Nas entrelinhas: Começa a batalha no Senado

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A discussão sobre o regimento no Senado tem um motivo: impedir que o vice-presidente Michel Temer assuma logo a Presidência interinamente

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), optou por um rito mais demorado para a discussão do impeachment na Casa, concedendo um prazo de 48 horas para o PT indicar os quatro representantes a que tem direito na comissão especial que discutirá a admissibilidade do pedido. Pelo regimento do Senado, a comissão deveria ser instalada imediatamente após a chegada do pedido ao plenário, ou seja, ontem. A decisão causou polêmica, a partir de uma questão de ordem do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), que acusou Renan de procrastinar o processo, uma vez que a comissão somente deverá ser instalada na segunda-feira.

A polêmica provavelmente não será a única sobre os procedimentos de votação, uma vez que Renan também decidiu antecipar a transferência da presidência do Senado para o ministro Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal, a quem caberá presidir o julgamento do impeachment, tão logo a comissão aprove a admissibilidade. Nada disso deveria acontecer se o Supremo não tivesse alterado o rito do processo, esvaziando a decisão da Câmara quanto à admissibilidade.

Toda essa discussão sobre o regimento tem um motivo: adiar ao máximo o afastamento da presidente Dilma Rousseff do cargo, para impedir que o vice-presidente Michel Temer assuma logo a presidência interinamente, enquanto ela aguarda a conclusão do julgamento por um prazo de 180 dias. Nos planos de Renan, essa decisão somente será tomada em 17 de maio. Há, ainda, mais confusão à vista. O ministro Ricardo Lewandowski tem uma interpretação própria da decisão do STF que negou o pedido de anulação do processo na quinta-feira da semana passada.

Segundo Lewandowski, cabe à Corte julgar o mérito do pedido aprovado pela Câmara quanto à materialidade do crime de responsabilidade, atribuído à edição de decretos sem autorização legislativa e às “pedaladas fiscais”, como são chamados os empréstimos feitos pelo Banco do Brasil e pela Caixa Econômica Federal ao Tesouro que violaram a Lei de Responsabilidade Fiscal. Dilma argumenta que ambos os casos não garantem base legal para o impeachment. Daí decorre toda a narrativa petista de que há um golpe de Estado em curso no país, que a própria presidente da República e diplomatas petistas têm difundido também na imprensa internacional.

Debandada
Entretanto, o governo Dilma já é considerado nos bastidores do Senado um “cadáver insepulto” em plena Praça dos Três Poderes, como ontem declarou o senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), ao protestar contra o adiamento da instalação da comissão. Essa avaliação reflete a real mudança na correlação de forças da Casa, muito bem traduzida, numa conversa de cafezinho, pelo insuspeito senador Othon Alencar (PSD-BA), aliado fiel do chefe de gabinete da presidente Dilma Rousseff, o ex-governador da Bahia Jaques Wagner. Sozinho, o ex-carlista garantiu cinco votos para Dilma na Câmara, mas acabou isolado no bloco ao qual pertence: “Há um mês, tínhamos dois senadores na oposição e oito governistas; hoje, na hora de escolher os indicados para a comissão especial, não fui eleito porque os outros nove estão a favor do impeachment”.

Outro sinal de que a mudança em curso é irreversível foi a decisão do ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga (PMDB-AM), de deixar o governo para voltar ao Senado. Pesou na decisão o fato de que a bancada do Amazonas na Câmara votou maciçamente a favor do impeachment. Outro que está deixando o governo é o ministro dos Portos, Helder Barbalho (PMDB-PA), que permanecerá na Câmara. Dilma fez um apelo para que permaneçam nos cargos, sem sucesso até a noite de ontem. Celso Pansera, ministro da Ciência e Tecnologia, também não reassumirá o cargo e permanecerá na Câmara. A senadora Katia Abreu, ministra da Agricultura, e o deputado Marcelo Castro, da Saúde, são os ministros do PMDB que pretendem permanecer no governo.

Luiz Carlos Azedo

Jornalista

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