.
Diretor-geral da Polícia Civil do DF num período conturbado na relação com o Executivo, ele diz, em entrevista exclusiva ao Correio, que fechou um ciclo.
Seba vive um desgaste pessoal diante da frustração de sua própria classe que se considera preterida pelo atual governo. Mas ele garante que a Polícia Civil sempre esteve à frente da relação pessoal com o governador Rodrigo Rollemberg. “Acima da minha instituição só tem a minha família”, disse.
Eric Seba, que figurou nas duas últimas listas tríplices da categoria, afirma ser favorável ao processo, mas defende que a disputa ocorra sem politicagens e barganhas por cargos.
Ele não declara seus preferidos na escolha marcada para ocorrer hoje (31/10), mas, sem citar nomes, afirma em quem não votará: “naqueles oportunistas, que lá atrás chamei de abutres, que queriam aproveitar o pleito da categoria para tomar a direção e criar uma instabilidade na instituição”.
Ibaneis Rocha conseguirá cumprir o compromisso com a paridade?
Desejo que faça um excelente governo e consiga cumprir o compromisso de dar a paridade da Polícia Civil e os outros aumentos. Acompanhei muita discussão e muito sofrimento de se fechar as contas de cada mês, principalmente nos dois primeiros anos do atual governo. Havia uma angústia muito grande, uma escolha de Sofia, em que se deixava de pagar algumas coisas para fechar. A prioridade sempre foi pagamento dos servidores. Desejo do fundo do coração que o governador Ibaneis consiga cumprir as promessas.
A Polícia Civil declarou apoio a Ibaneis. Por que essa rejeição a Rollemberg?
Com certeza, pela questão da paridade. O não cumprimento da promessa de campanha pela manutenção da paridade foi um fator determinante para toda essa rejeição que existe hoje.
Os policiais dizem que foram preteridos, desrespeitados pelo governo que sempre privilegiou a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros. Acha que isso ocorreu?
Que tivesse preferência em prejuízo ou em detrimento da outra, não. O governador encontrou uma situação financeira extremamente grave e preocupante. Teve de fazer algumas opções. Ele se preocupou com a estabilidade financeira, tanto é que ele fez algumas propostas para a Polícia Civil, para pagar em três a cinco vezes. Houve uma recusa a todas aquelas propostas. Durante a campanha, os ânimos ficaram muito acirrados e houve uma postura um pouco de esquecimento, sim.
Na campanha, Rollemberg deixou claro que preferia a Polícia Militar?
As pessoas que acompanharam viram que ficou claro que ele pretendia fazer o maior plano de reestruturação da carreira da PM e do Corpo de Bombeiros e praticamente não se manifestava em relação à Polícia Civil. Isso é reativo. É do ser humano, depois de uma campanha ofensiva. Uma coisa é defender ideias, discordar. Outra coisa é agressividade que ele sofreu.
O governador eleito disse em
entrevista ao Correio que a Polícia Civil é política. Em algum momento na sua administração houve atuação política?
Não houve. Posso afirmar isso. É um dos maiores orgulhos que tenho. Uma das mais injustas acusações, especialmente vindas do Sinpol, é de que eu tenha deixado de ser uma polícia de Estado para ser uma polícia de governo. Uma polícia de governo não faz as operações que fizemos. Tenho muito orgulho em dizer que em nenhum momento sofri qualquer tipo de interferência por parte do governador ou do Executivo .
Mas houve atuação política por parte da Polícia Civil?
Tecnicamente não. Se a gente identificasse qualquer atuação que não fosse técnica, legal e republicana, a Corregedoria atuaria, como atuou em outros casos de forma contundente.
Ibaneis reclamou de a Polícia Civil não ter investigado fake news produzidas na campanha contra ele…
Sobre essa afirmação, só me resta lamentar. A grande maioria dos fakes pode caracterizar crime eleitoral ou crime contra a honra. No primeiro caso de competência da Polícia Federal e no segundo necessitando de representação por parte do ofendido.
Entre o governador Rollemberg e a Polícia Civil, o que foi mais importante para você nos últimos quatro anos?
