Nas entrelinhas: O bispo preto

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Na base do governo, a indicação teve boa repercussão, assim como na alta magistratura, pois Moraes é respeitado como jurista

Já dissemos aqui que a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármem Lúcia, jogava com as peças brancas no processo de substituição do falecido ministro Teori Zavascki, antigo relator da Operação Lava-Jato. Ou seja, teve a iniciativa de movimentar o tabuleiro. Fez isso com competência, ao articular a ida do ministro Luiz Édson Fachin da Primeira para a Segunda Turma do STF, na qual ele acabou herdando, por sorteio, a relatoria da delação premiada da Odebrecht, que atormenta nove de cada dez políticos da República. O presidente Temer optou por jogar com as peças pretas, ao esperar o lance da ministra para indicar o substituto de Teori na vaga do Supremo. Ontem, movimentou um bispo: o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, filiado ao PSDB-SP.

Na tarde de ontem, a indicação foi confirmada pelo porta-voz da Presidência, Alexandre Parola, depois de uma reunião de Moraes com Temer. “As sólidas credenciais acadêmicas e profissionais o qualificam para as elevadas responsabilidades do cargo de ministro da Suprema Corte”, diz nota oficial lida por Parola. O lance de Temer foi de mestre, considerando-se o tabuleiro: o plenário do Senado. Moraes tem o apoio do presidente da República e do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, de quem foi secretário. Temer indicou um tucano para o Supremo, mas abre uma vaga para um peemedebista no Ministério da Justiça, o que cria condições para uma composição com a bancada do PMDB no Senado, principalmente Renan Calheiros (PMDB-AL), seu novo líder.

Moraes tem boas credenciais acadêmicas para o cargo. É autor de livros sobre direito constitucional, é doutor em direito do Estado e livre-docente em Direito constitucional pela USP (Universidade de São Paulo). Advogado e promotor de Justiça, foi secretário de Segurança Pública do governo de Geraldo Alckmin e secretário municipal dos Transportes e de Serviços da Prefeitura de São Paulo, na gestão do ex-prefeito Gilberto Kassab. Isso não significa que Moraes terá vida fácil na sabatina do Senado.

A oposição já afia as espadas para deixá-lo em situação constrangedora, com toda sorte de questionamentos, inclusive sobre uma velha tese acadêmica na qual Moraes condenava a indicação de ministros de Estado para o Supremo. Se for confirmado para a cadeira de Teori, será o revisor dos processos da Operação Lava-Jato no plenário do STF, ou seja, o responsável pela leitura crítica do voto do relator, ministro Édson Fachin, antes do julgamento. É o que aconteceu no julgamento do mensalão, no qual o ministro Ricardo Levandowski foi revisor do voto do ex-ministro Joaquim Barbosa.

Houve um movimento pendular muito importante em relação à Operação Lava-Jato. O ministro Édson Fachin, novo relator, era o nome com maior aceitação na força-tarefa de procuradores e entre os juízes federais, mas foi muito ligado ao PT, tanto que participou como orador de um comício de campanha da ex-presidente Dilma Rousseff, no Paraná, em 2010. Agora, Temer escolheu um tucano de carteirinha, que também terá que se desligar do partido e adotar uma atitude mais independente. Moraes atuará como revisor da Lava-Jato apenas nas ações que envolverem o atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício de Oliveira (PMDB-CE). Por serem chefes de Poderes, ambos somente podem ser julgados pelo plenário da Corte. As demais ações serão julgadas pela Segunda Turma do Supremo, na qual o ministro revisor já é Celso de Mello.

Na base do governo, a indicação teve boa repercussão, assim como na alta magistratura, pois Moraes é respeitado como jurista. Embora ligado ao governador Geraldo Alckmin, é amigo de Temer e, por ser jovem, deverá permanecer na Corte por 27 anos. Sua indicação torna o Supremo Tribunal federal (STF) mais garantista, digamos assim. É tudo o que os políticos querem, principalmente os citados na Operação Lava-Jato.

Espírito Santo
O ministro da Defesa, Raul Jungmann, anunciou ontem o envio de 1.200 homens do Exército e da Força Nacional para restabelecer a ordem pública no Espírito Santo, que viveu dias de caos no fim de semana, com arrastões, assaltos e 62 assassinatos, principalmente na Grande Vitória, em razão do aquartelamento da Polícia Militar. Ontem, a Polícia Civil fechou o Instituto Médico Legal com o argumento de que não tinha condições de receber mais cadáveres. O governador Paulo Hartung está internado no Hospital Sírio e Libanês, em São Paulo, convalescendo de uma cirurgia na bexiga. O colapso da segurança pública no Espírito Santo surpreendeu o país, pois o estado tem as finanças em ordem e vinha obtendo bons indicadores de controle da violência, principalmente em Vitória, revertidos completamente em apenas três dias.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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