Nas entrelinhas: Seguro morreu de velho

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A estratégia da cúpula petista agora mira as eleições proporcionais, ninguém acredita em projeto de poder sem Lula A narrativa de candidato preso por azões políticas fragiliza sua defesa

As mudanças mais significativas da reforma ministerial do governo Temer foram a ida de Moreira Franco para o Ministério de Minas e Energia e a efetivação do general Joaquim Silva e Luna no Ministério da Defesa. O primeiro sinaliza para os investidores a intenção de levar adiante o programa de concessões do governo no setor mineral, a privatização da Eletrobras e a continuidade dos leilões de exploração de petróleo da camada pré-sal; o segundo, o ostensivo protagonismo dos militares numa conjuntura politica complicada, na qual o mais importante são, a manutenção do calendário eleitoral, a realização de eleições sem violência e a garantia da lei e da ordem durante a campanha. As demais mudanças foram seis por meia dúzia, ou seja, na maioria dos casos, acabaram efetivados homens de confiança dos antigos ministros. Temer não agregou massa crítica na reforma.

Os investimentos estrangeiros e a tranquilidade nos quartéis são quase tudo o que o presidente Michel Temer precisa garantir até o fim do mandato, com a saída de Henrique Meirelles do Ministério da Fazenda (e o esgotamento do programa de reformas do governo no Congresso, por falta de base de sustentação). A economia está condenada ao “mais do mesmo”, apesar da inflação abaixo da meta e dos juros em seu menor patamar histórico, com a Selic em 6,5%. Embora não sejam conquistas nada desprezíveis, o governo perdeu substância na reforma ministerial, a ponto de o MDB ter sido o partido que mais defecções sofreu no troca-troca partidário: 19 deputados. A opção daqui para a frente será se preparar para a eventualidade de uma terceira denúncia contra Temer, que arrasta as correntes da Operação Lava-Jato.

As viagens de Temer, Rodrigo Maia e Eunício Oliveira na sexta-feira e no sábado, porém, são sinais de normalidade política. O presidente da República estará na Cúpula das Américas; o presidente da Câmara viajará ao Panamá e o presidente do Senado, ao Japão. Com isso, a presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, terceira na linha de sucessão, assumirá a Presidência da República, interinamente. As condições em que isso ocorrerá, de certa forma, dependerão da ministra. Na quarta-feira, o STF terá que lidar com a rebordosa da prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pois o ministro Marco Aurélio Mello pretende pôr “em mesa” para votar um novo pedido de habeas corpus em favor de Lula, na esperança de que a prisão seja revista com o voto da ministra Rosa Weber. Cármen Lúcia decidirá se o plenário apreciará ou não. Como diria Tom Jobim, o Brasil não é para principiantes.

Desde a intimação para se apresentar voluntariamente à Polícia Federal, na sexta-feira passada, por determinação do juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal, de Curitiba, o “jus esperneandi” do petista se tornou o maior espetáculo da Terra. Lula transformou a prisão numa produção midiática, com criação de imagens para a campanha do PT, nas quais divide a cena com candidatos do partido e seus aliados às eleições deste ano. A presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), que também está enrolada na Lava-Jato e deve se candidatar a deputada federal, comanda a “resistência” petista. Ontem, à frente dos manifestantes que protestam contra a prisão de Lula nas imediações da Superintendência da Polícia Federal de Curitiba, onde ele está detido, anunciou que a sede do PT será transferida para a capital paranaense enquanto o ex-presidente estiver na cadeia.

Escracho

Um balanço das manifestações mostra o isolamento político do PT e a baixa capacidade de mobilização social. O ato de São Bernardo, defronte ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, nem de longe lembrou as históricas assembleias metalúrgicas da greve de 1978, no emblemático Estádio da Vila Euclides, nas quais Lula emergiu para a história como sindicalista. Antigos aliados deram as costas ao ex-presidente, que contou com a solidariedade de corpo presente de apenas dois presidenciáveis, Manuela D’Ávila (PCdoB) e Guilherme Boulos (PSol), ambos de olho nos votos dos órfãos eleitorais de Lula. Apesar da agressividade dos protestos e da repercussão internacional, a escala de solidariedade a Lula foi baixa, reforçando a tese de que é a competência dos advogados que deve orientar a defesa, e não o fervor ideológico petista.

A estratégia da cúpula petista agora mira as eleições proporcionais, ninguém acredita em projeto majoritário sem Lula. Essa posição é reforçada pela preocupação de construir a imagem de ex-presidente injustiçado por razões políticas. Do ponto de vista jurídico, porém, essa postura vem colecionando fracassos, pois afronta todo o Judiciário. A sessão do Supremo de amanhã pode ser a última chance de libertar Lula antes do fim do prazo de registro de candidaturas; entretanto, o constrangimento criado para o STF pode pôr tudo a perder.