Nas entrelinhas: Perigo na pista

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Temer pretendia decolar seu projeto de reeleição do aeroporto de Vitória, mas quase foi abatido na pista

O presidente Michel Temer estava se preparando para viajar para Vitória quando soube da operação Skala, da Polícia Federal, que prendeu ontem José Yunes, seu advogado, amigo e ex-assessor; Antônio Celso Greco, empresário, dono da empresa Rodrimar; João Batista Lima, ex-coronel da Polícia Militar de São Paulo e também seu amigo; Wagner Rossi, ex-deputado, ex-ministro e ex-presidente da estatal Codesp; Milton Ortolan, auxiliar de Rossi; e Celina Torrealba, uma das donas do grupo Libra. A ordem de prisão partiu do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, a pedido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge.

A viagem foi mantida, como recomendam os manuais de gerenciamento de crise. Mas o que seria uma demonstração de que Temer “faz acontecer” – a inauguração do aeroporto de Vitória, no Espírito Santo, que levou 16 anos para ficar pronto (a obra estava parada quando ele assumiu o governo) – se tornou um grande constrangimento, devido aos questionamentos da imprensa sobre a prisão dos amigos do presidente. O governador Paulo Hartung, seu correligionário do MDB, depois de anunciar aos quatro ventos a conclusão da obra, não foi ao evento, para evitar as fotos ao lado de Temer. O político capixaba é candidato à reeleição e seria o principal beneficiado político pela conclusão das obras. Ao discursar, Temer ignorou as prisões; e, na entrevista coletiva, minimizou o caso. Como disse, já está acostumado a ser “bombardeado”.

Outra notícia boa para Temer também foi completamente ofuscada pelas prisões: o sucesso dos leilões da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Combustível (ANP), que arrecadou R$ 8 bilhões em bônus, com a venda de 22 blocos marítimos de exploração de óleo e gás, dos quais o maior ágio foi da Bacia de Campos: 680,452% sobre o mínimo esperado. Os nove blocos, todos do setor SC-AP5, foram arrematados por expressivos R$ 7,5 bilhões. Segundo a ANP, o ágio médio foi de 621%. No total, 47 blocos marítimos foram ofertados. Segundo a ANP, o leilão das áreas marítimas teve 12 empresas ofertantes, 11 delas estrangeiras, de nove de países diferentes. É uma luz no fim do túnel para a economia fluminense.

Estiva

Temer anunciou a intenção de se candidatar à reeleição no fim de semana, uma cartada decisiva para recompor seu governo em condições mais favoráveis e não encerrar a gestão melancolicamente. Na remontagem da equipe ministerial, já vinha enfrentando a oposição do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que também anunciou sua pré-candidatura. As prisões às vésperas da Páscoa, com o Congresso vazio, não permitem uma avaliação imediata do tamanho do estrago na candidatura, que já tem baixa densidade eleitoral, mas ainda preservava capacidade de composição política. Isso somente será possível na próxima semana, do ponto de vista da reação dos aliados. Temer pretendia decolar seu projeto de reeleição do aeroporto de Vitória, mas quase foi abatido na pista.

A Operação Skala foi autorizada pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator do inquérito que investiga se Temer, por meio de decreto, beneficiou empresas do setor portuário em troca de suposto recebimento de propina. No Palácio do Planalto, a operação gerou grande preocupação, porque sinaliza a possibilidade de uma nova denúncia contra o presidente da República, às vésperas da eleição. As prisões foram solicitadas pela procuradora-geral Raquel Dodge, contra a qual Temer não pode usar os mesmos argumentos que usou contra o ex-procurador Rodrigo Janot, autor de duas denúncias que a Câmara não aceitou.

O empresário Antônio Celso Greco opera no porto de Santos; o ex-deputado federal Wagner Rossi, entre 1999 e 2000, foi diretor-presidente da Companhia Docas do Estado de São Paulo, estatal administradora do porto de Santos; Celina Torrealba é uma das donas do grupo Libra, que opera no Porto de Santos. A investigação foi desmembrada da Operação Lava-Jato pelo ministro Édson Fachin e ficou a cargo do ministro Luís Roberto Barroso, que não esconde seu pleno apoio à Lava-Jato. O Ministério Público aproveitou a oportunidade para exumar antigas informações de um velho inquérito sobre o envolvimento de políticos com a corrupção no porto de Santos.