Da coluna Eixo Capital/ANA MARIA CAMPOS
À Queima Roupa
Ex-governador Agnelo Queiroz (PT)
“Essa é uma luta suprapartidária em defesa da sobrevivência da capital do Brasil”
Você já foi governador e sabe dos desafios de gestão na capital do país. Como vê essa questão das mudanças na correção do Fundo Constitucional do DF?
Vai significar uma verdadeira tragédia para o DF. Não teremos mais correção acima da inflação. Isso significa que não terá mais aumento de salário para ninguém das três áreas (saúde, segurança e educação). Não teremos expansão dos serviços de saúde, educação e segurança numa cidade que cresce assustadoramente. Já é a terceira cidade em população do Brasil e, portanto, precisa ter condições de ampliação desses serviços. E também teremos um enfraquecimento da qualidade desses serviços de forma brutal e também haverá uma forte repercussão na nossa economia porque a massa salarial dos servidores tem um grande impacto no nosso PIB. Hoje corresponde a cerca de 40% do nosso PIB. Então, é muito forte.
Por que essa emenda?
Acredito que seja uma visão neoliberal de ataque aos serviços públicos. Mas no caso do DF isso tem um peso assustador porque compromete as áreas essenciais do serviço público e também a economia da cidade porque vai atingir também os outros setores da nossa economia. Lembrando que há recursos no FCDF também para investimentos. Portanto, é muito grave. Muito grave mesmo. Não podemos aceitar isso. Terá uma repercussão muito grande na vida da nossa cidade ao longo dos próximos anos.
Acha que o prejuízo será tão alto como prevê a secretaria de Planejamento do DF?
O prejuízo será incalculável. Só não vai ser pior porque tivemos agora em 2023 uma correção do Fundo da ordem de 41% e uma média de 10% ao ano e com isso se consegue ter condições de, por exemplo, contratar professores. Hoje temos 15 mil professores em contrato temporário, um absurdo completo. Inclusive é ilegal. Temos que fazer concurso para pelo menos oito mil professores. Há um deficit na saúde brutal. É uma situação dramática que vive a saúde pública no DF. E também na segurança. No meu governo, o efetivo era de 15 mil policiais. Hoje está em torno de 10 mil. Então há uma necessidade de ampliação dos serviços. Então essa proposta é criminosa contra o DF, contra o nosso povo. Aqui temos 3 milhões de habitantes. É absolutamente inaceitável.
Faltou articulação dos políticos do DF, especialmente da bancada de deputados federais, para impedir a aprovação dessa alteração?
Esse assunto é tão sério, que diz respeito à sobrevivência da capital do Brasil, que essa luta necessariamente, se for compreendida a extensão dela, tem que ser conduzida pelo governador do Distrito Federal, pela vice-governadora e mobilizar toda a bancada. Essa é uma luta suprapartidária em defesa da sobrevivência da capital do Brasil. A luta deve ser compreendida assim. Tem que ter uma articulação com mais ofensividade. De acordo com a forma que ficar a redação pode até dificultar um veto presidencial. Faltou mobilizar o povo e todas as entidades.
Como seria sua atuação se estivesse na Câmara dos Deputados ou no cargo de governador?
Como deputado, participei da constituição do Fundo Constitucional. Em 2002, nós incluímos a saúde e a educação no Fundo. Foi uma conquista extraordinária e colocamos uma correção com base na receita corrente líquida que permite um aumento paulatino em média. Em 2010 e 2016, tivemos crescido negativo do Fundo Constitucional. Mas aí se compensou com outros anos. Então eu mobilizaria toda a bancada, todos os deputados distritais, os servidores públicos das três áreas, as entidades dos trabalhadores, as centrais sindicais, a Federação das Indústrias e Comércio, que também serão atingidas. Mobilizar a cidade inteira. O ataque dos serviços públicos aqui é o ataque à economia.
Acha que haverá condição de esse tema ser revertido no Senado?
Acho possível. Temos que mobilizar todas as forças políticas. Não podemos, por conta de um relator que inclui um jabuti em um projeto de lei, permitir que isso ocorra. Mas tem que ser uma mobilização forte e não como foi na Câmara dos Deputados.
Qual na sua opinião deve ser o papel do governo Lula nessa questão? E do PT-DF?
O PT tem que se somar a todas as forças políticas do Distrito Federal, mobilizar as entidades que têm inserção no movimento social porque uma derrota como essa vai repercutir muito na vida da nossa capital. Qualquer projeto que trata do Distrito Federal enfrenta dificuldades no Congresso, sobretudo depois do 8 de janeiro. Mas não dá para punir um povo. Que se punam os responsáveis pelo dia 8. Depois do Congresso ainda tem o recurso de um veto. Mas precisamos ver como será escrito esse artigo porque pode inviabilizar o veto, se estiver junto com outras coisas. Mas acho que não interessa a ninguém ter a capital do Brasil fragilizada. Não é interesse de ninguém o enfraquecimento das instituições.