Acima da minha instituição só tem a família. Foi uma escolha pela sociedade. Vivo a Polícia há 34anos. Posso dizer que é a minha família de coração. Como diretor da PCDF, tenho minhas limitações. São legais, são éticas e técnicas. De verdade, penso da seguinte forma: um dos maiores princípios que tenho na minha vida pública é gerir a administração com impessoalidade.
Foi difícil tocar a Polícia Civil com essa rejeição ao governo?
Uma coisa temos desde a época da Dra. Mailine: um grupo que se movimenta para tentar desestabilizar e fazer uma sucessão dentro da instituição. Isso é uma verdade. Essas pessoas pegaram carona num movimento salarial. Havia um movimento de reivindicação que é justo e essas pessoas aproveitaram isso. Mas hoje temos uma instituição que trabalha de forma serena. Muita gente está chateada? Sim. A gente queria a nossa paridade. Mas infelizmente chegamos num nível de falta de diálogo que não foi possível. Houve um sofrimento físico, mental, familiar… mas tudo faz parte do amadurecimento.
Qual é o balanço da sua gestão?
Foram quatro anos sem escândalos, sem grampos ilegais, sem produção de dossiês. Nós tivemos, sim, na questão da Dracon, um delegado-chefe oferecendo ajuda para um dos investigados no sentido talvez de minar, de boicotar as investigações. Está lá na escuta ambiental que foi colocada dentro da Câmara Legislativa. Mas na minha gestão não houve isso e tenho muito orgulho de dizer. Essa é uma polícia que age de forma republicana.
Você sempre foi um policial muito querido e agora sofre o desgaste. Isso te magoa?
Chateia pela injustiça. Errar e acertar é do ser humano. Quando a gente acerta, beleza. Quando erra tenta corrigir. As pessoas dizem que havia falta de interlocução. Mas não é verdade. Sempre atendi sindicatos. Mas criou-se uma crença de que, se eu entregasse o cargo, forçaria o governador a resolver a questão da paridade. Houve um radicalismo de uma entidade específica que, em vez de construir pontes, fechou portas. A partir daí tinham que eleger um culpado. E o culpado fui eu. Recebo muitas mensagens de apoio de colegas. Mas muita gente não se manifesta publicamente. Prefere se calar para não enfrentar uma agressividade por parte de sindicalistas. Quem me conhece desde o início da carreira sabe que nunca mudei. Na carta de despedida do ex-diretor da Policia Civil de São Paulo, que também enfrentou um movimento salarial forte, ele dizia: “Eu me sinto frustrado, mas não me sinto culpado”. É assim que me sinto. Me sinto muito frustrado, mas de forma nenhuma me sinto culpado por não ter conseguido a paridade.
A lista tríplice é uma forma correta de escolha do diretor-geral?
O processo é bom, mas algumas pessoas estão deturpando o processo. Figurei em duas listas tríplices, meu nome saiu de lá. Mas não pode ser uma politicagem. Não pode ser uma barganha. Se perguntar à minha equipe, só convidei as pessoas depois que fui confirmado.
Pode dizer em quem vai votar?
Por enquanto, não estou decidido, não. Mas posso dizer em quem não votar: naqueles oportunistas, que lá atrás chamei de abutres, que queriam aproveitar o pleito para tomar a direção e criar uma instabilidade na instituição. Aí vou falar de “casa da maldade”, de um monte de coisas que as pessoas vão entender. São pessoas que atuam há muito tempo para desestabilizar. Alguns amigos até me perguntaram se eu lançaria meu nome e respondi: ‘não sou maluco”. (risos)
Por quê?
Existe um ciclo que engloba gestores e governantes. Fui um gestor da Polícia Civil no governo Rollemberg. Esse ciclo está encerrado. Desejo que o governador Ibaneis traga uma melhoria da qualidade de vida da população em todos os sentidos.
Quais são seus planos?
Já era uma decisão minha, independentemente da reeleição do governador, pretendo me aposentar, cuidar um pouco de mim. Foram quatro anos em que a saúde ficou debilitada. Quero reconstruir algumas coisas da minha vida particular. Meus pais e meu filho sentiram muito pelos ataques que sofri. Nunca vi isso na história da Polícia Civil.