Nas entrelinhas: Tudo começou com José Dirceu e Sergio Moro

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Dirceu já havia sido reabilitado pela maioria dos políticos. Moro vestiu as sandálias da humildade no Senado

O ex-deputado José Dirceu e o ex-ministro Sergio Moro são dois grandes protagonistas do processo de radicalização política existente no país. Simbolizam o maniqueísmo da luta entre o bem e o mal para petistas e bolsonaristas, respectivamente, desde o início desse processo. Dirceu, quando ainda era o poderoso ministro da Casa Civil do governo Lula, no episódio que ficou conhecido como mensalão, em 2005; Moro, como o juiz ferrabrás da Operação Lava-Jato, que começou em 2014, com a investigação de lavagem de dinheiro num posto de gasolina de Brasília, proveniente de corrupção na Petrobras, pelos procuradores do Ministério Público Federal em Curitiba.

Desde então, nada foi como antes na política brasileira. Mesmo sem ter a ver com o mensalão, Dilma Rousseff, que substituiu Dirceu na Casa Civil, eleita e reeleita presidente da República, acabou apeada do poder por um processo de impeachment. Naufragou na onda de desgaste do governo provocada pela Lava-Jato e pela perda de controle da economia, após a adotar a chamada “nova matriz econômica”.

Em 2018, Jair Bolsonaro, um candidato azarão, se elegeu presidente da República, com a política brasileira mergulhada numa crise ética. A política de terra arrasada conduzida por Moro levou à prisão políticos, executivos e os principais empreiteiros do país, entre os quais Marcelo Odebrecht, cujas condenações também foram anuladas nesta terça-feira, monocraticamente, pelo ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal. Essa é outra história.

Por três votos a dois, a Segunda Turma do Supremo julgou extinta uma ação contra Dirceu, condenado por Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. No STJ, ele já havia se livrado da segunda imputação, mas restava a primeira. Não houve julgamento de mérito. Ricardo Lewandowski (hoje ministro da Justiça), Gilmar Mendes e Nunes Marques entenderam que o crime estava prescrito. Edson Fachin e Cármen Lúcia, não.

De acordo com a legislação penal, a prescrição para corrupção passiva ocorre após 12 anos, porém, quando o acusado tem mais de 70, cai para a metade. O suposto crime teria sido cometido em 2009. José Dirceu ainda tem outro processo no STJ, igualmente sujeito à prescrição, no qual a defesa alega que houve perseguição de Moro.

Como o relator é o ministro Gilmar Mendes, magistrado que sempre questionou a legalidade dos inquéritos conduzidos por Moro, essa ação contra Dirceu também pode ser extinta, segundo as expectativas dos advogados. Nesse caso, restabelecerá seus direitos políticos e poderá voltar a disputar eleições.

O senador Sergio Moro (UB-PR), desde que assumiu uma cadeira no Senado, viveu sob ameaça de cassação, por abuso de poder econômico na campanha eleitoral. Agora, foi absolvido por unanimidade das acusações pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A disputa jurídica começou no Paraná, com a apresentação de duas ações de investigação eleitoral contra Moro e seus suplentes — Luís Felipe Cunha e Ricardo Augusto Guerra.

Reabilitação

Nas ações, o PL e a Federação Brasil da Esperança acusaram Moro de irregularidades nos gastos realizados na pré-campanha e nos repasses de recursos do Fundo Partidário e do Fundo Eleitoral. O ex-juiz teve a imagem desconstruída desde quando aceitou participar do governo de Jair Bolsonaro, como ministro da Justiça.

Seu apoio a Bolsonaro maculou sua postura de magistrado imparcial. Jogo combinado e arbitrariedades na atuação dos procuradores da Lava-Jato corroboraram, para a maioria dos ministros do STF, os questionamentos à forma como Moro conduzira os processos, sem respeitar o devido processo legal.

O rompimento de Moro com Bolsonaro, ao deixar o Ministério da Justiça por não pactuar com a interferência do presidente da República nas atividades da Polícia Federal, fez com que o ex-juiz ficasse entre dois fogos: o do bolsonarismo e o dos petistas.

Abuso de poder econômico, uso indevido dos meios de comunicação, compra de apoio político e arrecadação ilícita de recursos na pré-campanha eram as acusações contra Moro e seus dois suplentes. As ações do PL, partido de Bolsonaro, e da Federação Brasil da Esperança eram uma espécie de ajuste de contas.

O partido de Bolsonaro pleiteava a cassação dos mandatos, a aplicação da inelegibilidade e nova eleição para cargo de senador no estado. A decisão do TSE sobre Moro não surpreendeu os meios políticos, assim como a prescrição dos processos de Dirceu. Nos meios jurídicos, já era considerada líquida e certa. Nos meios políticos também havia um ambiente favorável.

José Dirceu já havia sido reabilitado pela maioria dos políticos, exceto pelos desafetos pessoais e os bolsonaristas. Moro também havia se reposicionado no Senado, onde vestiu as sandálias da humildade. Dirceu é visto como um bom interlocutor pelos políticos do Centrão; Moro descartou uma eventual candidatura à Presidência.

Colunas anteriores no Blog do Azedo: https://blogs.correiobraziliense.com.br/azedo/

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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